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Petrobras sobe quase 10% – e nem isso salva o Ibovespa da queda

Estatal fez a festa do investidor com antecipação de dividendos. Mas juros em alta acelerada e crise em Brasília estragaram a alegria do mercado mesmo com recorde em NY.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 5 ago 2021, 18h31 - Publicado em 5 ago 2021, 18h22

Com um lucro surpreendente e um pagamento de dividendos bilionários, todo mundo esperava que a Petrobras fosse garantir o dia na bolsa. Olha, a petroleira tentou. A ações da Petro dispararam e fecharam em alta de impressionantes 9,63% e 7,88% (PETR3 e PETR4, respectivamente). E nem isso salvou o Ibovespa do vermelho, tal a bagunça econômica e política que o Brasil está metido. O dólar voltou a subir, e olha que ele tinha tudo para cair após o aumento da Selic ontem para 5,25%.

Primeiro vamos à Petro. A empresa registrou lucro líquido de R$ 42,85 bilhões no segundo trimestre – revertendo o prejuízo reportado no mesmo período de 2020, quando boa parte do mundo estava em quarentena e a demanda de petróleo despencou. Mais: o resultado veio 68,85% acima das estimativas do Broadcast. 

O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação e que mede o resultado operacional da companhia) também surpreendeu: foi de R$ 61,9 bilhões, 147,9% superior ao 2T20 e 26,5% maior em relação ao trimestre passado. As previsões falavam em R$ 53,1 bilhões. Já a receita da empresa subiu 117,5% do ano passado para cá.

Só isso já seria um bom motivo para uma disparada nas ações. Mas a Petro deu mais um empurrãozinho. A companhia anunciou duas antecipações de distribuição de dividendos aos acionistas que, juntas, totalizam R$ 31,6 bilhões. Era algo totalmente fora do radar do mercado, e foi a grande surpresa positiva do dia. O primeiro pagamento, de R$ 21 bilhões, será feito em 25 de agosto para quem tiver ações da petroleira em 16 de agosto. O segundo, de R$ 10,6 bilhões, virá no dia 15 de dezembro (para quem for acionista no dia 1º daquele mês). Desse total, R$ 11,6 bi vão para o governo federal, controlador da empresa.

O crescimento nos lucros tem uma explicação, é claro. A mais importante delas é o aumento do preço do petróleo no mercado internacional. A commodity se recupera do tombo que levou com a pandemia à medida que mais e mais países afrouxam suas restrições de movimento devido ao avanço da vacinação e queda dos casos de Covid-19, especialmente em nações desenvolvidas. Hoje mesmo o petróleo tipo Brent, referência no mercado internacional, fechou acima de US$ 71.

E com tanto lucro, fica mais fácil pagar dividendos polpudos. Ou seja: todos correram para comprar as ações da gigante e garantir uns respingos do lucro dela na conta. 

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Porém

Um dos motivos para o abismo entre as expectativas do mercado e os resultados é política. Esse foi o primeiro balanço sob a nova gestão da petroleira, agora sob o comando do General Joaquim Silva e Luna. O militar foi indicado por Bolsonaro ainda em fevereiro deste ano, em um processo nada livre de polêmicas. O presidente vinha criticando a empresa (e a gestão do antecessor Roberto Castello Branco) pelos sucessivos aumentos no preço dos combustíveis. Claro: a popularidade do político só tem a cair quando você vai abastecer o carro ou comprar um botijão de gás e termina se sentindo mais pobre.

E aí veio o anúncio da troca de comando que paralisou o mercado. Apesar de Bolsonaro jurar de pé junto que não iria interferir na política de preços da companhia, algumas declarações dúbias botavam em xeque essa afirmação (coisas do tipo “o povo não pode ser surpreendido com certos reajustes”). E mais: se não vai ter mudança na política, pra que trocar o gestor? O medo da interferência política em uma empresa com ações na bolsa sempre deixam os investidores com pé atrás.

Silva e Luna até assumiu fazendo afagos nos investidores e prometendo uma gestão sem interferências, o que apaziguou o mercado por um tempo. Mas faltava um balanço sólido para que a Faria Lima aprovasse de vez o nome – e ele veio.

Não é como se o risco político da Petrobras desaparecesse do dia para a noite, é claro. Muito pelo contrário. Além de nunca ter recuado nas críticas à política de preços, Bolsonaro agora engatou uma nova ideia: usar recursos da companhia para subsidiar a compra e distribuição de botijões de gás para famílias inscritas no Bolsa Família. O governo diz estar negociando a ideia com a estatal; a Petrobras inicialmente negou, só que hoje o general admitiu que estuda a proposta.

