Entenda como o governo pretende arrecadar mais em 2024
Seja como for, o mercado não curtiu. Queda de 1,53% nesta quinta, mesmo com o minério e o petróleo em alta. E o Ibovespa fecha agosto em -5,09%.

Minério de ferro: 3,45%. Petróleo: 1,86%. Dia de alta nas commodities deveria ser dia de alta na bolsa de um país que há meio milênio depende delas. Mas não.
O Ibovespa tombou 1,53% nesta sexta, estendendo as perdas de agosto para 5,09%. Dos 23 pregões do mês, 18 vieram no vermelho.
O freio de mão dos últimos dias tem sido a preocupação com o (des)equilíbrio fiscal.
Quanto mais o governo gasta, mais ele promete em novas receitas. Até recentemente, previa-se a necessidade de R$ 130 bilhões para zerar o déficit primário no ano que vem (ou seja, fazer com que os gastos públicos sejam 100% cobertos pela arrecadação de impostos, sem contar o dispêndio com os juros e amortizações da dívida pública – para isso, na ausência de superávit, rola-se mais dívida; normal).
De volta aqui, após o aposto megalomaníaco. Se arranjar os R$ 130 bilhões extras em impostos já não parecia fácil, agora a grana necessária pulou para R$ 168 bilhões – é o que está no Projeto de Lei Orçamentária para 2024, enviado hoje ao Congresso. E zerar o déficit no ano que vem faz parte da meta da nova âncora fiscal, que substituiu o teto de gastos.
Melhor seria se o governo estivesse gastando menos. E não é o caso. O déficit primário de julho, anunciado ontem, fechou em R$ 35,93 bilhões. Foi o segundo maior desde 1997 (contabilizando valores corrigidos pela inflação). Só perde para os R$ 109,6 bilhões de julho de 2020 – um rombo criado pelos gastos extraordinários (em todos os sentidos) da pandemia.
Mais abaixo, após o intertítulo, veja como o governo pretende ampliar a arrecadação.
Na bolsa, Nova York também não ajudou. Hoje foi dia de PCE, o índice de inflação que o Fed usa como referência para sua política de juros. Veio em 3,3% na comparação com julho do ano passado, dentro das previsões do mercado – e uma alta ante os 3% de junho.
Dissemos uma meia verdade aqui. O índice para o qual o Fed olha mesmo, é o núcleo do PCE, que exclui os preços de energia e alimentos (mais voláteis, e pouco responsivos a juros). Alta também: de 4,1% no anual em junho para 4,2% agora. Portanto, ainda mais distante da meta americana, de 2%. Ou seja: sinal de que a política hawkish do Fed deve seguir a perder de vista.
Na ausência de surpresa positiva, o S&P 500 fechou em -0,16%. No Dow Jones, o índice mais seleto, só com as 30 maiores empresas de lá, a variação foi mais expressiva: -0,48%.
Por aqui, a alta do minério cumpriu seu papel e fez a Vale fechar no azul. Foram só 0,15% – mas o bastante para colocar a mineradora entre as maiores altas, num dia de tanto mau humor com as contas públicas.
O petróleo também deu um empurrão para a Prio (1,33%) e a 3R (2,24%). Já a Petrobras não respondeu à alta do barril. Caiu 2,08% na esteira das preocupações sobre a disciplina fiscal de seu acionista controlador, o governo.
E na ponta das maiores baixas, a CVC. Tombo de 9,49%, devolvendo parte dos ganhos que ela teve com a eufórica alta de 25% ontem, na esteira da crise da 123 Milhas sua concorrente. Agora, o orçamento.
As apostas do orçamento
O governo propõe três grandes eixos para aumentar a arrecadação. Vamos a eles.
EIXO 1: “Recomposição da base fiscal e correção de distorções” (nas palavras do governo). Isso consiste no seguinte:
- A) Levantar dinheiro resolvendo conflitos tributários que tramitam no Carf, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Ontem, o Congresso aprovou a volta do “voto de qualidade” nos julgamentos. Traduzindo: em caso de empate em alguma decisão do conselho sobre um contribuinte tal ter ou não de pagar o imposto em litígio, o voto de minerva será de um representante do fisco. Vantagem para o Estado. No Orçamento 2024, Haddad e sua turma pretendem colher R$ 54,7 bilhões extras por essa via.
- B) O STJ decidiu em abril que empresas não poderão mais usar isenções de ICMS (um imposto estadual) para reduzir a base de onde sai o cálculo de impostos federais sobre o lucro – ao menos não de forma tão ampla como rola hoje. A Fazenda prevê R$ 37,3 bilhões extras em 2024 vindos dessa fonte.
EIXO 2: “Isonomia tributária e enfrentamento a abusos”. Do que se trata:
- A) Essa é mais simples: o fim da isenção de IR para os fundos exclusivos (com aplicação mínima de R$ 10 milhões). Ela já foi implementada, via Medida Provisória, no dia 28/08. A ideia é tascar um come-cotas neles, tal como acontece com os fundos pedestres, os dos mortais comuns.
Também entra aí a taxação de fundos brasileiros que investem no exterior – tal como os exclusivos, restrito a “investidores qualificados” (quem tem mais de R$ 1 milhão investidos).
Para fechar, a MP também taxa fundos imobiliários menos inclusivos (com menos de 500 cotistas). Antes, só aqueles bem fechados, como menos de 50 cotistas, pagavam IR.
- B) Fim dos Juros sobre Capital Próprio. As empresas deduzem do lucro os proventos que pagam a título de JCP. Sem essa brecha (ou seja, sendo obrigadas a pagar só dividendos normais), elas passam a pagar mais impostos sobre o lucro.
A intenção com o pacote todo do eixo 2 aí é arrecadar R$ 30,33 bilhões com essas novas mordidas do leão.
EIXO 3: “Nova relação com o fisco”:
Trata-se de promover a renegociação de dívidas de grandes devedores. Uma espécie de “desenrola” para o topo da pirâmide. Querem tirar R$ 42 bilhões dessa forma.
Fora dos eixos, há R$ 700 milhões esperados com a taxação das bets.
Até aqui, a soma dá R$ 165,03 bilhões. Previsões de receita classificadas como “outras” completam o que resta para os R$ 168 bilhões.
E é isso. Como diria o analista Mané Garrincha: agora é só combinar com os russos.
Até setembro ;).
MAIORES ALTAS
Petz (PETZ3): 5,18%
3R Petroleum (RRRP3): 2,24 %
Prio (PRIO3): 1,33%
Embraer (EMBR3): 0,88%
Marfrig (MRFG3): 0,54%
MAIORES BAIXAS
CVC (CVCB3): -9,49%
Alpargatas (ALPA4): -6,56%
Grupo Pão de Açúcar (PCAR3): -6,44%
Dexco (DXCO3): -6,35%
Gol (GOLL4): -5,48%
Ibovespa: –1,53%, aos 115.741 pontos
Em Nova York:
S&P 500: -0,16%, aos 4.507 pontos
Nasdaq: 0,11%, aos 14.034 pontos
Dow Jones: -0,48%, aos 34.721 pontos
Dólar: 1,68%, a R$ 4,95
Petróleo
Brent: 1,86%, a US$ 86,83 por barril
WTI: 2,45%, a US$ 83,63 por barril
Minério de ferro: 3,54%, a US$ 116,47 por tonelada em Dalian