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Caso SVB: maior falência bancária desde 2008 coloca água no chope do mercado

As bolsas até ensaiaram uma alta após o Payroll, mas tombaram com a liquidação do SVB, 16º maior banco dos EUA. Por aqui, festa dos dois dígitos: CVCB3 cai 17,7% e HAPV3 sobe 27,3%

Por Alexandre Versignassi
Atualizado em 10 mar 2023, 19h35 - Publicado em 10 mar 2023, 19h15

A falácia de que “o mercado financeiro gosta de juros altos” mostra-se ainda mais débil diante do que rolou nesta sexta. O 16º maior banco dos EUA (uma posição razoável para um país com 4,7 mil instituições do tipo) faliu nesta sexta – em grande parte por conta das altas nos juros por lá. 

Trata-se do Silicon Valley Bank (SVB), uma instituição voltada ao financiamento de startups de tecnologia. 

Esse setor sofre mais do que a média com juros altos. Investidores começam a rarear, pois passam a preferir o rendimento mais alto dos títulos públicos do que arriscar o capital e aventuras. Esse cenário deixou os clientes típicos do SVB, as startups, com menos fundos. E o banco, com menos dinheiro. 

Aí piora. Bancos fazem sua poupança na forma de títulos públicos. Quando as taxas dos títulos sobem, o preço deles cai. Exemplo: entre fevereiro de 2021 e fevereiro de 2023, quando os juros dos EUA subiram de 0,25% para 4,75%, o preço médio dos títulos de médio prazo (7 a 10 anos) caiu 16%. Os de longo prazo (20 anos ou mais), 28%.

Clientes em dificuldades correm para sacar dinheiro. Para honrar os saques, o banco precisa vender seus títulos. Na realidade de hoje, com o preço deles caindo, o banco faz isso com prejuízo. Aí a conta pode não fechar. 

Não fechou para o SVB. A instituição foi liquidada hoje pelas autoridades americanas. E o FGC gringo (chamado FDIC) já avisou que vai começar a pagar todos os depósitos até US$ 250 mil (o limite do fundo garantidor de crédito deles – o do nosso é de R$ 250 mil por instituição, ou seja, cinco vezes menor). O seguro, segundo o FDIC, cobre 87% dos clientes do banco. 

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All in all, foi a maior falência bancária nos EUA desde a crise de 2008. E a primeira desde 2020.

A notícia, obviamente, foi dura de digerir para as bolsas – nada acende mais a sirene do mercado financeiro do que a ameaça de uma sequência de falências bancárias (fala, 1929! tudo certo por aí, 2008?). Logo, o S&P 500 tombou 1,44%. E o Ibovespa foi no embalo: 1,38%, pressionado também pelo IPCA de fevereiro. 

IPCA

A inflação acelerou: 0,84% em fevereiro, contra 0,53% em janeiro. Nos últimos 12 meses o IPCA acumula 5,60%. Trata-se de uma redução ante a taxa anualizada de janeiro (5,77%). 

Mas isso não quer dizer grande coisa. O fato é que inflação já dá um sinal de ter tomado fermento, antes mesmo da reoneração dos combustíveis, que passou a valer a partir de março. 

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Isso elevou toda a curva temporal dos juros futuros. E fez subir as taxas dos títulos de inflação. O IPCA+2035, que tinha fechado ontem a 6,33%, chegou a ser negociado a 6,48% (ou seja, um preço notoriamente mais baixo, só para fazer uma ponte com o caso SVB). Mais tarde, porém, o mercado de juros sossegou um pouco o facho, e o IPCA+2035 fechou em 6,38%. Vamos que vamos. 

E ainda teve o Payroll. 

“But we’re still on the payroll…”

Com esta breve introdução de Thom Yorke no intertítulo para uma pausa, vamos a ele – o sempre bittersweet relatório mensal de emprego dos EUA, que acaba determinando os rumos da economia global. 

Bittersweet porque ele tem trazido um lado doce e outro amargo. A parte doce é a criação de novas vagas de trabalho por lá. Nos últimos 10 meses, ela veio acima das expectativas do mercado. E agora emenda-se um 11o mês.  

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O mercado criou 311 mil vagas em fevereiro, versus uma expectativa de 225 mil. E a taxa de desemprego permaneceu num patamar baixíssimo, de 3,6% – o menor desde 1969. 

