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Lula flerta com responsabilidade fiscal – e VALE3 sobe com resgate do mercado imobiliário chinês

Ibovespa cresce com pressão de Ciro Nogueira para autorizar gastos com Bolsa Família acima do teto por apenas um ano, entre outras pistas de ortodoxia fiscal.

Por Bruno Vaiano
14 nov 2022, 18h28

Foi um pregão sem rumo certo, pendurado entre domingo e o feriado de amanhã. A PEC da transição permanece nos holofotes da Faria Lima – e com a versão final do texto agendada para quarta-feira, as reações do mercado ficaram por conta do noticiário. 

O noticiário em questão indica que a equipe de Lula está disposta a adotar um comportamento um pouco mais ortodoxo. E a esperança de um orçamento menos inchado fez o Ibovespa fechar em alta de 0,81%.

Alívio 1: Ciro Nogueira, bastião do Centrão e ministro-chefe da Casa Civil, deixou claro que sua turma com cadeira cativa no Congresso não vai apoiar uma licença de quatro anos (ou seja, todo o mandato) para Lula manter os gastos com Bolsa Família furando o teto. A exceção valeria apenas para o orçamento de 2023, e o orçamento de 2024, bom: a gente vê ano que vem. 

Alívio 2: a Bloomberg deu uma dose de esperança extra ao mercado com a notícia de que a equipe de transição de Lula avalia reduzir o furo previsto pela PEC para 2023 de R$ 175 bilhões para R$ 130 bilhões – outra sinalização de política econômica que fez o dólar cair um pouco em relação ao real: baixa de 0,64%, a R$ 5,29. 

Alivio 3: a proposta do Tesouro Nacional para a flexibilização do teto. Eles sugerem uma regra elástica: a correção dos gastos pela inflação permanece garantida, mas haveria um bônus (algo entre 0,5% e 2% de crescimento real, além da inflação) quando o governo fosse bem sucedido em reduzir a dívida pública. Essa norma entraria em vigor a partir de 2024. 

No campo dos balanços, o resultados do terceiro trimestre da Embraer veio caidão (prejuízo de R$ 219 milhões). E EMBR3 fechou em -5,74%. 

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Já para o minério de ferro, o dia não foi nada mal – de novo. Um oferecimento da China:

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Biscoito da sorte 

Os últimos dias têm sido auspiciosos por lá. A primeira notícia boa você já sabe: na sexta, eles afrouxaram a política covid-zero em algumas regiões do país. É claro que “afrouxar” é relativo. As normas ainda são impensavelmente mais rígidas do que eram as normas brasileiras no auge da pandemia, dois anos atrás. Mas trata-se de um avanço.

Por exemplo: antes, pessoas que haviam tido contato com um infectado precisavam passar sete dias de quarentena em uma instalação do governo. Agora, são cinco dias no cercadinho de Xi Jinping e três em casa. Lembra o lema de um outro figurão autoritário – o Geisel: “abertura lenta, gradual e segura”. Leia mais aqui

Os lockdowns orwellianos não eram a única coisa empacando o desempenho econômico chinês. Nos últimos meses, o mercado imobiliário do país – que corresponde a 25% do PIB, uma participação única no mundo – se revelou um esquema de pirâmide maciço, ainda que involuntário.

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Resumindo uma história longa: nas últimas décadas, o mercado imobiliário chinês foi abastecido pela maior população da Terra em um processo massivo de êxodo rural. O IDH dos chineses pobres subiu de carona no PIB estratosférico do país – e um bilhão de pessoas com crédito para realizar o sonho da casa própria são um fenômeno econômico sem precedentes na história do planeta. 

A prosperidade foi contagiosa: o crescimento do Brasil na era Lula, por exemplo, se alicerçou parcialmente nas exportações massivas de minério de ferro (matéria-prima do aço usado nas construções) e soja. Muitos brasileiros passaram a ter teto e comida fornecendo teto e comida aos chineses. 

O problema é que as incorporadoras de lá, viciadas na demanda constante por moradia, começaram a andar numa corda bamba contábil. Vendiam apartamentos na planta e, com o dinheiro dos novos compradores, pagavam a construção dos prédios que já haviam vendido meses atrás. Empréstimos vultuosos do governo davam uma mãozinha, mas esse esquema só funciona, é claro, se sempre houver MUITA gente nova atrás de um imóvel. 

