PMEs: a receita para os primeiros passos

Serviços que buscam facilitar a vida do pequeno empreendedor passaram por um boom de crescimento nos últimos anos. Conheça iniciativas no campo da contabilidade, finanças e do marketing digital.

Por Sofia Kercher | Design: Tamires Mazzo | Ilustração: Felipe del Rio | Edição: Alexandre Versignassi
Atualizado em 17 nov 2023, 15h09 - Publicado em 10 nov 2023, 06h00
 (Felipe Del Rio/VOCÊ S/A)
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Eis que você decide empreender. E não falta companhia nessa selva. A cada 12 minutos um brasileiro toma essa decisão, de acordo com a Serasa Experian. Foram mais de 2 milhões de empresas abertas só no primeiro semestre de 2023. Dessas, 77% eram Microempreendedores Individuais, os MEI.

Por menor que seja o negócio, abrir e manter uma empresa transforma a vida num mar de burocracia. Mas dá para descomplicar essa receita, a começar pela escolha dos serviços básicos de contabilidade.

Primeiro, uma breve introdução. E caso você tenha alergia a siglas de impostos, pule já para o primeiro intertítulo (vamos suavizar aqui, mas não dá para fazer milagre).

Para quem abre um CNPJ no país, são três regimes de tributação possíveis: Lucro Presumido, Lucro Real e Simples Nacional. Esta última foi criada justamente para facilitar a vida das PMEs.

Para quem é MEI — ou seja, tem um faturamento anual de até R$ 81 mil — o Simples Nacional unifica o pagamento dos tributos em uma só taxa mensal, a DAS-MEI (Documento de Arrecadação do Simples Nacional). Ela inclui três impostos (ISS, ICMS e INSS), e precisa ser emitida todo mês.

Além desses tributos, o microempreendedor precisa enviar a Declaração Anual do Simples Nacional (DASN-SIMEI), discriminando o faturamento total do ano anterior. Não há IRPJ, mas o faturamento e as despesas devem entrar no IRPF.

Para empresas com faturamento maior — Microempresas (ME), até R$ 360 mil, e Empresas de Pequeno Porte (EPP), até R$ 4,8 milhões — os tributos recolhidos são mais extensos (a depender da atividade que o empreendedor exerce): PIS, Cofins, CSLL, IRPJ, CPP…

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1 a cada 12 minutos – é a taxa de abertura de CNPJs no Brasil

Divino Contador

Não surpreende, então, que qualquer empreendedor não-MEI seja obrigado por lei a ter contador. Basicamente todo mundo precisa de assistência profissional para lidar com esse corredor polonês de impostos.

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A etapa de encontrar um bom escritório de contabilidade pode parecer apenas um incômodo a ser resolvido, mas é chave para que você consiga focar na administração do negócio. Há contadores que resolvem problemas, e há contadores que arrumam problemas (exagerando na burocracia). “Já que é um serviço obrigatório, é preciso pensar na qualidade do que está sendo ofertado”, resume Eliane Belchior, analista de negócios do Sebrae.

Os escritórios de contabilidade são, tradicionalmente, artesanais. Você tem “o seu contador”, da mesma forma que, no passado, as famílias tinham “o seu médico”. E tudo certo. Proximidade com quem presta serviços para você é algo que tende a ser positivo. Mas claro: não é fácil garimpar profissionais bons e baratos (ou seja, que não peçam coisa de R$ 1 mil por mês para fazer o básico).

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Nos últimos anos, porém, começaram a surgir empresas de contabilidade que usam a tecnologia para tornar o serviço mais simples, e amigável, a bolsos mais rasos.

Uma das mais conhecidas é a Contabilizei, voltada para empresas de pequeno porte. O diferencial da companhia é a gestão contábil e financeira 100% online: o cliente consegue emitir notas fiscais dentro do próprio site da empresa, e receber guias dos impostos que precisa pagar (com a possibilidade de colocá-los em débito automático).

A plataforma também oferece relatórios de movimentação de conta, importação e conciliação de extrato, remuneração dos sócios e folha de pagamento dos funcionários.

Vale dizer que, nas opções básicas, o atendimento é feito apenas por email e chat — não há atendimento por telefone, como você geralmente teria com um contador tradicional. Por outro lado, os preços são menores. Para empresas de serviço, os planos vão de R$ 179 a R$ 629 mensais. No caso das empresas de comércio, de R$ 224 a R$ 434 mensais.

