Carreiras quentes: veja as áreas com mais demanda por profissionais para 2024
55% das empresas estão mais confiantes para o próximo ano – o que significa mais planos de contratações. O Guia Salarial da consultoria de recrutamento Robert Half, divulgado com exclusividade pela VC S/A, mostra quais as profissões que estarão em alta e como andam as remunerações nessas áreas.
ano de 2023 contrariou a lógica, ao menos quando o assunto é o mercado de trabalho. Essa é a avaliação de Fernando Mantovani, diretor-geral da Robert Half América do Sul. Isso porque, nos primeiros meses, pipocaram nos jornais vários episódios de demissões em massa – os layoffs –, afetando principalmente empresas de tecnologia e startups. Criou-se um medo generalizado entre profissionais, que temiam ser os próximos a perder o emprego.
Não à toa. Com os juros nas alturas e depois de um longo período de inflação que abateu o consumo, as companhias correram para controlar os custos.
O natural era que, num cenário desses, o desemprego subisse. Mas é aí que a lógica falha: há meses o mercado de trabalho brasileiro está aquecido, e a taxa de desocupação cai. No trimestre terminado em agosto o número fechou em 7,8%, o menor patamar desde 2015. Entre a mão de obra qualificada, ronda os 3,5% – praticamente pleno emprego.
Outras surpresas positivas ao longo do ano ajudaram a firmar um certo otimismo no mercado. A inflação se fixou em patamares tragáveis, e o PIB, após surpreender economistas, deve crescer 3% – contra uma previsão de apenas 1% no começo do ano.
O resultado é que 40% das empresas estão “um pouco mais confiantes” para 2024 em relação a 2023; 15% se dizem “muito mais confiantes”. Só 4% estão “menos confiantes”. Entre os profissionais, as respostas também são parecidas.
São dados do Guia Salarial 2024, elaborado pela empresa de recrutamento Robert Half e divulgado com exclusividade pela VC S/A. O guia traz as expectativas das carreiras com mais demanda para o ano que vem.
Com os juros em trajetória de queda e o aquecimento do mercado, empresas começam a tirar projetos da gaveta e buscam contratações. Como o otimismo é recente, porém, e ainda há cautela sobre a força da economia, os salários não devem ter saltos tão fortes.
E esse nem é o maior foco dos profissionais. É que 2024 deve ser o ano da consolidação do novo (ou velho) modelo de trabalho. Empresas e profissionais vivem um cabo de guerra sobre trabalho presencial, remoto ou híbrido. Em 2023, várias companhias começaram a puxar os trabalhadores de volta para o escritório e as vagas 100% remotas minguaram. Mesmo assim, candidatos batem o pé e ainda exigem flexibilidade. Em muitos casos, o regime de trabalho vem antes do que a remuneração nas prioridades dos profissionais, garantem os recrutadores da Robert Half.
Veja abaixo os destaques de cargos e salários para as seis áreas de atuação que devem bombar em 2024.
Como ler as tabelas salariais
Os salários listados não incluem bônus, benefícios e outras formas de remuneração. O valor de cada cargo é dividido em três perfis nos quais cada faixa é determinada pelo nível de qualificação, experiência do candidato e complexidade do cargo. Os comparativos salariais entre os anos de 2023 e 2024 foram feitos com base no perfil B, no qual a maior parte dos profissionais se encontra.
- Perfil A – Já tem uma experiência mais relevante, com pós-graduação, certificações e especializações. Também costuma ter o domínio do inglês.
- Perfil B – É aquele que preenche a maioria dos pré-requisitos da vaga – não precisa de desenvolvimento para exercer satisfatoriamente o cargo.
- Perfil C – Profissional com pouca experiência, ou que acabou de ser promovido, e que precisa de desenvolvimento para exercer plenamente a função.
Tamanho da companhia*: P – Pequena | B – Boutique** | M – Média | Grande
*Divisão baseada em faturamento — P/M: até R$ 500 milhões; G: acima de R$ 500 milhões. No caso dos escritórios de advocacia, o parâmetro é outro, de acordo com número de advogados — P e B: de 1 a 30; M: de 30 a 150; G: acima de 150.
**Classificação exclusiva para o setor jurídico. Os “escritórios boutique” são pequenos, mas altamente especializados e segmentados.
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR DE TECNOLOGIA
Plot twist
Algo inesperado aconteceu no setor mais badalado do mercado de trabalho em apenas um ano. A área de tecnologia – anteriormente marcada por uma falta de mão de obra qualificada e que vinha liderando os aumentos salariais nos últimos anos – não é mais tão pop assim.
O mercado perdeu força do ano passado para cá. Quem garante são Marcia Ignez e Carolina Cabral, da Robert Half, que acompanham o recrutamento desse mercado de perto.
