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Ibovespa volta aos 120K, mas Petrobras está presa no Dia da Marmota

O dia foi de alta, mas seria maior se não fosse o balde de água fria com a descoberta de uma política de preços diferente da comunicada pela estatal.

Por Monique Lima, Tássia Kastner
5 fev 2021, 19h48

Fãs do filme Feitiço do Tempo (e americanos) comemoraram no começo desta semana o Dia da Marmota. Para os perdidos, no filme, o personagem de Bill Murray fica preso no dia 2 de fevereiro e é condenado a reviver a data em que todos esperam a marmota sair da toca e decretar (ou não) o fim do inverno.

A novela dos combustíveis no Brasil se transformou numa Semana da Marmota: a primeira semana de fevereiro.

Foi no começo dessa semana que os caminhoneiros tentaram uma nova greve contra a alta no preço do diesel. A manifestação flopou, mas a ameaça foi o bastante para o presidente Jair Bolsonaro temer a perda de sua base de apoio.

E o que ele fez? A mesma coisa que havia tentado há exatamente um ano. Forçar os governadores a mudar a forma de cálculo do ICMS (imposto estadual) sobre combustíveis. Bolsonaro elegeu o tributo que não é da alçada dele como vilão. Conveniente, né?

Bem, na quinta o presidente prometeu um “comunicado sobre combustíveis” em Brasília. O que o mercado ouviu? Lá vem intervenção na Petrobras.

Mas oficialmente não foi o que aconteceu. Bolsonaro tirou da cartola, de novo, a história do ICMS, retomando a clássica caridade com o chapéu alheio — e os governadores não gostaram, óbvio. 

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Da parte de impostos que cabe ao governo federal, temos um “Paulo Guedes avalia”. É, avalia reduzir a cobrança do tributo federal (PIS/Cofins) sobre os produtos, isso sem fazer nenhum outro aumento de impostos para compensar a queda de arrecadação.

Parecia lindo, dado que estavam no Planalto Bolsonaro, Guedes e o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco. Sem anúncio de mudança na política de preços, parecia que a estatal estava a salvo. E as ações chegaram a subir mais de 3% para os papéis de PETR4 e PETR3 durante o dia. Um espetáculo.

Parecia bom demais. Era. Combustível é um problema para políticos desde a criação do motor da combustão. Foi o que levou a presidente Dilma Rousseff a interferir ativamente nos preços dos combustíveis, a ponto de colocar a Petrobras em uma situação financeira bastante difícil.

A solução para “salvar” a petroleira da ameaça de interferência foi a criação da política de preços, logo que Pedro Parente assumiu o posto de presidente da companhia, já no governo Temer.

Parecia perfeito: petróleo mais caro, gasolina mais cara. Petróleo mais barato, gasolina mais barata. O mesmo para o dólar. A ideia é que a conta sempre fecharia para a empresa, só faltou combinar com os compradores de combustíveis.

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Foi um ciclo de disparada do petróleo lá em 2018, que serviu de fagulha para a greve dos caminhoneiros. Durou 10 dias, desestabilizou a economia e deu a primeira marretada na perfeita política de preços da Petrobras. Ainda na saída da recessão, caminhoneiro algum tinha condições de bancar a alta de custos para rodar as estradas. Para piorar, tinha mais caminhão que carga para transportar, o que deixava o frete cada vez mais barato e a conta cada vez mais difícil de fechar.

Foi quando o governo Temer anunciou o congelamento do preço do diesel e um mecanismo financeiro que mitigaria o impacto para o caixa da Petrobras. Sim, nossos impostos pagaram essa conta.

Ainda naquele ano, a Petrobras desistiu dos reajustes diários da gasolina, que afetava mais diretamente os taxistas e uberistas desse país.

Em 2019, sob governo Bolsonaro, a ladainha recomeçou. Nos primeiros meses, ele mandou a Petrobras suspender um reajuste e disse “que tinha feito mesmo”. As ações da companhia derreteram 8%. 

E assim a política de preços foi sendo pouco a pouco esvaziada. A pá de cal, tudo indica, veio no final do ano e no escurinho da estatal. Desde que abandonou o reajuste diário, a Petrobras tinha estabelecido um intervalo mínimo para reequilibrar preços, eram 15 dias. O prazo máximo para reajustar as contas era de três meses.

