Wall Street começa a reconsiderar seu otimismo com a economia – e derruba o Ibov junto
Receosos com o futuro, investidores americanos aguardam a temporada de balanços para saber que direção seguir. Por aqui, Magalu lidera altas após comprar KaBuM!
Wall Street parece estar num processo de auto-análise nesta semana. Os investidores americanos começam a questionar se não foram otimistas demais quando apostaram todas suas fichas numa recuperação foguete da economia do país – e quando NY fica com medo, o mundo entra em pânico.
Uma coisa é fato. A exuberância da bolsa americana nos últimos muitos meses tem, sim, um quê de irracional.
Vamos voltar para fevereiro de 2020, aquele último momento do pré-pandemia. O S&P 500, principal e maior índice do país, atingia sua máxima histórica até ali: 3.386 pontos.
Veio a pandemia em março, seguida de um mini-crash: queda para 2.400 pontos. E agora o S&P 500 já está de volta ao recorde antigo, certo? Erradíssimo. Os tais 3.386 pontos foram superados lá em 2020 mesmo, em agosto ainda.
O novo recorde histórico rolou nesta segunda feira agora: 4.384 pontos. Dá 30% a mais do que no pré-pandemia, quando a economia dos EUA ia de vento em popa, com o índice de desemprego em pífios 3,5%.
Agora o índice deles está em tropicais 11%. Não é exatamente um sinal de que a economia se recuperou. Tem chão ainda. Talvez o mercado tenha exagerado no otimismo, e começado a considerar se os preços das ações já não estariam um tanto fora da realidade.
A palavra chave é “talvez”, claro. É natural que um mercado entre em fase de correção depois de estabelecer o maior patamar de sua história.
Para saber mesmo se o patamar é exagerado ou não, o jeito é esperar para ver como vão vir os lucros das empresas na próxima temporada de balanços, que está para começar – são os lucros das empresas, afinal, que determinam o valor real das ações. Se eles vierem fabulosos, os tais 4.384 pontos da última segunda-feira vão parecer é pouco.
Enquanto os números do 2T21 não chegam, porém, o compasso é de espera, e de queda: – 0,33% para o S&P 500 hoje. Uma baixa que ajudou a deprimir o Ibov: -0,73% por aqui, quebrando uma sequência de três pregões no azul.
Enquanto isso, a inflação…
Outro ponto que ajuda a diminuir o otimismo por lá é a longa novela da inflação que paira sobre o país há meses. Hoje, o assunto voltou porque Jerome Powell, presidente do Fed, admitiu que a inflação está acima do limite confortável no país. Por muito tempo, Powell – e o BC americano como um todo – manteve o discurso de que o problema era passageiro e não tão grave assim, mas as coisas começaram a mudar, mesmo que aos poucos.
Em discurso no Senado americano hoje, Powell reiterou que a inflação deve ser passageira, mas subiu o tom quanto a sua gravidade: “nosso desafio é reagir à inflação mais alta do que esperávamos”, disse. Mesmo assim, ele jurou de pé junto (como sempre faz) que não deverá haver mudança na política do Banco Central por enquanto – ou seja, os juros baixíssimos devem continuar.
O mercado não sabe se acredita. Algumas lideranças regionais do Fed (o BC americano é formado por doze bancos espalhados pelo país) já chegaram a sugerir que a política de juros da instituição vai ter que mudar antes do previsto sim, senhor. A falta de direção única só aumenta a desorientação do investidor, que prefere não arriscar.
Petróleo
Por aqui, o dia foi negativo para a maior parte das 84 ações (de 81 empresas) que compõem o Ibovespa – só 15 fecharam no positivo. O resto foi puxado para baixo pelo mal-humor americano.
Outro fator que pressionou a bolsa para o vermelho nesta quinta-feira foi o preço do petróleo no mercado internacional. O tipo Brent, referência no mundo, fechou em queda de 1,73%, a US$ 73,47; já o tipo WTI, referência nos EUA, caiu -2,02%, a US$ 71,65.
