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Quatro estratégias para estudar melhor

Não há fórmula mágica para fazer o conhecimento fixar em seu cérebro. Mas a ciência já desvendou algumas técnicas que combatem as distrações e o esquecimento. Veja algumas delas.

Por Bruno Carbinatto | Ilustração: Nathalia Takeyama | Design: Brenna Oriá | Edição: Alexandre Versignassi
8 abr 2022, 06h08

Acordar, aula, intervalo, mais aula, almoço, descanso… e então chega ele, o momento mais temido: a hora de estudar sozinho.  Como começar? É melhor rever as anotações da aula? Mergulhar nos livros? Ir direto para os exercícios?

A dificuldade em montar a melhor estratégia começa na infância e segue vida adulta afora. E não se restringe a quem está fazendo algum curso, ou prestando para um concurso. Ninguém que leva a carreira a sério deixa de aprender o tempo todo, com ou sem aulas formais. Mas a maior parte de nós acaba criando estratégias sem muito critério, na base da tentativa e erro.

Até faz sentido que não haja um método único de estudo. O processo passa por questões pessoais e varia dependendo do contexto e do tipo de conteúdo. Por outro lado, estudar, aprender, nada mais é do que encontrar a melhor maneira de fixar conhecimentos novos em seu cérebro – e não esquecer deles.

E há um fato: a neurociência e a psicologia experimental (que testa o comportamento de voluntários em estudos acadêmicos) já concluíram que existem métodos melhores e piores quando o assunto é guardar novas informações na memória. Nesta reportagem, vamos examinar alguns deles.

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(Nathalia Takeyama/VOCÊ S/A)

1 – Aposente o marca-texto

O mero ato de consumir conteúdo não é algo que dê para chamar de estudo. Assistir a uma aula ou ler um texto são atos passivos, que não estimulam devidamente o cérebro. A informação pode até ficar guardada na sua memória, mas não de forma tão clara ou facilmente acessível.

Conclusão: as melhores técnicas de estudo são as ativas, as que exigem que você faça alguma coisa ao longo do processo de aprendizado. Aqui, porém, há uma pegadinha clássica. Uma das técnicas mais populares de “fazer alguma coisa” é usar marca-texto para destacar as partes importantes daquilo que você está lendo.

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Claro que isso é útil para que você volte ao texto depois e encontre com mais facilidade as partes importantes. Mas a tendência é que o comportamento se torne uma muleta para reter sua atenção. O pessoal acaba grifando metade do texto (ou mais) na ilusão de que tudo o que estiver marcado vai ficar para sempre na memória. Não vai.

Diferentes pesquisas já mostraram que a técnica tem pouca ou nenhuma eficácia se com parada à leitura normal, sem o marca-texto.¹ Afinal, o conteúdo continua chegando de forma passiva. Obviamente, não é como se o uso do marca-texto fosse proibido. Mas não vale a pena focar seus esforços num grifa-grifa interminável.

O que realmente funciona é retomar aquilo que foi apreendido em uma sessão de estudo de forma ativa. Depois da leitura ou da aula, separe um tempo para escrever tudo aquilo que você entendeu, com suas palavras. Ou então tente explicar o conteúdo em voz alta – pode ser para um familiar, um colega, ou mesmo para o cachorro ou a parede. O importante é forçar seu cérebro a processar aquilo que ele absorveu passivamente. Isso cria memórias muito mais fortes e faz com que você realmente entenda o que leu.²

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(Nathalia Takeyama/VOCÊ S/A)

2 – Esqueça e reestude

Ok, técnicas ativas são melhores em fixar conhecimento do que passivas. Mas ainda não são garantia de que você vai se lembrar delas quando precisar. A memória humana é, instintivamente, programada para deletar boa parte das novas informações que entram. Trata-se de uma estratégia evolutiva. Não fosse por esse processo autolimpante, cérebros grandes como o do Homo sapiens seriam inviáveis na natureza. Daria pau no sistema.