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Nas últimas horas do pregão desta sexta-feira, quando a Faria Lima se preparava para sextar, a agência de notícias Reuters soltou uma bomba: o prazo recentemente havia sido ampliado para um ano, o que, na prática, sepulta a política de paridade com os preços no exterior. A estatal não respondeu à reportagem da Reuters e também não havia divulgado comunicado ao mercado até a conclusão deste texto.

Foi o suficiente para investidores colocarem o pé no freio. As ações da estatal chegaram a cair no meio do pregão, mas no fim voltaram ao positivo. Ainda assim, bem distante dos 3% que passaram boa parte do pregão.

Considerando os 10% de peso que os dois papéis juntos têm no Ibovespa, ajuda a explicar a alta do dia e depois a desaceleração. A bolsa não só tinha recuperado seus 120 mil pontos, como superado eles e alcançado 121.116  pontos. 

Com o balde de água fria na Petro, caiu para 120.240 pontos, após subir 0,82%. 

Mas o dia foi bom para outras empresas, por outros fatores. 

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A começar pelo minério de ferro lá na China. Na próxima semana, o país oriental vai ter o feriado do Ano Novo Chinês e a expectativa é de que após as comemorações, a demanda pela commodity aumente com os armazéns reabastecendo seus estoques de aço — a gente sabe bem como é isso, se aqui o ano começa depois do carnaval, lá é depois do ano novo chinês. 

Com isso, os papéis negociados no porto de Qingdao valorizaram 3%. 

Não só. O Credit Suisse disse em seu relatório que as siderúrgicas brasileiras planejam um novo aumento para os preços dos aços neste mês. A alta pode chegar a 15%, de acordo com o banco.

As siderúrgicas por aqui aproveitaram o movimento e subiram junto, com destaque para a Cia. Siderúrgica Nacional, que disparou 7,36% e a Vale, que não subiu ontem com a conclusão do acordo com o governo de Minas Gerais pela tragédia em Brumadinho, mas se recuperou bem hoje: 3,81%. 

O outro reforço veio do lado de lá do Equador. Como acontece dia sim dia não, as bolsas de Nova York tiveram um dia de altas. O S&P 500 ganhou 0,39%, para 3.886,83 pontos e o Nasdaq valorizou 0,57%, aos 13.856,30 pontos.

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O curioso está no contexto dessas subidas. Porque a disparada foi depois de uma péssima notícia sobre a criação de novos empregos nos Estados Unidos. 

O relatório divulgado hoje (5) pelo Departamento do Trabalho mostrou a criação de 49 mil postos de trabalho não-agrícolas em janeiro. Um número frustrante. A estimativa média dos analistas consultados pela Bloomberg apontava para a criação de 105 mil vagas.  

Outra surpresa negativa foi a revisão dos números de dezembro. Eles mostravam a extinção 140 mil vagas no final de 2020, mas esse número foi revisado para cima: 227 mil empregos perdidos. 

Porque o mercado curtiu a notícia então? Por sadismo? Claro que não.

A “boa notícia” do desemprego em alta é que ela ajuda a dar caráter de urgência para a aprovação do US$ 1,9 trilhão que é o novo pacote de estímulos que o governo Biden quer injetar na economia. Como já explicamos aqui, esse dinheiro acaba escoando, e vai parar nas bolsas de valores. Não só nas de lá – nas do mundo todo. Daí o Ibovespa também ter respondido com alegria à má notícia. 

Mas a indefinição sobre a Petrobras pesou mais. Resta fechar a semana com o alívio de ter voltado aos 120K. 

 

MAIORES ALTAS 

CSN: 7,36%

Usiminas: 4,41%

Gerdau: 4,36%

Vale: 3,81%

Metalúrgica Gerdau: 3,77%

 

MAIORES BAIXAS 

IRB: -2,95%

B2W: -2,12%

Braskem: -1,85%

LCAM: -1,57%

Cyrela: -1,51%

 

Petróleo 

Brent: 0,85%, para US$ 59,34 o barril

WTI: 1,10%, cotado a US$ 56,85 o barril

Dólar: -1,2%, a R$ 5,38

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