Com isso, os preços das ações da Petrobras caíram junto: Petr3, -2,36% e Petr4 -2,13%. Como esses papéis correspondem a quase 10% da carteira do Ibovespa, o baque no índice é grande. Também ficou no vermelho nossa outra petroleira de capital aberto, a Petrorio: -2,07%.
Acontece que o mercado internacional da commodity passa por um momento crucial. A Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados) está bem próxima de chegar a um acordo para aumentar a oferta de óleo no mundo à medida que as economias começam a se recuperar e a demanda do combustível fóssil volta aos níveis pré-pandêmicos. Em relatório divulgado hoje, a organização anunciou que espera que isso aconteça já em 2022.
Quando a Covid-19 se tornou um problema global, a Opep+ concordou em diminuir a quantidade da commodity no mercado, o que levou os preços a subirem. Agora, com a volta do aumento da produção, os preços caem.
Esse movimento já era esperado pelo mercado; na verdade, o acordo só não saiu mais cedo neste mês porque os Emirados Árabes Unidos apresentaram discordância em reuniões com os outros países do grupo. Ontem, porém, a Reuters reportou que houve um consenso entre os membros e as negociações para um aumento na produção voltaram a caminhar – e aí os preços tombaram.
Ou seja: está aí um exemplo de que algo intrinsecamente bom para a economia (combustíveis mais baratos) pode ser ruim para o Ibovespa. Fazer o quê quando uma fatia enorme da sua bolsa corresponde a uma petroleira, né?
Magalu
Quem brilhou mesmo no fim das contas foi a Magazine Luiza. Os papéis Mglu3 lideraram as altas do dia (+3,45%), após divulgar ao mercado a compra de 100% do KaBuM!, um dos maiores e-commerces do mercado de games no Brasil. O negócio custará inicialmente R$ 1 bilhão, além da transferência de 75 milhões de ações da rede varejista.
Fundado em 2003, o KaBuM! é um grande comércio de itens voltados ao mundo gamer (PCs, teclados, headsets) e de esportes eletrônicos. Em 2020, impulsionadas pela pandemia, as vendas da marca mais que dobraram, crescendo 128% em relação a 2019. Apesar de ser a maior aquisição da história da varejista, ela não foi a primeira do tipo – a empresa de Luiza Trajano vem apostando no mercado de games e tecnologia já algum tempo, com a aquisição do Jovem Nerd e do CanalTech.
A Magalu também confirmou hoje algo já antecipado pelo mercado ontem: a empresa vai fazer uma oferta subsequente restrita de ações (follow on). Serão 150 milhões de novos papéis, o que deverá render mais de R$ 3 bilhões para a rede. A empresa revelou em comunicado que esses recursos irão para investimentos de longo prazo, como a expansão da rede de logística e a criação de novos centros de distribuição. O mercado parece ter gostado – uma boa amostra de que a nossa bolsa não é feita só de commodities, e não se resume a um mero espelho dos humores de NY.
Maiores altas
Magazine Luiza: +3,45%
CSN: +1,98%
Totvs: +1,58%
JHSF: +1,03%
Bradespar: +1,01%
Maiores quedas
CVC: -3,54%
Pão de Açúcar: -2,97%
SulAmérica: -2,63%
Lojas Americanas: -2,46%
Suzano: -2,45%
Ibovespa: queda de 0,73%, aos 127.467 pontos
Em Nova York
S&P: queda de 0,33%, aos 4.360 pontos
Nasdaq: queda de 0,70%, aos 14.543
Dow Jones: alta de 0,16%, aos 34.988 pontos
Dólar: alta 0,60%, a R$ 5,1147
Petróleo
Brent: queda de 1,73%, a US$ 73,47
WTI: queda de 2,02%, a US$ 71,65
Minério de ferro: alta de 1,57% a US$ 222,09 a tonelada no porto de Qingdao (China)