A gratuidade de alguns serviços inclusos nos pacotes é limitada – a partir de um certo número, elas passam a ser cobradas à parte. Por exemplo: no plano mais completo de serviços, é possível emitir 70 NFs sem taxa; depois, cada uma custa R$ 8.

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No caso do MEI, como dissemos, não é obrigatório ter contador. De toda forma, os especialistas consultados pela VC S/A foram unânimes na recomendação do serviço. Primeiro porque ajuda a manter em dia os pagamentos de DAS e as declarações anuais (DASN-SIMEI e o IRPF). Segundo, porque um serviço de contabilidade pode ser uma mão na roda na hora de você fazer a transição do seu negócio, quando estiver perto de ultrapassar o limite de faturamento.

A Contabilizei não presta serviços para quem é MEI. Já o Qipu, aplicativo desenvolvido pelo Buscapé em parceria com o Sebrae, propõe um serviço de contabilidade pensado especificamente para o microempreendedor individual.

Pelas obrigações tributárias e financeiras mais simples, os preços para MEI variam R$ 5 a R$ 19,90 mensais. Com a contratação do serviço, você consegue suporte nas declarações anuais do MEI (tanto no Imposto de Renda quanto na DASN-SIMEI) e na emissão da Nota Fiscal Eletrônica mensal, as principais obrigações tributárias da modalidade.

Fintechs

Segundo a Pesquisa Hábitos de Uso de Produtos Financeiros, realizada pelo Sebrae no 1º semestre deste ano, quanto menor a empresa, maior a adesão aos bancos digitais. Entre as EPPs, ela é de 45%. Entre os MEIs, 60%.

É natural. Na Conta PJ do Banco do Brasil, por exemplo, cada TED custa R$ 23,90; no caso de transferências por Pix, até R$ 10 por transação. A taxa de inscrição na conta é de R$ 30,50, e a mensalidade, de R$ 62,50. No Itaú, a mensalidade começa em R$ 118.

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Já os 100% digitais oferecem taxas menores (ou inexistentes), e a abertura de conta tende a ser instantânea. Existem ainda as fintechs que nasceram exclusivamente para o atendimento de Pessoas Jurídicas, caso do banco Cora. A fintech oferece uma conta digital sem tarifas, e não cobra pela transferências (seja Pix,
seja TED).

Além disso, há funcionalidades bem específicas, como um serviço de cobrança de pagamentos feito pelo próprio banco. “O empreendedor ama vender e odeia cobrar”, diz Igor Senra, cofundador da Cora.

Também existe a possibilidade de criar diferentes perfis de acesso no app do banco. Tipo: seu contador pode ter uma senha que lhe dê acesso ao extrato, mas sem a possibilidade de fazer transferências.

60% é a adesão dos MEIs aos bancos digitais.

Bancos tradicionais

As facilidades dos bancos digitais, de qualquer forma, não são a panaceia. “Tudo depende do que o empreendedor deseja da sua relação com o banco”, ressalta Roberto Kanter, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Os bancos digitais não vão descontar cheque, não vão antecipar cartão de crédito, não vão trabalhar recebíveis. Eles não são para o empreendedor que está vendendo a janta para pagar o almoço.”

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Nesse sentido, apesar das taxas mais elevadas, uma maior burocracia de abertura de conta e a ocasional necessidade de ir a uma agência física, os bancos tradicionais oferecem soluções mais completas para a pessoa jurídica — especialmente para aqueles que estão começando o negócio com um fluxo de caixa que não é sempre positivo.

Por exemplo: caso o empreendedor esteja precisando de linhas de crédito, o Banco do Brasil oferece empréstimos com limites e taxas bastante competitivas, e negociáveis. A instituição tem soluções para capital de giro, financiamento de bens, crédito consignado e antecipação de vendas.

Caso esteja entre seus objetivos contar com um ponto físico, ter uma conta na Caixa Econômica Federal pode ser interessante, pelo acesso mais ágil a financiamento imobiliário para Pessoa Jurídica. O empreendedor consegue um financiamento de até 75% do valor de avaliação do imóvel, com prazo de até 15 anos para pagamento.

O banco ainda tem uma parceria com o Sebrae, por meio do Fundo de Aval para as Micro e Pequenas Empresas (FAMPE), que dá acesso a uma linha de capital de giro. O cliente fica dispensado da fase de análise pré-crédito, e consegue acesso a um pacote de benefícios com taxas mais baixas, prazo maior de carência e nenhuma necessidade real de garantias.