O primeiro passo é aceitar que o esquecimento é a regra. O segundo é buscar minimizá-lo, da maneira mais simples mesmo: reestudando o mesmo conteúdo. Mas cuidado: não adianta estudar a mesma coisa várias vezes numa tarde e depois deixar de lado. É preciso dar tempo para o seu cérebro esquecer parte dos detalhes para retomar o aprendizado.

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Parece um pesadelo para quem tem agenda curta e uma infinidade de conteúdos para estudar. Mas há duas boas notícias. A primeira é que você não precisa ficar retomando sempre as aulas do mês passado ao mesmo tempo em que aprende novos conteúdos. A maior parte do esquecimento acontece pouco tempo depois da absorção do conteúdo – então retomar o que foi estudado há apenas dois ou três dias tem basicamente o mesmo efeito antiesquecimento do que esperar um mês.

A segunda boa notícia é que o reestudo nunca vai exigir o mesmo esforço da empreitada inicial. Afinal, seu cérebro não se esquece de tudo o que foi
aprendido, então uma retomada resumida do conteúdo já basta para afastar o esquecimento como um todo.

Por falar em memória, a outra dica aqui para turbiná-la é ter boas noites de sono. O cérebro só aperta de vez o botão “Salvar” nas informações mais importantes quando você está dormindo. As clássicas oito horas de sono são fundamentais para que esse processo flua bem. Menos do que isso, complica (o número ideal de horas varia de pessoa para pessoa, mas a média são as oito horas mesmo).

Noites mal dormidas também significam que seu próximo dia será péssimo para estudos – o sono é tão prejudicial para a atenção e o foco quanto o álcool. Ou seja: dormir mal não vai prejudicar só o que você aprendeu, mas também o que ainda vai aprender. Então nada de virar a noite estudando.

Aqui entra também a dica das sonecas ao longo do dia. A ciência parece ter entrado em consenso sobre os benefícios de tirar um cochilo entre tarefas – desde que ele seja curto, coisa de meia hora. Isso ajuda a recuperar o foco e a atenção, e também a fazer uma faxina rápida no cérebro, excluindo as informações inúteis. Se sua agenda permite, experimente.

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(Nathalia Takeyama/VOCÊ S/A)

3 – Hora do foco

As distrações no meio do estudo não acontecem por mal: nosso cérebro não consegue focar numa mesma tarefa por muito tempo. Inconscientemente, você acaba focando sua atenção em outra coisa e perde o fio da meada dos estudos.

A solução é aceitar que é inevitável – ejá incorporar esses momentos na sua programação. Fazer pausas enquanto estuda é essencial, e dá tempo para seu cérebro descansar e voltar com toda potência. Uma estratégia é sempre emendar um break depois de terminar um subtópico dos estudos, por exemplo.

Outra opção é fazer intervalos fixos a cada período de tempo de estudos. Uma estratégia popular é a “técnica pomodoro”, que consiste em ciclos de foco de 25 minutos seguidos por intervalos de cinco minutos (batizada assim porque o relógio de mesa do criador tinha a forma de um tomate). Depois de quatro ciclos, o descanso é maior – quinze ou trinta minutos. Vale experimentar.

Também é importante dosar as horas de estudo – bem melhor ter sessões curtas e constantes do que concentrar toda a tarefa em uma única e cansativa tarde.

Nos momentos de foco total, a luta contra distrações precisa ser ativa. O mais óbvio é desligar o celular, a fonte inesgotável de notificações tentadoras.
Se for preciso usar o smartphone ou o computador nos estudos, há apps e extensões feitas especificamente para bloquear notificações. No WhatsApp, dê um “arquivar” naqueles grupos que não param de mandar mensagens. Nas configurações, marque o item “manter conversas arquivadas”. As notificações ficam escondidas. Quando você quiser voltar a receber as mensagens novas na tela principal, basta desarquivar. É simples.