Os layoffs afetaram principalmente profissionais da área. É que, no passado recente, empresas tinham investido pesado em tecnologia, e os salários acumulavam ganhos acima da média do mercado. Quando foi preciso cortar, era o local com mais gordura.
Mas não dá para afirmar que o mercado esfriou. “Acho que saímos de um superaquecimento para um aquecimento”, resume Mantovani, diretor geral da Robert Half. É que vagas do tipo sempre existirão.
Anteriormente, porém, o mercado era totalmente comandado pelos candidatos. Tanto que o setor era o que mais apostava em modelos superflexíveis de trabalho, e empresas viviam uma espécie de guerra por talentos. Agora, o cenário deu uma equilibrada.
Mesmo assim, todas as áreas de tecnologia seguem como uma boa oportunidade. Um dos vários destaques fica para o segmento de segurança, com o aumento do interesse por temas como privacidade, vazamentos de dados, fraudes digitais e ataques hackers.
DIDATISMO
Everson Holovaty está no mercado de tecnologia há quase três décadas, e já passou por setores como análise de sistemas, programação e, nos últimos cinco anos, se especializou em segurança de dados. Hoje, é coordenador de TI da empresa paranaense Pormade Portas, uma das maiores indústrias de portas do Brasil – e que tem um e-commerce próprio.
Vendo de perto a evolução das tecnologias nas últimas décadas, Everson diz que trabalhar na área de segurança significa um estudo permanente: “Quando uma empresa começa a se prevenir, o hacker que quer invadir também começa a procurar novas técnicas de ataque. Então a formação é constante: se você preenche uma lacuna, pode ter certeza de que outra vai abrir”, diz.
Ele também destaca uma soft skill importante, e muitas vezes ignorada por profissionais da área: o didatismo. Segurança de dados de uma empresa, afinal, depende de todos os funcionários – e o menor deslize inocente de alguém pode colocar tudo em xeque. Por isso, os profissionais de TI devem ser didáticos e evitar falar a linguagem técnica.
“Capacidade de ensinar”, aliás, é uma das soft skills citadas no guia da Robert Half como as mais buscadas por recrutadores em profissionais de tecnologia.
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PROFISSÕES EM ALTA NO MERCADO FINANCEIRO
Do crédito ao private
O Brasil tem mais de 70 milhões de pessoas inadimplentes, segundo o Serasa. O problema é tão grande que o governo federal precisou lançar o programa Desenrola, para renegociar dívidas e limpar o nome das famílias.
Nesse cenário, empresas do ramo financeiro (como bancos, fintechs e meios de pagamento) apostam em profissionais especializados em crédito – analistas, especialistas e diretores. São cargos cujo objetivo é analisar e tentar prever quais operações são mais interessantes para a empresa.
“É uma área muito estratégica para companhias financeiras para garantir uma tomada de decisão mais rápida, mais segura e reduzir o nível de inadimplência”, diz Sara Santos, gerente da Robert Half.
Outro segmento que segue aquecido é o de private banking, o setor de serviços bancários e financeiros para quem tem grande patrimônio e carteira de investimentos (acima de R$ 10 milhões).
Antes, esse tipo de serviço se concentrava em bancões. Nos últimos anos, corretoras lançaram seus próprios escritórios para competir, e há demanda por especialistas.
Entre as habilidades necessárias para os profissionais do mercado financeiro, é preciso estar antenado ao cenário regulatório, que vive em constante atualização, e buscar as certificações exigidas para cada cargo. Assessores de investimento, por exemplo, precisam passar na prova da Ancord.
Mercado empático
Sharon Halpern se formou em Odontologia, mas migrou para o mercado financeiro quando dois amigos decidiram abrir um escritório de investimentos. Foi preciso muito estudo e especialização para atuar na área de private, em que está desde 2017. Mas a parte técnica é apenas uma fração do trabalho que hoje realiza na Blackbird Investimentos: “A maior parte do meu dia a dia eu passo mais fazendo psicologia do que outra coisa”, brinca ela.
É que o segmento de private banker é o que mais demanda soft skills na área financeira, já que é preciso lidar diretamente com a vida privada de um cliente – entendendo seus planos, estrutura familiar, problemas íntimos, disposição de risco… “Eu uso muito mais da minha comunicação e de empatia do que números e contas – que também são importantes, mas não é o que você mais precisa”, conta.
Saber interpretar pessoas e contextos é uma dessas soft skills citadas pela private banker. Se um cliente está passando por uma fase estressante de sua vida, por exemplo, o profissional pode indicar uma carteira mais conservadora para evitar perdas no período mais sensível, mesmo que o cliente seja arrojado.
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR DE FINANÇAS
A volta dos IPOs?
