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Descubra como usar a meditação para aumentar o foco e a produtividade

No livro "Por que Meditamos", o psicólogo Daniel Goleman e o instrutor Tsoknyi Rinpoche decifram as bases científicas do mindfulness para combater o estresse e turbinar a atenção. Leia um trecho.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 21 out 2024, 10h28 - Publicado em 7 jun 2023, 06h28
Uma ilustração de uma pessoa com uma nuvem no lugar onde está localizado o cérebro.
 (Arte/VOCÊ S/A)
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meditação é uma prática milenar, que começou em atividades religiosas do leste asiático. Há algumas décadas, ganhou uma faceta secular, e extremamente popular, no mundo ocidental, na forma de uma técnica de relaxamento e de combate ao estresse.

O lado religioso e místico não está na seara científica, mas, desde 1970, a psicologia e a neurociência vêm buscando entender como o ato de meditar afeta (e afia) o cérebro. Diversos estudos mostram que, de fato, as técnicas de respiração e concentração da prática têm efeitos potentes. 

Mais especificamente, o mindfulness parece ser especialmente eficaz no combate à ansiedade. Trata-se da técnica de meditação também conhecida como “atenção plena”. É a estratégia budista que treina a mente para prestar 100% de atenção num alvo específico, como a própria respiração, para afastar pensamentos negativos, estressantes.

No livro Por que Meditamos, o psicólogo de Harvard e jornalista de ciências Daniel Goleman se une ao renomado instrutor de meditação tibetano Tsoknyi Rinpoche para desvendar o que os estudos mais recentes mostram sobre a base científica da prática. Goleman é reconhecido por ser o criador do conceito de “inteligência emocional”, a habilidade humana de identificar e controlar as próprias emoções; ele também acompanha as pesquisas sobre meditação há quase 50 anos.

Em cada capítulo, Rinpoche explora como a meditação pode ser usada na prática, inclusive com exemplos e guias didáticos, enquanto Goleman segue com a teoria científica por trás daquilo. No trecho a seguir, o psicólogo explica como o mindfulness pode impulsionar o foco – e, consequentemente, a produtividade.

 

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(Arte/VOCÊ S/A)
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(Arte/VOCÊ S/A)

Capítulo 7 – Calma e clareza

Faço meditação há muitos anos, e minha expectativa era que, com o passar do tempo, cada vez menos pensamentos se intrometessem em minha prática. Mas os pensamentos nunca pararam de vir à minha mente. 

Lá estavam eles, o tempo todo. Talvez eu simplesmente não saiba fazer isso, pensei. Vinha, então, um momento de atenção plena, e logo depois: Caramba! Outro pensamento! 

Foi aí que comecei a estudar a tradição meditativa praticada por Tsoknyi Rinpoche, o que me fez lembrar que o importante não são os pensamentos em si, mas nossa relação com eles. Durante a atenção plena, podemos permitir que os pensamentos passem sem nos deixarmos arrastar por eles.

Uma das coisas que mais me ajudaram a mudar minha forma de enxergar os pensamentos foi essa fala de Tsoknyi Rinpoche: Fique de olho na atenção plena! 

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Esse conselho é um verso de um poema espontâneo do patriarca de sua linhagem, o primeiro a usar o nome Tsoknyi Rinpoche. Percebi que esse conselho se aplica desde o início da minha prática de meditação, décadas atrás, até hoje. 

Quando comecei a meditar, ainda na época da faculdade, usava um mantra como foco da minha prática. Inevitavelmente, minha mente divagava na direção de um ou outro fio de pensamentos, até que eu percebia que estava divagando e trazia meu foco de volta ao mantra. Cada vez que eu percebia que minha mente havia divagado equivalia a um momento de atenção plena. Esse tipo de atenção plena era um aparte, uma ajuda para manter o foco único no mantra. 

Depois, quando aprendi meditação de insight da tradição teravada, a atenção plena era uma parte ostensiva da minha prática. Continuei observando minha respiração, do mesmo jeito, enquanto focava no mantra, e, quando minha mente divagava — e eu percebia que ela havia divagado —, trazia minha atenção de volta à respiração. No início, essa era a instrução principal. E, da mesma forma, era um momento de atenção plena. 

Em um estágio posterior, a orientação era deixar qualquer pensamento ou sentimento ir e vir sem me deixar arrastar por ele. Aqui, a atenção plena estava vigilante, para perceber os momentos em que minha mente fosse arrastada por algum fluxo de pensamento. 

Mais adiante ainda, passei a praticar o estilo tibetano, primeiro com o pai de Tsoknyi, Tulku Urgyen Rinpoche, e, após seu falecimento, com seus filhos Chokyi Nyima, Chokling, Mingyur (todos eles Rinpoches) e, é claro, Tsoknyi Rinpoche. Dessa vez, o mindfulness se transformou em algo um pouco diferente. Em vez de fazer um esforço a mais para ter a atenção plena, essa varredura mental surge do repouso na própria consciência em si. 

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As descobertas científicas sobre cada uma dessas práticas de meditação continuam bastante robustas, mas eram incipientes nos anos 1970, quando comecei a pesquisar como a meditação ajuda na recuperação do estresse. Hoje em dia são mais de mil artigos publicados a cada ano com revisão de pares sobre meditação em geral (e mindfulness, especificamente). Recentemente, escrevi com meu velho amigo, o neurocientista Richard Davidson, da Universidade do Wisconsin, um livro resumindo o melhor dessas pesquisas.

Concluímos que a atenção plena à respiração parece ser o método mais estudado pelos pesquisadores. Estudos sólidos comprovaram uma longa série de benefícios desse método simples, sintonizando-se com o fluxo natural da inspiração e expiração, apenas observando as sensações e sem tentar de modo algum controlar a respiração. 