Biden solta fogos – e, como todo político faz, diz que o mérito é dele. Já o mercado vê esses dados de outra forma. O Fed tem como prioridade zero baixar a inflação até a meta deles, de 2%. Uma estratégia que visa a estabilidade da economia americana no longo prazo. E uma economia aquecida, com criação de empregos em alta, gera pressão inflacionária. Logo, isso faz com que o banco central dos EUA siga firme nas alta dos juros, para conter tal pressão. A expectativa é para uma alta de 0,50 pp na próxima reunião do Fomc (o Copom deles), com os juros indo a 5,25%, o que seria a maior taxa em 17 anos. 

Juros em alta = bolsa em baixa. Esse é o lado amargo. Para o mercado americano e para o do resto do mundo. Com juros lá em cima nos EUA fica muito mais difícil cortar em qualquer país.  

Pequeno plot twist: mesmo a parte amarga teve seu lado de copo meio cheio. A alta na média salarial dos americanos desacelerou novamente. Ruim para quem recebe salário, bom para tirar pressão da inflação (com salários subindo menos, os preços sobem menos). Aí melhora a chance de o Fed frear as altas na Selic deles. 

Essa expectativa fez com que a bolsa americana começasse o dia em alta. Mas a falência do SVB, anunciada no início da tarde, colocou água no chope. 

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A gangorra da Hapvida…

Agora quem faz a introdução é Paul McCartney, com Helter Skelter

“When I get to the bottom

I go back to the top of the slide

Where I stop and I turn and I go for a ride

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‘Til I get to the bottom and I see you again

Yeah, yeah, yeah”

A letra fala sobre ascensões e quedas – usando um tipo de escorregador de parquinho (o Helter Skelter) como metáfora. Se tivesse escrito essa música de 1968 hoje, Paul poderia usar as ações da Hapvida. 

Depois de cair 33,56% ontem, elas subiram 27,31% hoje. Ontem, o tombo rolou porque a companhia disse que pode emitir novas ações para sair de sua crise. Hoje, não faltou quem achasse a queda da quinta um exagero e foi às compras.

Mas o fato é que, no cômputo geral, os holders de HAPV3 seguem com o saldo lá no chão. Desde o anúncio do balanço do 4T22, em 1 de março, as ações da empresa amargam uma queda de 45%, mesmo com a alta de hoje.

…e a gangorra da CVC

As ações da operadora de turismo tinham subido 49% entre segunda e quinta, com os rumores de que iria renegociar parte de sua dívida em debêntures, que soma R$ 900 milhões. R$ 665 milhões iriam vencer neste semestre.

A renegociação foi anunciada hoje. A CVC ganhou mais três anos e meio de prazo, pedalando a dívida prestes a vencer para novembro de 2026, em troca de um aumento na taxa de juros (de CDI+5,5% para CDI+7%). 

A empresa também comprometeu-se a pagar ao menos R$ 125 milhões até novembro deste ano. O dinheiro viria de uma nova emissão de ações – o que diluiria a participação dos acionistas atuais. Caso os acionistas não aprovem, R$ 200 milhões da dívida serão pagos na forma de ações da empresa, o que também diluiria a participação dos acionistas atuais. 

Em suma, uma notícia sweet, por envolver uma bem vinda renegociação, e bitter, por conter no pacote a diluição iminente. Hoje, venceu o lado amargo: queda de 17,74%. Num panorama menos estreito, porém, a figura é outra: alta de 22,50% desde a última sexta, mesmo com a queda de hoje. Ou seja: uma semana doce para a CVC.    

E bom fim de semana para você! 

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Maiores altas

Hapvida (HAPV3): 27,31%

Embraer (EMBR3): 5,67%

MRV (MRVE3): 1,41%

Locaweb (LWSA3): 1,04%

Cemig (CMIG4): 0,38% 

 

Maiores baixas

CVCB (CVCB3): -17,74%

Arezzo (ARZZ3): -11,58%

Azul (AZUL4): -11,29%

3R (RRRP3): -7,72%

Gol (GOLL4): -7,11%

Ibovespa: -1,38%, a 103.618 pontos; na semana, -0,24% 

Em NY:

S&P 500: -1,44%, a 3.861 pontos 

Nasdaq: -1,76%, a 11.138 pontos

Dow Jones: -1,07% , a 31.909 pontos

Dólar: 1,30%, a R$ 5,20; na semana, 0,15

Petróleo

Brent: 1,46%, a US$ 82,78 por barril; na semana, -3,55%

WTI: 1,27%, a US$ 76,68; na semana, -3,77%

Minério de ferro: 0,11%, a US$ 130,75 a tonelada na bolsa de Dalian

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