Líderes narcisistas são os mais interessados em ler material sobre liderança
Um estudo revelou que o engajamento dos narcisistas em textos acadêmicos sobre o tema é motivado, claro, pela preocupação em cultivar a própria imagem – e não pelo genuíno interesse no bem-estar da equipe.
O espaço profissional exige, para que o trabalho flua de maneira eficiente e sem atritos, colaboração. Esta, por sua vez, pressupõe entrosamento, cooperação, companheirismo e, talvez mais que tudo, confiança. Eis aí alguns ingredientes importantes de um ambiente de trabalho saudável. Tudo isso, no entanto, fica comprometido se há um narcisista a bordo – principalmente em cargos de chefia. E ainda mais se este pesquisa e vai a fundo em teorias científicas sobre liderança.
Isso porque, segundo uma pesquisa recente, publicada na revista especializada American Psychologist, o interesse por esse tipo de teoria é maior quanto mais narcisista for a pessoa. O resultado da pesquisa, segundo os estudiosos, sugere que o engajamento das pessoas nestas buscas é motivado mais por uma preocupação consigo próprio – e menos por um genuíno interesse pelo bem coletivo. Seria como se buscassem fundamentação acadêmico-científica para serem como são.
A fixação por si mesmo chamada narcisismo é definida na literatura psicanalítica como um transtorno de personalidade. O nome – como tantos outros na psicanálise – é extraído da mitologia grega, na qual tem um caráter de maldição: a deusa Nêmesis condenou Narciso à paixão por seu próprio reflexo na água de um lago.
Alguns traços desses transtorno são, por exemplo, o tomar para si o crédito por todo sucesso; ignorar as necessidades de outras pessoas; achar-se no direito à atenção e admiração de todos; entre outros. Muitas pessoas exibem tais traços de personalidade, e algumas delas estão em posições de liderança.
Mas não há (exceto, talvez, entre os próprios narcisistas) ninguém que veja como é possível uma equipe, e no limite uma empresa, prosperarem com chefias que não valorizem as conquistas da equipe, as eventuais contribuições individuais de colaboradores, e que queiram ficar com todo o crédito. Com, é claro, o efeito colateral bastante desagradável de apontar “culpados” quando surge um problema: se algo deu errado, a culpa certamente é de alguém – mas nunca dele.
Muitas vezes, o narcisista só se revela quando já chegou ao topo. Talvez alguém perceba traços disso enquanto ele ainda não se tornou chefe, mas não bastam para soar o alerta e avisar que se está lidando com alguém assim. Esse comportamento narcísico tende a disseminar a desconfiança, desagregar equipes até então coesas e comprometer mesmo a ética da empresa. Quando eventualmente deixam o cargo, fica no rastro de sua passagem um estrago que leva tempo para ser desfeito.
Essa noção parece um pouco contraditória com a imagem de lideranças que acabou sendo glorificada: autoconfiança geminada à arrogância, o instinto implacável de pisar em quem for preciso para chegar aonde se quer, o assumir riscos desproporcionalmente grandes. O filme Enron – Os Mais Espertos da Sala (2005) traz uma ideia de como são as atitudes de uma chefia narcisista (a quebra da Enron, uma gigante de energia dos EUA, foi uma das maiores já registradas na economia norte-americana).
O que define um líder não narcisista, então? Receitas de liderança existem aos milhares, claro, e nenhuma é completa ou necessariamente melhor que a outra. O que se pode dizer é que em qualquer uma delas, sejam quantos forem os itens, não poderá faltar a confiança – que é algo que o chefe narcisista é incapaz de compreender. Uma equipe que vê no líder uma figura que empregará suas habilidades para que todos possam reconhecer seu valor no produto final do trabalho conseguirá entregar resultados ótimos. Em tempos de trabalho híbrido e conectividade, que tornam imediatos os efeitos de qualquer decisão, e nos quais a confiança é insumo cada vez mais essencial, não há espaço para líderes que só têm olhos para si mesmos.