As conclusões mais robustas, replicadas várias vezes e de várias formas diferentes por estudos científicos, mostram que a simples observação da própria respiração, deixando outros pensamentos irem e virem (sobretudo irem), tem um efeito profundamente relaxante. No mundo tibetano, esses métodos são conhecidos como shamata ou shiney: eles acalmam. 

Agora, a ciência está comprovando esse benefício calmante. Gente que pratica a simples atenção plena à respiração, por exemplo, fica mais relaxada na vida cotidiana e se recupera mais rapidamente de reveses que os não meditadores. Esse método parece acalmar a amígdala, e por isso entramos menos vezes no estado de luta ou fuga [nota da VCSA: o autor se refere ao fight or flight, no qual o corpo reage a certos estímulos com estresse agudo, como se estivesse diante de uma ameaça à sobrevivência]

Quanto mais tempo, ao longo dos anos, você praticar esse método de atenção plena, menos reativo vai se tornando. Eventos perturbadores deixam você em estado de incômodo com menor frequência. Caso ele seja desencadeado, seu incômodo é menos potente. E — talvez esse seja o maior benefício calmante — você se recupera mais rapidamente do que antes. Na ciência psicológica, a velocidade com que você se recupera do incômodo à calma é a definição de resiliência: quanto mais rápida a recuperação, mais resiliente você é. 

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Existem outros benefícios da capacidade de manter o foco na respiração com atenção plena. Por exemplo, uma pesquisa da Universidade Stanford concluiu que, quando uma pessoa está focada em um projeto importante e precisa parar para responder um e-mail ou uma mensagem de texto, e fica navegando na internet, ao retornar finalmente ao projeto importante, o foco diminuiu. É necessário um certo tempo para que a concentração atinja o patamar anterior. A menos que você tenha feito dez minutos de atenção plena à sua respiração algumas vezes naquele dia — nesse caso, você perde pouca ou nenhuma concentração mesmo estando no modo “multitarefa”. 

Outro bônus foi descoberto na Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, onde se designou aleatoriamente um grupo de estudantes para aprender a atenção plena à respiração. Os alunos de último ano tiveram notas consideravelmente melhores no vestibular, na comparação com um grupo de controle. A prática de mindfulness parece ter melhorado a memória de trabalho, a parte da memória crucial para reter aquilo que se aprende durante os estudos. 

Por outro lado, dou um conselho a partir de minha própria experiência àqueles que estão iniciando esse tipo de prática de meditação: ao começar a meditar, muitos reclamam que a mente divaga o tempo todo; alguns chegam a concluir que são incapazes de realizar essa prática por terem a mente rebelde demais. Foi o que aconteceu comigo.

Na verdade, esse pode ser um bom sinal: quando começamos a prestar atenção nas idas e vindas da nossa mente — isto é, quando começamos a ter atenção plena — é que vemos como ela tem uma tendência normal a se distrair. É um primeiro passo para ter uma atenção mais plena e domar a mente que divaga. Uma das chaves é lembrar-se de deixar os pensamentos que afloram partirem, em vez de seguir um fio de associações. 

Outro benefício da meditação, uma maior clareza, foi descoberto em um grupo que meditou por seis ou mais horas diárias em um retiro de três meses. Eles praticaram a atenção plena à respiração (além de cultivar estados como a bondade amorosa e a equanimidade). Em vários momentos, durante o retiro e depois dele, foram submetidos a um teste em que, numa sucessão velocíssima, viam linhas de diferentes comprimentos. A tarefa: apertar um botão sempre que vissem uma linha mais curta que as outras (aproximadamente uma em cada dez era mais curta).

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O desafio era refrear o próprio impulso reflexivo de apertar o botão da linha curta quando aparecia uma linha comprida. À medida que o retiro avançava, os meditadores foram ficando cada vez melhores nessa inibição de um impulso aparentemente banal. E essa resistência ao desejo de apertar o botão foi acompanhada pela percepção de menos ansiedade, maior bem-estar geral e recuperação mais rápida das decepções. O mais revelador, talvez, é que esses benefícios duraram meses após o encerramento do retiro. 

Existe, aqui, uma dinâmica de “reação à dose”: quanto mais se pratica, maiores os benefícios. Isto foi cientificamente demonstrado de várias maneiras. Por exemplo, meditadores experientes que utilizam a técnica vipassana, ou de insight, fizeram um dia inteiro de meditação e, no dia seguinte, passaram por um exame de estresse em laboratório. Submetidos a estresse, os meditadores apresentaram um aumento menor do cortisol, hormônio-chave do estresse, em relação a um grupo controle, que não meditava.

E quando esses mesmos meditadores veteranos passaram por uma ressonância magnética cerebral enquanto viam imagens perturbadoras — por exemplo, uma vítima de queimaduras —, o nível de reatividade da amígdala foi menor. Essa reatividade reduzida deve-se a uma conexão mais potente entre a amígdala e o córtex pré-frontal, que lida com as reações emocionais. 

Aqueles que só tinham realizado a prática inicial (a atenção plena à respiração) não apresentaram essa conexão reforçada nem a reatividade reduzida. Mas a prática contínua parece aumentar essa conexão e reduzir a reatividade emocional ao estresse. Quando foram comparados os meditadores mais experientes e os menos experientes, verificou-se que, quanto mais horas de prática ao longo da vida, mais rapidamente a amígdala recuperava-se do estresse.

[…] 

Portanto, se pessoas próximas a você acham que você está perdendo seu tempo meditando, quando poderia estar fazendo algo útil, diga a elas que você está fazendo uma malhação mental. É como ir à academia, mas para a mente. 

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(Arte/Você S/A)
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