Na pandemia, a área de finanças foi essencial para controlar gastos e manter as empresas de pé durante a crise. Nisso, se destacaram cargos ligados à contabilidade, controle fiscal e tesouraria. Depois, na retomada, o foco ficou em profissionais mais estratégicos em planos de expansão, como nas áreas de planejamento financeiro, fusões & aquisições e modelagem financeira.
Agora, com um misto de otimismo para expansão e cautela nos custos das empresas, a demanda do mercado de profissionais de finanças está pulverizada entre todas as áreas, diz Danielle Nakaya, gerente da Robert Half.
Uma novidade pontual para 2024 é a demanda por profissionais da área de relações com investidores (RI), que fazem a ponte entre empresas de capital aberto e acionistas.
Desde agosto de 2021, não há nenhuma abertura de capital na bolsa. Nessa seca, “muitas pessoas de RI acabaram migrando para áreas correlatas por falta de posições – e não pretendem voltar porque são profissionais mais conservadores”, diz Danielle. Agora, com juros caindo, esperam-se novos IPOs e, consequentemente, a disputa para atrair talentos específicos da área. “Se a tendência se comprovar, nós teremos belíssimos desafios de recrutamento na área de RI em 2024.”
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR JURÍDICO
Reforma tributária
O tradicional mercado do direito segue aquecido, seja em escritórios, seja em empresas. Aqui, um destaque é a área de direito digital, cuja tendência de alta dos últimos anos deve se repetir em 2024. Assim como em tecnologia, a digitalização dos negócios vem acompanhada de desafios relacionados à privacidade, fraudes e crimes cibernéticos.
Além disso, a inteligência artificial – tema que bombou em 2023 – tem impacto direto nessa área. No mundo todo, regulações novas devem surgir com o avanço das máquinas, e, aqui, discute-se no Congresso um marco legal específico para o tema.
Não é a única atualização da lei que tem impacto no mercado de trabalho, diga-se. Outro tema que afeta os trabalhadores da área jurídica é a reforma tributária. O projeto já foi aprovado na Câmara e segue em discussão no Senado, onde também deverá passar. A lei entra em vigor em 2026, mas, segundo os recrutadores da Robert Half, as empresas já começaram a contratar advogados da área. A ideia é avaliar desde já como será a adaptação ao novo regime – e refazer o planejamento tributário conforme as novas regras de maneira mais tranquila.
Por fim, com as companhias focadas em expansão e retomada dos negócios, o segmento de direito empresarial geral, principalmente com foco em contratos, fusões e aquisições e compliance também se aquece.
Corda bamba
Empresas brasileiras gastam em média 1.958 horas por ano só para pagar impostos, segundo o Banco Mundial. Isso porque, você sabe, nosso sistema é confuso, complexo e burocrático. O foco da reforma tributária é simplificar esse purgatório, mas, até ela sair do papel, a missão do profissional da área é facilitar o pagamento de impostos. Não é uma tarefa fácil, garante Giuliano Gioia, advogado tributarista da Sovos, multinacional que presta serviços tributários para empresas como Ambev e Renner.
A ideia da Sovos é usar a tecnologia para simplificar o caminho das pedras, e é nesse sentido que o mercado vem evoluindo. “Ficou no passado essa história de consultar a ‘lei X, artigo Y’. Hoje, o empreendedor quer apertar um botão e calcular o imposto de determinada operação na hora”, diz Giuliano. Por isso, cada vez mais advogados precisam ter um pezinho no mundo da tecnologia e buscar conhecimento técnico na área.
Mais: é justamente por andar nessa corda bamba entre o Estado e a iniciativa privada que uma das soft skills mais exigidas dos advogados da área é a comunicação, já que é preciso traduzir para o português o sistema tributário para leigos, que naturalmente são aversos ao assunto “impostos”.
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR DE SEGUROS
Grandes riscos
O ano de 2023 foi marcado por uma crise nas operadoras de planos de saúde, cujos lucros afundaram após uma maior demanda por atendimentos médicos (no jargão, chama-se “alta da sinistralidade”, a porcentagem da receita que é gasta para pagar os procedimentos).
A turbulência, porém, está concentrada no setor de saúde e não se espalhou pelo ecossistema de seguros, que é mais resiliente. E é justamente outra ramificação que se destaca nas aberturas de vagas: a de seguradoras de grande risco, que, como o nome diz, são contratadas para cobrir de acidentes aéreos a tragédias ambientais.
“Nós estamos, infelizmente, observando muitos desastres naturais. Um exemplo recente é o ciclone no Sul, onde muitas seguradoras precisaram indenizar seus clientes. Então é uma área que tem tendência de aquecimento para o próximo ano”, comenta Sara.
