Presidente da CBA conta como a companhia expande sua produção, ao mesmo tempo em que reduz as emissões de CO2
Ricardo Carvalho também explica como foi estruturado o primeiro crédito de carbono do cerrado.
Em 2016, a CBA se tornou uma empresa à parte de seu controlador, a Votorantim. E desde então busca estabelecer sua independência. Em 2021, a Companhia Brasileira de Alumínio passou por dois momentos importantes: o IPO da empresa, que levantou R$ 1,6 bilhão, e o lançamento de uma nova marca, a Metalex, para tratamento de sucata – de modo a ampliar a capacidade de reciclagem.
Esta última iniciativa faz parte de um dos principais objetivos da CBA: estabelecer-se como referência global em ESG, ou seja, de boas práticas ambientais, sociais e de governança.
Entre essas iniciativas está a criação do primeiro crédito de carbono no cerrado. Até então, todos eram referentes à Amazônia.
Os projetos têm chamado a atenção. A CBA participa do programa Liderança com ImPacto do Pacto Global, um programa da ONU para engajar empresas na promoção de direitos humanos, conservação do meio ambiente e no combate à corrupção.
Ricardo Carvalho, CEO da empresa, é o porta-voz da divisão de Parcerias e Meios de Implementação do OSD 17 (17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU para o Brasil).
Em setembro, Carvalho foi a Nova York participar de um painel da ONU sobre o tema, no qual falou sobre a meta da CBA de reduzir suas emissões de carbono em 40% até 2030. Até o momento, a empresa cortou 25%.
Aqui, o CEO explica como uma das maiores empresas de alumínio da América Latina pretende seguir crescendo de modo mais sustentável.
Como foi sua trajetória na indústria, até chegar à presidência da CBA?
Sou Engenheiro Químico de formação pela UFRRJ [Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro], com MBA em Gestão Empresarial pela FGV e atuo na área há mais de quarenta anos.
Comecei na Alcoa [uma das três maiores empresas de alumínio do mundo], onde trabalhei por 20 anos. Depois, fui diretor da área de níquel da Votorantim por cinco anos. Até que, por motivos familiares, com minha mãe doente, aceitei a oferta da Vale para assumir o comando da parte de alumínio da empresa, no Rio de Janeiro, onde meus pais moravam.
Depois de dez anos na Vale, a Votorantim me convidou pra ser diretor do alumínio, em 2014.
Nessa época, a operação de alumínio fazia parte da Votorantim Metais, que reunia alumínio, zinco, e outros negócios. Mas vim para o grupo já sabendo do plano de reestruturação estratégica da Votorantim Metais, que virou Nexa Resources [fruto da fusão com a peruana Milpo], em 2017.
Por que separar a CBA?
O motivo principal foi que a estratégia da Nexa não envolvia o alumínio. Eles estão na mineração de zinco, cobre e chumbo.
E a CBA ficou com o desafio de se reinventar a partir daí, aproveitando o legado que a gente tinha, resgatando e fortalecendo a cultura da empresa.
Quais as principais mudanças que a independência trouxe para a companhia?
Em 2014, reduzimos a produção porque o preço da energia no Brasil estava muito alto. No lugar, a companhia vendeu parte da energia que gerava. Logo em seguida, veio a crise de 2015 e 2016, quando também tivemos que reduzir a fabricação de produtos transformados para o mercado. Foi um período difícil, mas que gerou uma mudança na empresa.
Desenvolvemos e começamos a implantar uma estratégia que chamamos de Projeto Horizontes, cujo objetivo era definir um futuro viável para a CBA, fortalecendo um negócio que estava abalado com os cortes de produção e energia cara.
Você pode ter problemas no presente mas você jamais pode esquecer o futuro. E, com o apoio de uma das grandes consultorias de mercado, capturamos iniciativas de geração de valor de curto prazo na empresa para que isso tornasse a CBA mais robusta.
A gente deixou de ser um vendedor apenas de alumínio por quilo para se tornar um parceiro dos clientes em termos de desenvolvimento conjunto, de coengenharia e inovação.
Com a separação, tivemos que andar 100% com as nossas pernas. Já andávamos 80%, mas agora respondemos a um conselho próprio. É outra responsabilidade.
- CarreiraComo a Unilever ampliou lucros ao mesmo tempo que virou exemplo em ESG
- Mercado financeiroRamon Alcaraz, presidente da JSL, conta como administra tantas aquisições
- Mercado financeiroJânyo Diniz, presidente da Ser Educacional, conta como pretende ampliar a presença da empresa para além dos cursos tradicionais
Como foi o processo de abertura de capital em 2021?
Já tínhamos uma governança bem alinhada à de uma empresa de capital aberto porque o grupo Votorantim fez isso ao longo do tempo. Já respondíamos para um conselho, com membros independentes.
A dificuldade foi fazer um IPO na pandemia, com road show virtual e home office. O mercado de investidores no Brasil nem conhecia a indústria de alumínio. Nós tivemos que fazer um processo de educação, trazendo especialistas de fora, inclusive.
Mas fizemos um IPO de sucesso e desde então estamos muito bem em termos de implantar o que prometemos para os investidores.
