Teve discurso do Lula e Bolsonaro de máscara, mas a salvação do Ibovespa veio dos EUA
Dólar derreteu 2,5% assim que o BC despejou caminhões de dinheiro no mercado. E também teve uma ajuda da primeira votação da PEC Emergencial na Câmara, após uma nova lipoaspirada no texto.
Um mês condensado em oito horas. Foi mais ou menos assim o dia para a turma da Faria Lima. Aconteceu tanta coisa que vamos dividir esse texto em quatro frentes para dar conta de explicar tudo: 1) o discurso do ex-presidente Lula; 2) Bolsonaro de máscara e prometendo vacinas; 3) a PEC Emergencial na Câmara; 4) a inflação e o pacote de US$ 1,9 trilhão para socorrer a economia americana. Spoiler: foi o 4 (e um tantinho do 3) que salvou mesmo esta quarta-feira (10) e fez o Ibovespa subir mais de 1%. Vem com a gente pra entender.
Bem, você vive no Brasil e sabe que desde segunda só se fala em Lula – foi quando o ministro do Supremo Edson Fachin devolveu ao ex-presidente seus direitos políticos e espalhou a história de pânico do “Lula candidato” pelo mercado financeiro. Nesta quarta, o petista disse que não está pensando em 2022. Do jogo.
Só que o discurso de quase duas horas poderia ter sido em um palanque eleitoral e a uma semana das urnas. Lula atacou a Lava Jato (previsível), falou do tempo na prisão, da pandemia, de vacinas, de recuperação econômica e diálogo com os empresários, auxílio emergencial e arrematou com um “não tenham medo de mim”.
Aí o dólar caiu. “Lula derruba o dólar?” Não é bem assim, por mais divertido que tenha sido para aliados do presidente essa associação depois da segunda de “bolsa cai com Lula Livre”. Na verdade, o buraco é outro. A moeda americana disparava mais uma vez para acima de R$ 5,80 durante a manhã, e isso era culpa da bagunça fiscal do país plus os rebuliços americanos com os juros futuros, o que depois perdeu força (falaremos mais adiante). Para conter a forte alta, o Banco Central jogou dois caminhões de dólares no mercado e aí a moeda inverteu o sinal, caiu 2,50% e fechou a R$ 5,6526. No total, o BC interveio com US$ 1,45 bilhão.
Alguém (não algo) reagiu imediatamente após o pronunciamento de Lula: Jair Bolsonaro. Crítico das vacinas e negacionistas das medidas de controle do coronavírus, o presidente já disse infinitas barbaridades sobre imunizantes e máscaras. Aí, depois de duas horas de Lula defendendo vacinas, Bolsonaro assinou medidas para a compra de doses de mais dois laboratórios (Pfizer, o do Jacaré, e Janssen). Não só: ele e todos os ministros apareceram de máscara para o evento. Para arrematar, Flávio Bolsonaro, o filho zero um, pediu a apoiadores no Telegram para viralizarem (palavra dele) uma imagem de Bolsonaro com a seguinte frase: “nossa arma é a vacina”. Quem te viu, quem te vê.
Mas enquanto todo mundo acompanhava a história Lula x Bolsonaro, a Câmara dos Deputados corria para aprovar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial com medidas de ajuste fiscal em períodos de crise – a que libera o novo auxílio emergencial. Passou em primeiro turno com mais uma lipoaspirada: servidores poderão ter reajustes e promoções mesmo quando o governo não tiver dinheiro para pagar, algo que estava proibido pela versão anterior do texto.
E, acredite, a Faria Lima respirou aliviada, porque afinal tudo é uma questão de perspectiva. A manobra inicial retiraria todas as contrapartidas fiscais, tornando a PEC praticamente inútil. Isso foi durante a discussão dos destaques – que alteram partes do texto. A salvação do destaque veio no modo “até empatar”: o presidente da Câmara, Arthur Lira, manteve a votação aberta por duas horas para dar margem ao governo para negociar com deputados e reverter a derrota, dada como certa.
Não que Bolsonaro fosse exatamente contra a desidratação da PEC. Desde segunda, ele vinha sinalizando o desejo de proteger os aumentos dos policiais, que compõem sua base eleitoral. E eles usaram o poder de barganha, ameaçaram até com paralisação – o que é proibido para carreiras militares.
Bem, o mercado deu um suspiro aliviado quando a votação terminou menos pior que o esperado e a bolsa virou para o positivo. Agora o texto precisa de uma segunda rodada de votação na Câmara para entrar em vigor.
Aí veio o empurrão do exterior. O que fez o Ibovespa subir 1,30% e fechar a 112.776 pontos foi a aprovação do pacote de US$ 1,9 trilhão para apoiar a economia americana enquanto o coronavírus ainda é uma pandemia que exige isolamento social e mantém negócios fechados. O presidente Joe Biden promete sancionar o projeto na sexta-feira.
Até anteontem (sim, tudo volta à segunda-feira), o mercado financeiro acreditava que esse dinheiro causaria um sobreaquecimento da economia americana, gerando inflação. E isso obrigaria o Fed (o banco central dos EUA) a subir os juros mais rápido que o esperado até então. Essa confusão estava fazendo o juro dos títulos públicos de 10 anos subir, e derrubava as bolsas. Outro efeito do dinheiro mais caro (o juro subindo) era rarear a quantidade de dólares nos países periféricos (aka Brasil). Hoje foi dia de dar um respiro nisso tudo.
É que nesta quarta, os dados de inflação dos EUA mostraram que investidores estavam exagerando com o medo da alta de preços – eles subiram apenas 0,4% no mês, abaixo das projeções. Aí investidores decidiram antecipar a comemoração do dinheiro que está para pingar na conta, levando os principais índices de Wall Street para o positivo. O Dow Jones bateu recorde (veja abaixo os fechamentos). Essa onda de euforia é que nos ajudou por aqui depois de um dia que não deu tempo nem de beber água.
E amanhã? Vai ser outro dia.
Maiores altas
Maiores baixas
Bolsas americanas
Dow Jones: +1,46%, 32.297 pontos
S&P 500: +0,60%, 3.898 pontos
Nasdaq: -0,04, 13.068 pontos
Petróleo
WTI: US$ 64,67, +1,03%
Brent: US$ 68,16, +0,95%
Minério de ferro
+0,16%, a US$ 164,67 a tonelada no porto de Qingdao