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Outra estratégia é colocar fones de ouvido e dar play em uma música para não ceder às distrações sonoras do ambiente, ou ao tédio do silêncio. Que tipo de música? Varia de pessoa para pessoa³; e até de fase da vida para fase da vida. Há quem estudava ouvindo rock e agora só consegue com música clássica, porque o cérebro passou a se distrair com a letra. E tem quem se empolgue com as notas de Mozart e Beethoven a ponto de não prestar mais atenção no estudo, mesmo que não haja letra ali.

Nesse caso, vale a pena procurar alternativas, como o lo-fi – as melodias relaxantes, com ritmo lento e sem letra que conquistaram a internet. No Spotify, por exemplo, a coletânea de músicas do tipo lo-fi tem mais de 4,5 milhões de curtidas. O canal do YouTube Lofi Girl, mais popular do gênero, tem quase 10 milhões de inscritos. Como não possuem letra e as melodias são calmas, repetitivas e previsíveis, qualquer cérebro assimila o som sem se distrair. Também nessa linha servem faixas de sons ambientes, como barulho de chuva ou de lareira.

Estudos também mostram que uma medida simples pode ajudar no foco: variar o local de estudo. Estudar sempre no mesmo lugar faz com que seu cérebro já associe aquele cômodo a uma experiência maçante, o que gera desânimo antes mesmo de você abrir o livro. Vale um tour: um dia no quarto, outro na cozinha, no quintal, no parque, na biblioteca, na cafeteria…

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(Nathalia Takeyama/VOCÊ S/A)

4 – Coloque à prova

O cérebro é um bicho o competitivo: gosta de desafios. Fomentá-lo com perguntas sobre o conteúdo que você estudou é definitivamente parte essencial do aprendizado.4  Na verdade, pesquisas sugerem o seguinte: testar o conhecimento constantemente tem mais peso no processo de aprendizado do que fazer anotações sobre um assunto. Sempre que possível, então, vale se testar com simulados e questionários.

É importante frisar que esse momento é para realmente simular uma avaliação. Então nada de testar os conhecimentos com o livro aberto – recorra somente à sua memória. Se não souber uma resposta, deixe em branco. Não consulte a resposta, se não o aprendizado deixa de ser ativo, e volta a ser passivo. Depois que terminar, veja o que está defasado e coloque na lista de reestudos. Volte novamente aos testes e refaça o que ficou faltando.

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No caso de conteúdos mais tradicionais, aqueles das escolas e universidades, quase sempre vai ser possível achar matérias de prova na internet, sejam pagos ou gratuitos. Nos casos em que o tema estudado é mais específico e/ou abstrato, pode ser difícil encontrar testes prontos. A solução, então, é criar sua própria avaliação.

Aqui, a dica é focar em um método gamificado de testagem. Enquanto estiver estudando pela primeira vez, crie cards com perguntas sobre o conteúdo. Depois, é só deixar as cartas por aí e ir consultando-as ao longo dos dias, sempre tentando responder às perguntas. Seu cérebro vai gostar da brincadeira. Sua carreira também.

Referências: “Aprendendo a Aprender. Como Ter Sucesso em Matemática, Ciências e Qualquer Outra Matéria”, de Barbara Oakley; “Aprendendo inteligência: Manual de instruções do cérebro para estudantes em geral”, de Pierluigi Piazzi

Fontes: 

1 – Estudos “Underlining performance outcomes in expository text” (1987) e “Effectiveness of highlighting for retention of text material” (1974)

2 – Estudos “Retrieval Practice Produces More Learning than Elaborative Studying with Concept Mapping” (2011) e “Metacognitive strategies in student learning: do students practise retrieval when they study on their own?” (2009).

3 – Estudo “The Effect of Background Music on Cognitive Performance in Musicians and Nonmusicians” (2011)

4 – Estudos “Testing promotes long-term learning via stabilizing activation patterns in a large network of brain areas” (2014) e “Is testing a more effective learning strategy than note-taking?” (2017).

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