Um desses projetos é o avanço na agenda ESG, certo?
ESG é um dos nossos eixos estratégicos. Temos 31 metas para 2030 com ações claras de como a gente vai chegar em cada uma delas.
Uma das metas é reduzir em 40%, em relação à base de 2019, a nossa emissão de carbono, considerando desde a etapa de mineração até a produção do alumínio fundido.
E nós já somos alumínio de baixo carbono devido a nossa fonte energética que é renovável. Além da energia hídrica, estamos entrando em eólica também.
Agora, para reduzir a emissão de CO2 temos três frentes. A primeira, que já está em operação, é uma caldeira biomassa na nossa refinaria de produção de dióxido de alumínio, o que substitui a caldeira de gás. A emissão é praticamente zero. Essa biomassa é basicamente cavaco [pequenos pedaços] de madeira. E essa queima gera dióxido de carbono, mas a madeira vem de uma floresta que replanta as árvores, em um ciclo que se equilibra.
A segunda frente é um upgrade na tecnologia dos nossos fornos. A terceira é o aumento da reciclagem.
Todas as metas ESG que temos foram desenhadas pelo comitê de sustentabilidade da CBA, que conta com representantes de todas as áreas da empresa, além do Instituto Votorantim e de uma consultoria externa. E essas metas fazem parte da remuneração variável dos nossos executivos.
E como vocês pretendem aumentar a quantidade de alumínio reciclado?
Compramos uma planta de reciclagem de alumínio secundário para a indústria automobilística neste ano, que se chama Alux. E estamos investindo em uma nova linha para recebimento de sucata com mais impurezas, para que possamos limpar a sucata e ampliar o seu potencial de captura.
Também investimos recentemente em um novo forno na unidade Metalex, que recebe sucata de clientes e a mistura com alumínio novo para fazer tarugos [barras cilíndricas de alumínio, utilizadas como matéria-prima na indústria].
E é mais barato reciclar o alumínio, certo?
Sim. Existem duas características importantíssimas que fazem do alumínio um metal maravilhoso. Ele é infinitamente reciclável – sem perdas de propriedade e praticamente sem perda de quantidade.
Há uma estatística de que 75% do alumínio produzido no mundo nos últimos cem anos ainda está em uso. E para produzir alumínio a partir de sucata se gasta apenas 5% da energia que é gasta para fazer alumínio novo.
Na Metalex, 60% do alumínio que vai nos tarugos é reciclado e queremos aumentar esse percentual para 80%.
Em algum momento a CBA vai produzir mais alumínio reciclado do que novo, feito a partir de bauxita?
Não. O reciclado vai crescer e deve chegar perto de um terço da nossa produção. Isso porque a reciclagem tem um limite. Leva um tempo até a geração de sucata de obsolescência a partir de construção civil ou do transporte – e esse ciclo é longo. Boa parte do alumínio fica anos na aplicação dele. Uma placa solar, que tem estrutura de alumínio, por exemplo, é feita para durar 30 anos.
Como vocês estruturaram o primeiro crédito de carbono do cerrado?
Ele corresponde a um pedaço do Legado Verdes do Cerrado, uma área da CBA com 32 mil hectares em Goiás, que tem convênios com várias universidades e cientistas para catalogar e proteger a fauna e a flora do bioma, além de um experimento de agrofloresta.
Poderíamos, legalmente, desmatar 11,5 mil hectares dessa área, mas decidimos preservar o carbono que foi capturado pela floresta. E é essa decisão que gera crédito de carbono. O cerrado captura um pouco menos CO2 que a Amazônia, mas também é relevante.
Em setembro, leiloamos 316 mil créditos, relativos aos anos de 2017 a 2021.
E essa crise na indústria automobilística, com a falta de semicondutores, afetou muito vocês?
No início da pandemia, tivemos um impacto de redução de venda, sim, principalmente porque a indústria automobilística naquele momento parou e a construção civil deu uma recuada muito forte. Só em embalagens que não sofremos tanto.
Mas a CBA tem uma vantagem competitiva. Como o alumínio é um produto com preço internacional definido pela bolsa de Londres, se não tem mercado interno, a gente exporta. E foi o que fizemos. Não reduzimos a produção. Pelo contrário, aumentamos um pouco a fabricação para exportação, que corresponde a 20% do que produzimos.
Para onde vai a maior parte da produção da CBA?
Temos três segmentos muito fortes, que representam mais de 60% das nossas vendas: embalagens, construção civil —somos o maior produtor de tarugo no Brasil— e transporte, com peças para a fabricação de ônibus e caminhões.
Qual a meta de crescimento que vocês têm atualmente?
Nossa produção de alumínio primário gira em torno de 350 mil toneladas por ano. Já estamos aumentando isso para 380 mil e vamos até 440 mil. Também devemos mais do que dobrar a reciclagem, que hoje está em 100 mil toneladas. E isso tudo nos próximos 3 a 4 anos.
Para isso, vocês estão de olho em mais aquisições?
Não sei se a gente vai precisar fazer aquisições, mas estamos sempre de olho em oportunidades, como no caso da Alux, uma das maiores fornecedoras de ligas secundárias de alumínio do Brasil, que foi integrada à CBA neste ano.