Um terceiro tipo de contratante são as insurtechs, as startups que surgiram alguns anos atrás com o objetivo de tornar mais simples o setor de seguros, conhecido por ser conservador, sisudo e burocrático. Esse tipo de empresa atrai um profissional mais disposto a risco, e, portanto, uma minoria – a maior parte busca a segurança do setor tradicional, diz Ana Carla Guimarães, diretora da Robert Half.
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR DE ENGENHARIA
Supply chain
Um insight do ano passado se repete no guia deste ano: profissionais ligados à área de supply chain (cadeia de suprimentos) e logística estão altamente demandados. Ainda é um reflexo do combo pandemia, guerra na Ucrânia e dos sucessivos lockdowns chineses, que dificultou a compra de matérias-primas e interrompeu a produção em diversos países.
A tarefa é gigantesca: de um lado, eles precisam garantir insumos, antes da produção, e a entrega rápida do produto final, tudo pelo menor custo e, de preferência, reduzindo as emissões de CO2, para cumprir com objetivos ESG. Um quebra-cabeça que só um profissional especializado consegue resolver.
Gerenciar toda a cadeia de suprimentos de uma empresa requer uma variedade de habilidades, diga-se. Conhecimento de ferramentas de coleta e análise de dados é fundamental para entender e otimizar a produção, é claro. Também são imprescindíveis organização e flexibilidade. E é preciso furar a bolha. “Esse profissional é um pivô entre áreas de engenharia e comercial”, diz Carolina Cabral, da Robert Half. Por isso, acaba tendo um pezinho também em outros setores da empresa, como vendas.
Por falar em ESG, é aqui que o tema permanece com mais força, com foco justamente no “E”, já que transportar produtos de um lado para o outro ainda queima toneladas de petróleo em navios, aviões e caminhões. Por isso, o especialista na área é um dos perfis mais difíceis de encontrar no mercado, segundo o guia.
Jogo de cintura
Quando José Luiz Robaina prestou o processo de estágio em engenharia na Ocyan (ex-Odebrecht Óleo e Gás), há 16 anos, não pensava em ir para a área de supply chain. Mas acabou sendo alocado lá pela recrutadora. Hoje, o agora gerente executivo da empresa diz que essa foi a melhor decisão que alguém tomou por ele.
Robaina entende que o RH fez a escolha porque identificou nele duas características que podem ser uma vantagem para profissionais da área: ser extrovertido e gostar de se relacionar com pessoas. Pois é: nada do estereótipo do engenheiro introvertido e técnico. Quando se cuida de toda a cadeia de produção e suprimentos de uma empresa, é preciso estar em contato com gente o tempo todo – colegas da companhia, clientes, fornecedores…
José Luiz garante que o jogo de cintura é uma das habilidades mais valiosas. E que não há rotina de trabalho na área: cada dia é um desafio novo. “O tempo todo é preciso negociar. Para buscar um prazo melhor, uma condição mais satisfatória ou resolver algum problema. É preciso sempre buscar o cabo de guerra. Não pode arrebentar a corda, mas tem que esticar ao máximo”, conta.
PROFISSÕES EM ALTA NO SETOR DE MARKETING E VENDAS
Data-driven
Um tipo de profissional é o mais desejado do mercado de marketing há alguns anos, e deve seguir forte em 2024: os candidatos data-driven, ou seja, com habilidades de dados. Isso inclui não só conhecimento técnico sobre ferramentas e estratégias que coletam e organizam um grande volume de informações (sobre vendas, perfis de clientes, diferentes mercados…), mas, principalmente, saber como interpretar os números.
Justamente por isso, o cargo mais demandado por empresas na área atualmente é o especialista em Business Intelligence (Inteligência de Mercado ou Inteligência de Negócios), ou seja, aquele profissional que analisa os dados para identificar tendências e oportunidades de posicionamentos dos seus serviços e produtos.
“As empresas estão começando a tirar projetos da gaveta e vêm buscando esses profissionais justamente para desenvolver negócios e aumentar o seu portfólio em 2024”, diz Elisa Rodrigues, da Robert Half.
Outro destaque fica para o marketing digital, com as redes sociais se consolidando como um canal de vendas. Entre os profissionais mais difíceis de encontrar no mercado, segundo o guia, está o “Especialista em Transformação Digital” – profissional cuja função é justamente acompanhar essa transição frenética nas redes.
Agradecimentos: Marcela Esteves, Mariana Horno, Vanessa Aguiar, diretoras da Robert Half, e Amanda Adami, Alexandre Mendonça, Elisa Rodrigues, Cassio Andreoli, Thais Carrino, Vinicius Feitosa, Daniel Maciel, Thiago Pegaz e Vitor Silva, gerentes e especialistas da Robert Half.