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Liderança feminina: jornada tripla de Cristina Palmaka, presidente da SAP

Cristina Palmaka, presidente da SAP no Brasil, defende o equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional e a importância dos cuidados com a saúde mental.

Por Juliana Américo
Atualizado em 16 jul 2020, 06h00 - Publicado em 16 jul 2020, 06h00

Matéria originalmente publicada na Revista VOCÊ S/A, edição 264, em 07 de maio de 2020. 

Com um currículo recheado de grandes companhias de tecnologia, Cristina Palmaka, de 51 anos, está há seis ocupando o cargo de presidente no Brasil da empresa alemã de softwares corporativos SAP.

A executiva assumiu a liderança durante a transformação digital da multinacional, ajudou nas mudanças culturais da equipe e hoje gerencia cerca de 2.000 funcionários, que se dividem entre o escritório em São Paulo e o laboratório tecnológico na cidade de São Leopoldo (RS).

Além do trabalho na SAP, ela participa dos conselhos da Eurofarma e da Arcos Dourados — operadora das lanchonetes McDonald’s na América Latina — e é maratonista. Mas, para dar conta de tudo isso, Cristina defende o equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional e a importância dos cuidados com a saúde mental.

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A SAP vem mudando ao longo dos anos. Como está o modelo de negócios atualmente?

A SAP fez um movimento radical nos últimos dez anos de deixar de ser somente uma empresa de ERP [sistema de planejamento de recursos corporativos] para assumir uma governança para os clientes. Digitalizamos serviços, com informação em tempo real e armazenamento em nuvem. Além disso, fizemos aquisições para complementar portfólio, tanto que agora temos soluções para gestão de pessoas, e-commerce, marketplace, segurança de dados e também para a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Imagine: nós éramos uma empresa alemã de ERP, que é uma coisa mais burocrática e voltada para um papo de CFO, e agora falamos com gente de negócios. Isso foi uma mudança de portfólio, mas também uma grande mudança de cultura interna.

E como é liderar uma empresa alemã no Brasil?

[Risos] Na verdade, eu esqueço. Só lembro quando vêm alguns comunicados com partes em alemão. Mas temos características bem alemãs. Por exemplo, tratar tudo com muita seriedade. Há uma questão de que, quando alguém diz que vai fazer, então vai fazer; e, quando diz que não vai fazer, a coisa não é feita. Quando a gente se compromete, cumpre — independentemente do cenário ou de quem é o problema. Eu gosto porque não tem essa de “dar um jeitinho”. Apesar de ser global, a empresa respeita a cultura local e existe autonomia, flexibilidade e espaço para feedback e para mostrar as peculiaridades de nosso país. É o melhor dos dois lados: manter a atuação local, mas com a robustez global.

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Como a empresa está lidando com a crise do coronavírus?

É um baita aprendizado para todo mundo, é uma crise diferente das que estamos acostumados. Eu já tenho bastante tempo de estrada e passei por algumas crises econômicas, principalmente a da bolha da internet e a de 2008. Mas a atual, apesar de ter impacto econômico, envolve a coisa mais valiosa: a vida das pessoas. E, por sermos uma empresa global, seguimos a maior parte dos direcionamentos da matriz e compartilhamos boas práticas que vemos em outras unidades.

Como o Brasil está um pouco atrás dos outros países em relação ao avanço da doença, acho que conseguimos nos preparar melhor. A empresa costuma ser muito conservadora em questões que coloquem em risco o cliente ou os funcionários, por isso os empregados estão trabalhando remotamente. Os escritórios estão abertos para quem tiver alguma necessidade. Na primeira semana, havia pessoas recém-chegadas e fizemos uma logística para liberar o equipamento para elas. Mas é um grande aprendizado. A companhia não pode parar a infraestrutura, então estamos fazendo todo o trabalho de forma remota.

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O que está sendo feito para manter o engajamento das equipes em uma situação como esta?

Trabalhamos dois pilares. O primeiro é o de saúde mental. Existe um programa voltado para isso desde o ano passado e oferecemos terapia online. Fizemos ações falando sobre “o algoritmo da vida”, que usa a tecnologia para ajudar na prevenção de depressão e suicídio, e começamos a fazer rodas de conversa para criar um ambiente livre dos estigmas. As pessoas ainda têm muito bloqueio em falar que fazem terapia. E não há nada de errado, você está cuidando de si mesmo. O segundo pilar é tentar manter o máximo possível a governança e a rotina. Por exemplo, temos uma reunião trimestral de vendas que costuma reunir 300 pessoas — fizemos virtualmente. Foi mais curta, mas a mantivemos na agenda.

Como os funcionários receberam o programa de saúde mental?

Os primeiros encontros foram só para líderes, porque queríamos preparar a chefia antes de escalar o projeto. Depois, abrimos para todo mundo e logo em seguida já começamos a ouvir: “Não podemos marcar a reunião nesse horário porque tal pessoa tem terapia” — e falando isso de uma forma muito tranquila. Era o que estávamos buscando. Mas essas atitudes vêm com o exemplo. Não adianta mandar uma mensagem ou falar que está liberado, se no dia a dia não incorpora genuinamente uma postura de preocupação com a saúde mental.

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Você pratica corrida e participa de maratonas. Como o esporte ajuda no trabalho?

É a minha terapia. Sempre gostei de esportes e acho que eles têm coisas em comum com a parte corporativa. É necessário disciplina e preparação, por exemplo. E a corrida, apesar de ser uma atividade aparentemente individual, é coletiva. Você precisa de um treinador, saber seguir as orientações, ter apoio em casa para orquestrar a alimentação e os treinos. Sem falar na energia. Correr me dá uma oxigenada na cabeça para poder produzir melhor. Às vezes, eu estou enroscada em algum tema e na corrida parece que a coisa fica clara e consigo visualizar mais soluções.

Como equilibra a vida pessoal e a profissional?

As palavras-chave são organização e, depois, disciplina. Eu monto minha agenda semanal colocando as coisas que são fundamentais para mim, aquelas que são inegociáveis tanto no trabalho quanto na vida pes­soal. Vou colocando os bloquinhos de coisas que vou fazer, depois vou encaixando o que aparece durante a semana, e algumas ficam pelo meio do caminho. E essa é uma das coisas que aprendi quando comecei a assumir cargos de diretoria: saber falar não. Não dá para fazer tudo e não podemos sentir culpa por isso. Temos de priorizar. Você precisa saber o que realmente é importante para você e para quem está do seu lado. Além disso, eu gosto de trabalhar com pessoas que estejam bem, então preciso fazer as coisas bem também. O pessoal brinca que eu cobro várias coisas, inclusive o que eles estão fazendo para cuidar da saúde mental.

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Qual foi o maior desafio de sua carreira?

O período pelo qual estamos passando é o maior, porque não é só econômico, é um desafio do inimaginável — quando você olha as ruas vazias, tudo deserto. Este, com certeza, é um dos maiores desafios que nossa geração já enfrentou. Eu já passei por várias crises, mas esta é mais desafiadora: mesmo com todo esse desconhecido, temos de trazer tranquilidade e segurança para o time e os clientes. Precisamos manter a calma para sair mais fortalecidos e aprender com tudo isso.

Que conselho você daria para quem está começando a carreira agora?

Existe uma frase, em inglês, que eu gosto de falar: “Enjoy the ride” — que significa “aproveite a jornada”. Às vezes, parece que estamos no meio de um turbilhão, mas, quando olharmos retrospectivamente, teremos de ter aproveitado o caminho. Cada momento, mesmo os difíceis, estão ali para alguma missão.


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