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Quer ser mais produtivo durante seu dia de trabalho? Vá ao cinema

Em novo livro, Cal Newport, professor da Universidade de Georgetown, defende que nosso conceito de produtividade está quebrado – e que para consertá-lo é preciso fazer menos, de forma mais eficiente. Entenda.

Por Sofia Kercher
24 set 2024, 08h00
Pessoa sentada numa sala de cinema sozinha.
 (Marius Gire/ Unsplash/VOCÊ S/A)
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V

amos pensar em dois cenários: uma plantação de milho e uma fábrica de automóveis. Como medir a produtividade de ambas essas operações?

Nos dois casos, o sucesso pode ser mensurado por uma correlação clara: quantidade x tempo. Quantos carros estamos produzindo por hora de trabalho pago? Quantas toneladas de milho estamos produzindo por temporada? Quanto mais produtos e menos tempo, melhor.

Parece simples – e é mesmo. Isso também permite uma clareza no sistema de produção, vide: é assim que os carros são feitos. É assim que o milho é plantado. Se há mudanças nesse sistema, basta olhar para a proporção inicial e concluir se as coisas melhoraram ou pioraram, e se vale a pena (ou não) implementar aquele método no fluxo de trabalho. Menos milho, ruim. Mais carros, bom. Por aí vai. 

Beleza. Essa foi a maneira que encontramos de medir a produtividade das operações (e, consequentemente, dos trabalhadores) lá no comecinho do século XVI, com a Revolução Industrial. As coisas só começaram a mudar do começo para a metade do século passado. Surge uma nova categoria de trabalho: o de conhecimento.

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Esse trabalho está mais relacionado com valor. Ou seja: você aplica suas habilidades e gera um projeto para adicionar valor a qualquer material. Pode ser um carpinteiro usando madeira para confeccionar um móvel, uma jornalista usando entrevistas para escrever uma reportagem… o que importa é que, no final da tarefa, há algo mais valioso do que quando você começou. 

Essa nova forma de trabalhar faz com que mensurar produtividade fique mais complexo. Afinal, as pessoas de uma mesma equipe podem desempenhar funções e ter projetos completamente diferentes – ou seja, não dá mais só para medir com base naquilo que está sendo produzido. Também não existe mais um sistema de produção centralizado (obliterado de vez pelo modelo de trabalho híbrido – cortesia de um vírus que apareceu pelo caminho). 

Cada pessoa passa a organizar sua forma de trabalho da maneira que achar melhor. E isso coloca as empresas em um pepino: como eu consigo medir se posso fazer mais do que isso? Como sei que os funcionários estão fazendo o melhor que podem? Como medir produtividade?

Para Cal Newport, professor de ciências da computação na Universidade de Georgetown (EUA) e apresentador do podcast Deep Questions, foi desse dilema que nasceu um dos principais problemas da nossa força de trabalho contemporânea: a pseudoprodutividade.

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Destrinchando o termo

Em linhas gerais, a pseudoprodutividade funciona da seguinte forma: vamos usar o esforço visível como um indicador de atividade útil. Vulgo: ver que você está fazendo algo é melhor do que não ver você fazendo algo. Não importa o que esse algo seja.

Portanto, estabelece-se aquele modelo clássico (e hoje já notoriamente ultrapassado) de trabalho: os funcionários se reúnem em escritórios durante oito horas, ficam sentados juntos por aquele tempo, seus líderes, chefes e superiores observam-os enquanto eles fazem as coisas que precisam. Assim como nas fábricas de carros. Assim como nas plantações de milho. 

Como você mostra mais produtividade nesse sistema? Só chegar mais cedo e sair mais tarde do escritório, claro. “Essa é uma noção clássica de pseudoprodutividade: atividade é o que é valioso”, argumenta Newport no mais recente episódio de seu podcast, Deep Focus.

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Isso faz com que o trabalho dos gestores seja muito mais fácil – e que o dos criadores seja miserável. Afinal, estar presente fisicamente no escritório e ser observado pelo seu chefe não te ajuda a ser mais produtivo – muito pelo contrário.