Se você busca uma integração maior da sua conta pessoa física à jurídica, o Santander e Bradesco oferecem para seus clientes a possibildade de ter o mesmo gerente de banco para ambas as contas. Isso pode aumentar seu poder de barganha na hora de obter linhas de crédito melhores, já que o banco consegue fazer um diagnóstico mais completo de seu patrimônio e finanças.

Para aqueles que estão no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, vale conferir a linha de produtos e serviços dos bancos regionais, como o Banco do Nordeste, Banco Amazônia (Baza) e Banco de Brasília (BRB). Essa segmentação também é válida para o setor de atuação da sua empresa. Instituições como o Sicoob e o Sicredi tendem a entender melhor as dores do empreendedor agro, fornecendo soluções mais personalizadas.

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Marketing digital

Tudo isso estabelecido, está na hora de pensar em vender. Dados da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) mostram que 97% dos brasileiros buscam informações na internet antes de comprar em lojas físicas. Nesse contexto, montar e manter uma presença online é etapa obrigatória para o empreendedor.

O bom desse tipo de marketing é que tudo pode ser milimetricamente mensurado. Pelo próprio Google, o empreendedor tem acesso a KPIs (Key Performance Indicators, ou indicadores-chave de desempenho) de seu site, como número de visitantes, links mais acessados, tempo médio de permanência do usuário na página. Pelas redes sociais, mesma coisa: engajamento dos seguidores, número de acessos, alcance da conta.

Isso, por si só, te dá apenas um diagnóstico. A partir dele, você pode adaptar seu orçamento e pensar na contratação de serviços. “O marketing digital é geralmente mais acessível em termos de custos em comparação com as estratégias de marketing tradicionais”, ressalta Eder Max, consultor de negócios do Sebrae.

Existem empresas que prestam serviços especializados de marketing digital para pequenas e médias empresas. A V4 Company, por exemplo, é uma agência pioneira em estratégias para PMEs. A empresa tem 220 unidades espalhadas pelo país.

Ela fornece métodos para alavancar a presença online do empreendedor, acompanhando tráfego, engajamento, conversão e retenção de clientes. Para isso, a empresa faz uso de duas métricas: o ROAS (retorno sobre investimento em publicidade) e o ROI (retorno sobre investimento). Em linhas gerais, enquanto o primeiro indica especificamente o sucesso e eficácia de campanhas pagas, o segundo calcula a contribuição que elas têm para a receita bruta total da empresa.

Um contrato da V4 geralmente varia entre R$ 4 mil e R$ 7 mil por mês, incluindo o valor dos anúncios online e impulsionamentos nas redes — mas não há um preço tabelado ou limite de contrato, então os valores podem ser maiores.

Mas existem alternativas mais baratas. Alguns cursos de graduação fazem parte do Movimento Empresa Júnior (MEJ), e possuem empresas voltadas para o aprendizado prático do aluno. Elas também prestam serviços ao mercado, por valores abaixo da média.

É o caso da ECA Júnior, administrada pelos alunos do curso de Publicidade da Universidade de São Paulo (USP). A empresa oferece serviços de identidade visual, design e desenvolvimento de campanhas publicitárias, além de serviços de fotografia e vídeo para divulgações, caso necessário. Os orçamentos são avaliados caso a caso, para caber no bolso do empreendedor (embora cobrem, as associações não têm fins lucrativos).

A Empresa Jr., dos alunos de Administração da Universidade Federal da Bahia (UFBA), presta serviços de marketing similares para PMEs. Aqui, a máxima da regionalização também se aplica: o ideal é procurar serviços das universidades do seu estado, que podem entender melhor suas necessidades.

Se o orçamento está apertado e você pretende seguir a mentalidade do it yourself, vale se aprimorar com o apoio do Sebrae. A organização oferece cursos de marketing digital – presenciais e online.

Para além do marketing, vale dar uma explorada no aplicativo e no site do Sebrae. Só de cursos online, são 320 opções gratuitas, com tempo de conclusão máximo variando de 2h a 180h. No presencial, existem opções gratuitas que vão do processamento caseiro de carnes de aves a maneiras de descobrir músicas em alta no TikTok. A associação libera certificados para todos os cursos.

Os pequenos negócios são responsáveis por 27% do PIB. Nos EUA, são 43%. Ou seja, ainda temos uma estrada longa para percorrer. O crescimento dos serviços voltados às PMEs ajuda a pavimentar esse caminho. O resto, não tem jeito: é com você. Então, mão na massa. E boa sorte 🙂

*ERRATA: Na edição impressa da revista, o dado de abertura do texto, referente a abertura de empresas no Brasil, foi atribuído ao Sebrae em vez da Serasa Experian.

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