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O mito do mérito absoluto

A ideia de que só o mérito é suficiente não reflete a realidade. A meritocracia pura é ingênua e ignora as dificuldades de ser empreendedor num país difícil como o Brasil

Por Adriana Conconi, em colaboração especial com a Você S/A*
Atualizado em 18 ago 2025, 14h47 - Publicado em 17 ago 2025, 08h00
Montagem de uma mulher caminhando. No caminho percorrido podemos ver uma escada vindo de um buraco.
 (DNY59/Getty Images)
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Fazer algo laborioso e difícil. É assim que o dicionário define o que é empreender. No Brasil, essa definição ganha contornos ainda mais desafiadores em razão de um cenário marcado por desigualdades e um discurso meritocrático que ignora a complexidade real da vida.

O Índice Global de Complexidade Corporativa coloca o país como o 7º mais complexo para se fazer negócios. Não é à toa, portanto, que muitos definam empreender como um ato de coragem. É algo que exige resiliência, criatividade e disposição para enfrentar incertezas.

Também se trata de um jogo cujo tabuleiro não é o mesmo para todos. Enquanto alguns têm acesso a redes de apoio, crédito, educação e segurança para arriscar, outros precisam superar barreiras estruturais antes mesmo de começar. Como se não bastasse, há sempre o fator sorte: você pode fazer tudo certinho, seguindo os melhores guias e as melhores práticas e, ainda assim, falhar.

É por isso que chama atenção quando, vez ou outra, surge a onda do discurso da meritocracia. Estude e vencerá; acorde às 5h e prosperará; tente de novo, quantas vezes forem necessárias, e acertará; aja em vez de reclamar e prevalecerá. E disso derivam-se cursos, mentorias, consultorias e toda uma cultura que simplifica o empreendedorismo a algo unidimensional. 

Em tese, nada disso está errado. Estudar, acordar cedo, persistir e ter uma postura proativa em relação à vida são bons valores a serem cultuados. O problema é que, quando o assunto é empreender, o indivíduo não está isolado, ele não é o dono das regras. Ele está inserido num contexto em que ele, querendo ou não, é uma de tantas outras peças do tabuleiro. Não se pode ignorar o peso das variáveis externas – sobretudo no Brasil, onde elas são muitas.

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Segundo o Sebrae, 57,7% dos Microempreendedores Individuais (MEIs) encerram suas atividades em menos de cinco anos. Financiamento também é um problema: 54% dos pequenos negócios têm empréstimo negado pelos bancos, tendo que recorrer ao cartão de crédito e seus juros nada atrativos. Já de acordo com o Banco Mundial, um empreendedor de médio porte gasta 1.501 horas de trabalho por ano (o equivalente a 62 dias) para cumprir com suas obrigações fiscais.

Mas apesar dos entraves, o brasileiro segue empreendendo. Em 2024, a taxa de empreendedorismo no Brasil atingiu o maior patamar dos últimos quatro anos, chegando a 33,4%. São mais de 47 milhões de pessoas envolvidas com algum tipo de negócio, seja ele formal ou informal. O desafio é tão grande que a Assembleia Geral da ONU elegeu 27 de junho como o dia Internacional das Micro, Pequenas e Médias Empresas (PMEs) como um reconhecimento da importância das PMEs para a economia global, geração de emprego, renda e desenvolvimento sustentável. A relevância não é pouca: as PMEs representam cerca de 27% do PIB brasileiro e foram responsáveis por empregar mais de 900 mil trabalhadores, representando mais de 60% dos empregos criados no Brasil em 2024, de acordo com o Sebrae.

Em geral, se abre ou se fecha um negócio por causa de dinheiro: seja para ganhá-lo ou parar de perdê-lo. Contudo, no caso do Brasil, as conclusões da edição mais recente do Monitor Global de Empreendedorismo apontam que os brasileiros são o 3º povo que mais empreende motivado por propósito, ou seja, com o objetivo de fazer uma diferença no mundo. 

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Na prática, isso significa que, na visão dos brasileiros, o propósito não é um entrave ao lucro, mas sim um acelerador do crescimento. Lucro é essencial, claro. Mas impacto também é. Empresas que colocam valores no centro não estão romantizando a realidade, estão transformando-a. 

O Brasil vive um paradoxo: embora tenha uma elevada taxa de empreendedorismo, oferece um dos ambientes mais adversos para os negócios, especialmente para os pequenos e médios. Essa contradição ajuda a entender por que tantas empresas fecham as portas. O problema, claro, nunca foi falta de esforço ou dedicação.

O mito do mérito absoluto persiste porque é conveniente. Enquanto celebramos histórias de exceção de empreendedores que “venceram por esforço próprio”, ignoramos a regra comum de tantos outros engolidos por esse sistema. 

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O caminho para mudar passa por desburocratizar o ambiente de negócios, estímulo à oferta de crédito para PMEs, especialmente, periféricas e de impacto, e políticas públicas que considerem as assimetrias sociais e regionais – como programas de capacitação técnica – além de combate às desigualdades, abarcando quem empreende porque realmente precisa e, portanto, sem margem para erro.

É preciso coragem para admitir que talento e trabalho duro, sozinhos e nas condições de hoje, não bastam para empreender no Brasil. Quando tantos negócios quebram, não se trata de falta de mérito, mas sim de um sistema que naturaliza a exclusão em vez de combatê-la. E mudar essa lógica não é assistência, é equidade. 

*Adriana Conconi é diretora de Dados e Mensuração de Impacto da VR

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