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Só que o mercado ignorou, ao menos por hoje, porque os lucros e dividendos foram tão astronômicos que o risco político, por ora, continua valendo a pena. O Itaú, por exemplo, diz que as ações têm potencial de subirem a R$ 38 e recomenda a compra dos papéis mesmo quando simula cenários de estresse. No documento, o banco não cita riscos políticos.

A tragédia ao lado

Se tivéssemos que imaginar como foi o dia só olhando para a Petrobras, daria para chutar tranquilamente que o Ibovespa fechou no positivo. É que os papéis da empresa, juntos, somam quase 10% de todo o índice, só atrás da Vale. Só que não tem milagre: a estatal até segurou o índice por um tempo, mas a queda veio de tarde. No fechamento, -0,14%, a 121.632 pontos. Das 84 ações do índice, 67 caíram. Sem a Petro, o tombo seria ainda maior.

Uma das pressões para baixo foi a decisão do Copom, que saiu ontem após o fechamento. Como já se esperava, o Banco Central elevou a Selic para 5,25%. Mais importante: adiantou que vem mais um ajuste por aí de 1 ponto percentual na próxima reunião, para 6,25%. E o BC disse ainda que vai levar o juro para acima do patamar neutro, aquele que nem estimula e nem contrai a economia. Mesmo com as altas recentes, estamos com juros que estimulam a atividade.

Tem um problema: juro baixo não combina com inflação alta. O Copom reconheceu que a bichinha é tipo a dona aranha, teimosa e persistente. E com a crise hídrica que vai encarecer a conta de luz de todo mundo e, mais ainda, os preços dos alimentos no supermercado, fica difícil ver a inflação baixar sem juros.

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Beleza. Só que isso muda toda a dinâmica do mercado financeiro. Investimentos em renda fixa ficam mais atrativos e o pessoal começa a tirar dinheiro da bolsa, mais arriscada, e coloca em outras coisas, como títulos públicos. E as empresas precisam rebolar para convencer que vale a pena investir nelas e que elas vão render mais que a Selic, sim senhor. Hoje, não conseguiram.

Não só isso. O juro alto com o desemprego elevado é um péssimo sinal sobre o estado da economia brasileira. Isso enquanto o governo fala em dar uma pedalada em precatórios, turbinar Bolsa Família e ainda ameaça as eleições. Hoje entrou mais uma coisa para o combo: a possibilidade de mais um programa de Refis às empresas. Agora pense como um gringo e se pergunte exatamente a que preço você estaria disposto a trazer seus dólares para o Brasil. Pois é.

Não à toa, mesmo com a alta dos juros, que deveria deixar o Brasil ainda mais atrativo para estrangeiros, o dólar subiu. Fechou a R$ 5,2156. 

Minério

Tá bem, dá para fazer uma concessão ao cenário político. É que o minério de ferro tombou mais de 6% lá na China e arrastou junto a Vale (-3,06%), líder do Ibovespa, e as demais siderúrgicas do país. Tanto que a maior queda do dia foi da Bradespar, uma holding que investe exclusivamente na Vale.

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Sem desculpas

Não é como se o Brasil fosse o único afetado pelo tombo do minério, né? Mas fato que a bolsa brasileira é mais dependente de commodities que as americanas. Lá, quem manda é a tecnologia.

E hoje o dia foi de pura alegria. Em Nova York, as ações fecharam nas máximas históricas. Sim, de novo. Pois é, não anda fácil ser brasileiro. Até amanhã 🙂

Maiores altas

Petrobras ON: +9,63%

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Petrobras PN: +7,88%

Magazine Luiza: +2,51%

Totvs: +1,81%

Droga Raia: +1,77%

Maiores baixas

Bradespar: -5,11%

Braskem: -4,17%

CSN: -3,96%

EcoRodovias: -3,41%

Gerdau: -3,07%

Vale: -3,06%

Ibovespa: -0,14%, aos 121.632 pontos

Em Nova York

S&P 500: +0,60%, aos 4.429 pontos

Nasdaq: +0,78%, aos 14.895 pontos

Dow Jones: +0,78%, aos 35.063 pontos

Dólar: +0,57%, a R$ 5,2156

Petróleo

Brent: +1,29%, a US$ 71,29

WTI: +1,38%, a US$ 69,09

Minério de Ferro: queda de 6,61%, cotado a US$ 171,55 a tonelada no porto de Qingdao (China).

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