Profissionais negros não devem temer a visibilidade no caminho à liderança
Posicione-se com base nos seus valores. Ser líder é ter coragem, autenticidade e propósito.

ra um evento corporativo de fim de ano. Ambiente sofisticado, coquetel, ternos sob medida. Um diretor de outra unidade, visivelmente influente, após assistir à minha apresentação sobre os resultados da unidade de negócios em que eu era o principal executivo, aproximou-se, me olhou por alguns segundos e disparou:
“Você tem algo diferente. Algo que não se ensina.”
Na hora, agradeci com um sorriso educado. Depois, em casa, fiquei pensando: o que ele viu em mim?
E foi aí que caiu a ficha. O que me destacava ali – entre tantos profissionais qualificados, experientes – não era só minha técnica, meu currículo ou minha performance. Era o que eu representava. Era meu propósito. Era a minha história, alinhada com a minha entrega. Era o meu valor.
Se você fosse meu aluno, eu te diria:
No mundo corporativo, há algo mais poderoso do que saber executar uma planilha ou liderar um projeto.
É saber o porquê de você estar ali. É alinhar sua presença a um propósito.
E mais: é fazer com que os outros percebam esse valor.
O valor que você entrega precisa ser visível – e inegociável.
Pedro Jaime em suas pesquisas defende que a autenticidade, a originalidade e o propósito não são apenas virtudes: são diferenciais competitivos. Em ambientes nos quais o modelo dominante ainda é branco, masculino e eurocentrado, ser uma pessoa negra autêntica, com uma história que se conecta ao que você faz, é revolucionário – e estratégico.
Mas isso exige uma decisão consciente: você vai esconder quem você é para se encaixar ou vai posicionar sua trajetória como o maior ativo da sua liderança?
Crie seu próprio padrão
A pesquisadora Fernanda Santos aponta que os executivos negros que se conectam às suas origens e constroem uma identidade profissional sólida a partir de suas vivências têm melhor desempenho em suas trajetórias de liderança. Isso porque não tentam se moldar ao que esperam deles. Eles criam seu próprio padrão.
E, sim, isso dá medo.
Medo de ser visto como “radical”, “militante”, “diferente demais”.
O valor que você entrega precisa ser visível – e inegociável.
Mas deixa eu te contar uma coisa: ninguém lidera sendo igual.
As lideranças mais admiradas do mundo não são as mais técnicas, são as mais autênticas.
Posicionamento não é agradar. É ocupar.
Muitas pessoas negras no mundo corporativo foram ensinadas a ser discretas, a não chamar atenção, a “ficar na média” para não incomodar. Mas, como Jaime bem coloca, a liderança negra só se sustenta quando é guiada por um valor nítido – que não se explica apenas por competência técnica, mas por uma causa.
Não estamos falando de marketing pessoal vazio. Estamos falando de um posicionamento com base em valor real.
Você não é só mais um número no organograma. Você é alguém que carrega histórias, ideias e potências únicas. E é esse valor que precisa ser colocado na mesa – mesmo que ninguém te peça.
Posicionar-se é comunicar sua existência com potência.
O sistema quer que você se esconda
Muitos pesquisadores destacam que líderes negros muitas vezes são forçados a adotar posturas “mais suaves” para serem aceitos – evitando expressar entusiasmo, liderança ou opinião forte, por medo de serem mal interpretados como agressivos.
Mas qual o custo de se apagar para ser aceito?
Se você fosse meu aluno, eu te diria:
Você não precisa de permissão para se posicionar. Mas precisa de estratégia.
E essa estratégia começa por responder a três perguntas:
- O que eu represento neste ambiente?
- Qual transformação eu provoco com minha presença?
- Como posso comunicar esse valor com coragem e consistência?
Posicionar-se é comunicar sua existência com potência.
A resposta a essas perguntas forma o alicerce do seu posicionamento estratégico. E isso, meu caro, não se ensina em MBA nenhum.
Liderança não diz respeito a você. Diz respeito ao impacto de ser você.
Quando você lidera com base no seu valor, não é só sua carreira que muda. É a percepção que os outros têm sobre o que é possível para uma pessoa negra naquele espaço.
Você se torna uma referência.
E, como disse no primeiro artigo, referências abrem caminho. Para você e para quem vem depois.
Então, da próxima vez que alguém te perguntar o que você faz, não diga só seu cargo.
Diga o que você entrega. Diga o valor que você representa.
Esse é o começo da verdadeira liderança negra: aquela que é técnica, sim – mas que nasce do propósito, da história e da coragem de se posicionar.
Nos vemos no próximo artigo.
E, se você fosse meu aluno, eu te diria: ninguém constrói respeito tentando ser invisível.