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Três frentes frias atingem o mercado ao mesmo tempo, e causam geada na bolsa

A primeira onda glacial veio dos EUA, com a queda brusca da Amazon; a segunda, da China; a terceira, de Brasília.  

Por Alexandre Versignassi
30 jul 2021, 18h03

Eita. 81 das 84 ações do Ibovespa fecharam no negativo. Sabe quando já está frio pra caramba e a Anne Lottermann avisa que vai chegar outra frente fria em cima? Foi basicamente o que aconteceu com o mercado hoje. Com uma diferença: três frentes frias sobrepuseram-se hoje, e o Ibov fechou em gélidos – 3,08%.

Frente fria oriunda dos EUA

A primeira onda gelada veio de Seattle, onde fica a sede a Amazon. A galáctica companhia apresentou seu balanço para o segundo trimestre na quinta à noite, e os resultados vieram abaixo do esperado. 

O irônico é que esse “abaixo do esperado” foi um aumento de 48% nos lucros na comparação entre o 2T21 e o 2T20. Eles passaram de US$ 5,2 bilhões para US$ 7,8 bilhões. 

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Mesmo assim, as ações da empresa desabaram.  É que, quando se trata da Amazon, o mercado olha mais o faturamento bruto do que o lucro. A margem da Amazon é relativamente baixa, 6%, contra 40% da Apple. Então se a empresa faturar bem o mercado já curte, mesmo que os lucros não sejam grande coisa – a ideia é que, com faturamento lá em cima, bastará à Amazon fazer alguns ajustes para buscar uma margem mais sólida.

Bom, o problema é que a receita veio menor do que a expectativa. Havia um consenso no mercado de que a Amazon faturaria US$ 115 bilhões. Fecharam em US$ 113 bilhões. E anunciaram que no terceiro trimestre esse número não passará de US$ 112 bilhões – contra US$ 118 bilhões esperados pelos videntes de Wall Street.    

Sim, não é nada que obrigue Jeff Bezos a vender seus foguetes para o ferro velho para pagar a conta de luz. Sem falar que tratam-se de aumentos substancial sobre os faturamentos do 2T20 (US$ 88 bi) e do 3T20 (US$ 96) – lembrando que a Amazon não perdeu com a pandemia, só ganhou (o isolamento lá atrás bombou sua base de clientes). Mesmo assim, isso bastou para as ações da companhia caírem 7,56%

O tombo puxou o Índice Nasdaq para o negativo (-0,71%), o que mandou ventos frios para todas as outras bolsas do mundo. O medo é: se nem a Amazon consegue um faturamento em linha com o que o mercado espera, imagina o resto. 

A tal expectativa do mercado está um tanto exagerada? A história da economia moderna indica que sim – mercados em níveis recorde, como o dos EUA hoje, costumam sempre abrigar expectativas desvairadas. Uma hora, porém, o pessoal cai do cavalo. É precisamente o que aconteceu hoje. O mercado queria um valor irreal, esse valor não veio, e aí o próprio mercado corrigiu sua expectativa – vendendo ações da Amazon em peso e criando uma baixa histórica, com consequências glaciais não só para as bolsas americanas, mas para as do resto do mundo também.

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Se fosse só isso, na verdade, até que o Ibovespa não fecharia tão mal. O problema, como dissemos antes, é que vieram outras duas frentes frias. A mais forte delas, lá do sudeste asiático.

Onda gelada vinda da China

O minério de ferro caiu que nem as ações da Amazon: 7,39%, fazendo o preço do minério de ferro voltar dois meses no tempo, para a casa dos US$ 180 a tonelada.

Se você precisa de um culpado, ei-lo: o governo chinês. Pequim está agindo com firmeza para reduzir a produção de aço (material cuja matéria prima mais importantes é, claro, o minério de ferro). Impuseram tarifas de exportação de até 40% para as siderúrgicas do país. 

O governo quer reduzir a produção por três motivos: evitar uma bolha (que poderia causar uma quebradeira econômica caso estourasse de maneira repentina), evitar que falte aço dentro da China por excesso de exportação e baixar as emissões de CO2 do país.

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Para o Partido Comunista, pelo jeito, missão dada é missão cumprida. E tudo indica que vão continuar intervindo no mercado enquanto não chegarem aos seus objetivos. 

Como esses objetivos vão contra os interesses dos grandes produtores globais de minério de ferro (tipo a gente), tivemos a grande frente fria desta sexta feira: a Vale, maior companhia da bolsa, tombou 5,89%

E a massa de ar glacial que chegou de Brasília

Se a essa altura o dia mal tinha começado e a sensação térmica do mercado era de 2 graus Celsius, tudo gelou de vez depois de uma declaração de Bolsonaro.

Primeiro, teve a infame live presidencial de ontem, cheia de argumentos espúrios para defender sua teoria do momento, a de que as eleições brasileiras são uma grande farsa, fruto da manipulação das urnas eletrônicas (a que ele ganhou, pelo jeito, seria só “meia farsa”, certo?).   

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Aberração à parte, o que parece ter pegado mais forte para o mercado foi outra declaração, dada hoje pela manhã: a de que ele pretende aumentar o bolsa família em pelo menos 50%, e dar um jeito de furar o teto de gastos. O teto é a âncora mais fundamental para a estabilidade das contas públicas, e da própria economia do país. 

Furar o teto significa, em última instância, imprimir dinheiro além da conta. Isso causa mais inflação. Para combater a inflação, aumenta-se os juros. Juros altos = consumo baixo. Consumo baixo = menos PIB, menos emprego, mais pobreza. E mais gente precisando de Bolsa Família, num ciclo vicioso cujo final é apocalíptico.

E agora tudo indica que Bolsonaro não vai medir esforços para começar uma gastança populista, a fim de amealhar mais votos em 2022. E, se não amealhar, o roteiro já está pronto: ele dirá que a eleição foi roubada, com consequências imprevisíveis para o futuro da democracia. 

Diante de tudo isso, fica só um comentário: o Ibovespa caiu foi pouco. Até segunda.    

 

Maiores altas (e menores baixas)

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Vivo: 0,39%

JBS: 0,34%

Cielo: 0,30%

Totvs: – 0,37%

Assaí: -0.60%

Maiores baixas

Localiza: -7,36%

Inter: -5,99%

Vale: -5,89%

Locamérica: -5,85%%

Bradespar: -5,66%

Ibovespa:  -3,08%, a 121.800 pontos

Em NY:

S&P 500: – 0,54%, aos 4.395 pontos

Nasdaq: – 0,71%, aos 14.672 pontos

Dow Jones: – 0,42%, aos 34.936 pontos

Dólar: 2,57%, a R$ 5,20

Petróleo

Brent: 0,41%, a US$ 75,41

WTI: 0,45%, a US$ 73,95

Minério de ferro: -7,39%, a US$ 181,57 a tonelada no porto de Qingdao (China)

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