“A criação é melhor servida quando composta por uma mistura de autonomia e responsabilidade. Do tipo: eu sei o que eu preciso fazer, veja o que eu fiz, me diga se está de acordo; ao mesmo tempo que me deixe sozinho para que eu consiga fazê-lo de fato”, explica.  

A pseudoprodutividade funciona da seguinte forma: vamos usar o esforço visível como um indicador de atividade útil. Vulgo: ver que você está fazendo algo é melhor do que não ver você fazendo algo. Não importa o que esse algo seja.

Descontentes e inseguros com esse novo fluxo, gerentes podem tentar sabotar o processo criativo dos colaboradores com dezenas de reuniões semanais, centenas de e-mails, mensagens de texto… atividades que ele considera como mecânicas. “Para pessoas que estão querendo criar, há uma destruição do fluxo criativo. É esperar que elas sentem, trabalhem oito horas ininterruptamente, e que lidem depois com o burnout”, adiciona.

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Isso mesmo: burnout. Para Newport, a pseudoprodutividade inevitavelmente leva à sobrecarga. Afinal, se quantidade de horas e quantidade de trabalho é o medidor para produtividade, dizer não para qualquer tarefa é comprovar que você não está produzindo o suficiente. 

“’Eu tenho que dizer sim às coisas até que eu esteja tão sobrecarregado que eu tenha cobertura emocional-social para dizer não a algumas coisas’. Então isso mantém todo mundo com cerca de 20% de coisas a mais para fazer”, explica em entrevista a Clay Skipper, da GQ. 

Soluções para líderes e liderados

Newport aborda essas questões em seu novo livro, Slow Productivity: The Lost Art of Accomplishment without Burnout (Produtividade Lenta: A Arte Perdida de Atingir Objetivos Sem Burnout, ainda sem tradução para o português).

Para o problema dos funcionários criativos, três soluções: faça menos coisas; trabalhe em um ritmo natural a você; seja obcecado com qualidade. Ele acredita que esses passos vão não somente diminuir nossos índices de burnout, mas também nos transformar em pessoas mais produtivas e que entregam mais valor no trabalho.

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Para atingir esses objetivos, o especialista desafia as estruturas da pseudoprodutividade. Trabalhou seis horas e atingiu o seu teto máximo daquele dia? Que tal desopilar os pensamentos e ir ao cinema, dar uma caminhada, sair da frente do computador? Aquelas horinhas que você descansou sua mente podem fazer toda a diferença no seu processo criativo, na qualidade da entrega do trabalho. Tanto a empresa quanto você saem ganhando. 

Descontentes e inseguros com esse novo fluxo, gerentes podem tentar sabotar o processo criativo dos colaboradores com dezenas de reuniões semanais, centenas de e-mails, mensagens de texto…

Ele também aconselha uma divisão de tarefas radical: trate suas funções manuais, como ler emails, responder mensagens, marcar reuniões, organizar sua agenda, como um trabalho completamente diferente. Finja que tem dois empregos, duas funções, e trabalhe em blocos. “Eles devem ter sistemas diferentes, organizações diferentes e, acima de tudo, tempo diferentes. Você trabalha apenas em um e outro”, aconselha o especialista no podcast. 

Isso para os trabalhadores. Mas e para as lideranças? Newport explica que, com base nesses dois grupos, podemos entender o problema dessa economia do conhecimento: os líderes tratam os trabalhadores como seres humanos desempenhando tarefas mecânicas. 

“Quando você está lidando com criadores, trate-os de acordo. Dê a eles autonomia, liberdade. Faça isso sem vigilância ou interrupções excessivas. Por outro lado, não deixe de responsabilizá-los pelas suas funções”, aconselha. Assim, uma interferência só será necessária quando as coisas não chegarem a um nível de qualidade adequado. 

“Não vou ficar olhando por trás do seu ombro como se eu fosse um gerente numa fábrica da Ford! Não vou ficar chateado se não consigo ver atividades claramente a todo momento. Não vão demandar que você participe de reuniões e fique lendo e-mails!”, finaliza.

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