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Lula volta a defender mudança na meta de inflação. E juros futuros sobem novamente

"Se a meta de inflação está errada, muda-se a meta", disse o presidente. Só faltou lembrar que quem decide a meta é ele mesmo. Haddad usa o arcabouço para pressionar o BC. IPCA+2029 vai a 5,86%. Bolsa fecha a semana em queda de 1,04%.

Por Alexandre Versignassi
Atualizado em 7 abr 2023, 13h40 - Publicado em 6 abr 2023, 17h48

Haddad misturou roupa branca com roupa colorida na máquina de lavar hoje de manhã, numa entrevista à BandNews. Disse que o novo arcabouço fiscal “vai exigir, mais do que permitir, uma queda da taxa de juros, porque se as contas estão em ordem não tem por que pagar um juro tão alto, que é o maior do mundo hoje”.

Não é por aí, ministro. Quem diz não somos nós, mas Roberto Campos Neto. Ontem mesmo o presidente do BC teve de reiterar o óbvio. Falou, num evento do Bradesco BBI, que “não existe relação mecânica entre o fiscal e a taxa de juros, na forma como [tal relação] é colocada. O importante para a gente é atuar dentro do sistema de metas. Nós temos uma meta de inflação e olhamos para as expectativas.

É isso. Não cabe ao Banco Central interpretar a política fiscal do governo e tomar decisões com base do que acha ou deixa de achar. Qualquer BC sério do planeta tem o dever de cumprir a meta de inflação combinada – no caso do Brasil, de 3% para 2024.

O IPCA acumulado dos últimos 12 meses está em 5,47%. É o menor nível em dois anos – desde fevereiro de 2021, quando ele era de 5,19%. E bem abaixo do pico, de 12,13%, registrado em abril de 2022. Ótimo. Isso mostra que a manutenção da Selic em 13,75% desde agosto do ano passado teve efeito. 

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O problema é que as expectativas deram uma virada. Fevereiro veio com uma inflação mensal de 0,84% – um avanço complicado ante os 0,53% de janeiro. Para dar uma ideia, 0,53% ao mês significam uma inflação anual de 7%. 0,84%, uma de intragáveis 11%. 

O Boletim Focus, a pesquisa que mede as previsões de 140 instituições financeiras e universidades, aponta para uma inflação de 5,96% ao final do ano. Menos mal. O problema é que esse número mágico tem aumentado. Há um mês, previam 5,90%. A alta é um efeito da aceleração dos preços em fevereiro, logicamente. Com as previsões inflacionárias em deterioração, e números ainda bastante ao norte da meta de 3%, não é trivial o BC tascar um corte nos juros, como o governo gostaria. 

E dizer que “o novo arcabouço exige uma baixa nos juros” equivale a afirmar que, para jogar bem, um time de futebol precisa de estádio lotado. Faz 1% de sentido. Mas os outros 99% da razão dizem que é necessário, em primeiro lugar, que o time jogue bem – aí, sim, a torcida aparece e dá-se início a um círculo virtuoso. 

Em suma: o arcabouço deve, primeiro, baixar as expectativas de inflação futura. Enquanto isso não acontecer, não haverá um horizonte claro para o início dos cortes na Selic. 

Com a bateção de cabeça entre governo e BC dominando o noticiário, os juros futuros fecharam em alta por toda a curva temporal. E as taxas dos títulos prefixados e de inflação, que seguem essa curva, terminaram em alta, com o IPCA+2029 em 5,86%, ante 5,81% ontem, e o 2035 em 6,13%, contra 6,05% na quarta.  Já o Ibovespa não andou para lá nem para cá: ficou em mornos -0,15% nesta quinta. Na semana, acumulou queda de 1,04%. 

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Lula e a meta

Também influenciou nos juros futuros o fato de Lula voltar a criticar a meta de inflação. Aumentá-la para coisa de 4% ao ano não é um problema em si. A questão é que mudanças das regras do jogo com a partida em andamento tendem a ser mal vistas – a confiança na gestão da macroeconomia vai para o espaço. 

O presidente, de qualquer forma, tem um ponto. Roberto Campos Neto disse recentemente que, para cumprir a meta ainda este ano, a Selic deveria estar em 26,5%. Lula comentou isso e disse. “Se a meta de inflação está errada, muda-se a meta”. De fato: se é necessária uma taxa ilógica para fazer a meta, o problema está na meta. 

Então ele contemporizou: “Eu disse que não ia discutir a meta, porque esse é um problema da autonomia do Banco Central e do Senado”. 

Não é verdade. Quem determina a meta é o Conselho Monetário Nacional (CMN). E o CMN são três pessoas: ministro da Fazenda (Haddad), do Planejamento (Tebet) e o do BC (Roberto Campos Neto). 

Logo, Lula tem o poder de mudar a meta: basta combinar com Haddad e Tebet. Se ele não o fez, é porque decidiu não fazê-lo. O fato de o presidente não colocar esse ponto, essencial, nas conversas públicas sobre o assunto só adiciona incertezas a respeito da gestão macroeconômica. E com elas os juros futuros sobem. Essa é a realidade. E o resto jogo político – mal jogado.

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Maiores altas

Alpargatas (ALPA4): 5,04%

Lojas Renner (LREN3): 4,94%

3R Petroleum (RRRP3): 4,84%

Arezzo (ARZZ3): 4,71%

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BB Seguridade (BBSE3): 4,29%

Maiores baixas

Natura (NTCO3): -5,49%

Totvs (TOTS3): -4,08%

Meliuz (CASH3): -3,26%

JBS (JBSS3): -2,50%

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Assai (ASAI3): -2,43%

 

Ibovespa:  -0,15%, aos 100.822 pontos

 

Em NY:

S&P 500: 0,36%, a 4.105 pontos

Nasdaq: 0,76%, a 12.088 pontos

Dow Jones: 0,01%, a 33.485 pontos

 

Dólar: 0,16%, a R$ 5,06

 

Petróleo

Brent: 0,15%, a US$ 85,12

WTI: 0,11%, a US$ 80,70

 

Minério de ferro: -1%, a US$ 115,32 a tonelada, na bolsa de Dalian (China)

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