Uma hora, a torneira fechou. Chegou a covid e a atividade econômica chinesa desacelerou de maneira que não se via desde os anos 1990. Xi Jinping farejou a bolha e cortou os empréstimos. Além disso, o crescimento populacional estagnou: foi o resultado pretendido de décadas da política do filho único, bem como uma etapa natural do processo de transição demográfica: populações que enriquecem têm menos filhos, e seus idosos vivem mais, o que sobrecarrega a previdência. 

Essas e outras tendências – que não têm data para reversão – quebraram as pernas das construtoras, que se viram numa crise de liquidez (os preços passaram a cair porque não havia mais tantos compradores) e num boicote (os clientes que já haviam comprado imóveis pararam de pagar as parcelas em protesto quando perceberam que seus imóveis não seriam entregues). Isso já seria motivo de pânico em qualquer país, mas quando 25% do seu PIB são imóveis, a ameaça fica estratosférica.

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Hora de intervenção estatal. Hoje, a Bloomberg revelou que Beijng tem planos de salvar o setor com um pacote de medidas de incentivo (leia-se: injeção de dinheiro na veia) em vez de deixá-lo afundar – ciente de que seu colapso, em um país já fragilizado pela guerra à covid, seria suicídio econômico. Xi Jinping acaba de começar seu terceiro mandato, e entende como ninguém que manter o padrão de vida da população é um pré-requisito essencial para segurar a popularidade do regime autoritário. 

Resultado: a cotação do minério de ferro subiu 1,9% na bolsa de Dalian e 2,97% no porto de Qingdao, e a Vale se animou com a notícia, ganhando 1,23%, a R$ 83,31 no pregão. A commodity já subiu quase 20% em novembro, recuperando algumas das perdas acumuladas ao longo do ano. Com isso, os papéis da grande mineradora brasileira, que andavam uma relativa pechincha, ganham fôlego dia após dia. 

Papo civilizado

Outra boa notícia é que Xi Jinping e Biden tiveram uma conversa amistosa hoje, antes da reunião do G20 em Bali, na Indonésia (à qual, diga-se, Bolsonaro não foi, em um mico grande demais até para os baixos padrões diplomáticos de seu governo. O único outro chefe de Estado a miar o rolê, por razões óbvias, foi Putin). 

Os líderes dos dois maiores países do mundo reconheceram que o clima de inimizade está indo longe demais, e que eles precisam conversar pacificamente sobre alguns tópicos divisivos – como a disputa fria-mas-quase-quente em torno do status político de Taiwan, críticas americanas às violações de direitos humanos pelos governo chinês, o mau comportamento da Coreia do Norte ou a guerra comercial que impede a China de importar componentes essenciais para a fabricação de notebooks e celulares (bem como proíbe a gigante de telecomunicações Huawei de participar do mercado de implantação das redes 5G no Ocidente).

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A esperança de que os EUA deem um passo atrás em seu arranca-rabo duradouro com a China é outro bom motivo para acreditar na recuperação econômica do gigante oriental em longo prazo. E um bom sinal para nós, que nos beneficiamos de manter boas relações com ambos – algo que parecia cada vez mais difícil com os ânimos acirrados pela guerra na Ucrânia. O Brasil, afinal, sempre jogou em cima do muro na diplomacia. 

P.S. Dê uma olhada na alta da IRBR3 hoje, campeã do ranking aqui embaixo. Ah, a volatilidade das penny stocks.

E bom feriado! 

Maiores altas

IRB (IRBR3): 15,85%
Meliuz (CASH3): 10,91%
Azul (AZUL4): 6,46%
Gol (GOLL4): 5,84%
Pão de Açúcar (PCAR3): 5,47%

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Maiores baixas

Marfrig (MRFG3): -7,06%
Embraer (EMBR3): -5,74%
CSN (CSNA3): -2,79%
JBS (JBSS3): -2,73%
Usiminas (USIM5): -2,73%

 

Ibovespa: 0,81%, a 113.161 pontos


Em NY:

S&P 500: -0,89%, a 3.957 pontos

Nasdaq: -1,12%, a 11.196 pontos

Dow Jones: -0,62%, a 33.537 pontos

Dólar: -0,64%, a R$ 5,29.


Petróleo

Brent: -2,97%, a US$ 93,14

WTI: -3,47%, a US$ 85,87


Minério de ferro:
2,97%, a US$ 94,58 a tonelada no porto de Qingdao

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