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Estes empreendedores estão inovando na gastronomia

Conheça empreendedores que vão além do modelo tradicional de restaurantes para surpreender o mercado

Por Michele Loureiro
Atualizado em 17 dez 2019, 15h17 - Publicado em 21 jul 2017, 10h00

Em 2016, os brasileiros gastaram 184 bilhões de reais comendo fora de casa, 3% mais do que em 2015, segundo o Instituto de Foodservice Brasil. Isso pode dar a impressão de que o setor não sofreu grandes abalos por causa da crise. Mas, ao observar esse mercado com lupa, é possível notar que a queda do PIB impactou o desempenho dos estabelecimentos, que só tiveram alta de 0,3% no faturamento, o que significa que a inflação e o aumento dos custos fixos corroeram a maior parte dos ganhos.

“É uma área difícil, com investimento inicial alto, margens baixas e dedicação integral”, diz Felipe Gasko, consultor de mercado de alimentação e ex-coordenador de apoio a empreendedores da Endeavor, organização que dá suporte a novos negócios, de São Paulo.

Com tantos obstáculos, a gastronomia tem sido alvo de várias iniciativas inovadoras, que subvertem o tradicional modelo de restaurantes para contornar dificuldades como imprevisibilidade de entradas, necessidade de grandes estoques e desperdício de ingredientes. Tanta criatividade deverá ser recompensada em 2017, ano em que o faturamento do segmento deverá aumentar 10,7%, numa mostra de que o apetite do setor continuará em crescimento.

La mesa Gastro Lar

La mesa Gastro Lar (Eduardo Zappia/VOCÊ S/A)

Inspirados no crescente movimento de alimentação saudável e sustentável, a comunicóloga e escritora Cissa Borges, de 33 anos, e o chef argentino Javy Larroquet, de 32, criaram o La Mesa Gastro Lar, um refúgio em Itaipava (RJ), onde a comida não é a única atração e os visitantes podem tirar um cochilo na rede, contemplar a natureza, ler livros e acompanhar a preparação dos pratos ao lado dos donos da casa e do bebê, Caetano, de 10 meses.

“A proposta foi inspirada em experiências conhecidas como puertas cerradas, conceito bastante disseminado na Argentina”, diz Cissa, referindo-se aos eventos fechados, apenas para convidados. Para viabilizar o negócio financeiramente, o casal aposta na proximidade com os produtores da região.“Nosso cardápio é pensado de acordo com a disponibilidade de ingredientes”, afirma ela.

Diferentemente dos restaurantes tradicionais, no empreendimento do casal, os clientes sabem de onde vem o alimento. “Vem da roça mesmo. fazemos compras coletivas com outras pessoas da região. Eliminamos intermediários e conseguimos um preço melhor e qualidade garantida”, diz Cissa.

Os eventos só acontecem em dias agendados e com número limitado de frequentadores — até 20 clientes, previamente confirmados. Com isso, não há necessidade de estoque nem ocorrem perdas. “Não temos a intenção de ser grandes. O desafio é encontrar fórmulas para faturar mais sem perder a essência”, afirma a escritora, que cuida dos agendamentos e do atendimento, enquanto o marido cozinha. O empreendimento tem faturamento médio de 25 000 reais por mês e as experiências custam cerca de 200 reais.

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Atêlie no Escuro

Jantar no escuro , clientes degustam pratos com olhos vendados. Evento realizado pelo Atelie No Escuro, das sócias Gabriela Pistelli e Janaina Audi , no espaço gatronômico Manja, em Pinheiros (Fabiano Acorssi/VOCÊ S/A)

Durante uma viagem a Paris, a psicóloga Maria Lyra Müller, de 31 anos, participou de um evento que promovia experiências sensoriais para cegos. Ali, ela se inspirou para criar um formato de negócio no Brasil em que as pessoas pudessem ter seus sentidos aflorados por meio de vivências gastronômicas no escuro, com intervenções musicais e terapêuticas. Assim nasceu o Ateliê no Escuro, uma sociedade entre três psicólogas e uma terapeuta ocupacional. “Nós encontramos uma oportunidade de mercado pouco explorada e passamos a fazer eventos, inclusive corporativos, para trabalhar questões como liderança e entrosamento”, diz Maria.

Em parceria com bufês, elas preparam cada experiência sensorial de forma personalizada. Pesquisamos as propriedades de cada alimento e montamos o menu de acordo com a ocasião”, afirma a psicóloga, de São paulo. Para garantir o lucro no empreendimento, o Ateliê no Escuro não possui sede própria. “Sempre realizamos eventos em restaurantes e ambientes que tenham capacidade ociosa e topem fazer parcerias. Temos vários espaços sem ter nenhum”, afirma Maria, que já realizou edições em restaurantes tradicionais, como Capim Santo, Casa Bartira e Maní, em São Paulo.

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Assim, os custos fixos são reduzidos. Os jantares recebem, em média, 20 pessoas — número que pode chegar a 100 no caso de eventos corporativos. cada convidado paga 200 reais, em média. “Fazemos cerca de dez jantares por mês e nosso lucro é maior por não termos despesas recorrentes, como aluguel”, afirma Maria.

Monday Night Burgers

Daniel Perez Pires criador do grupo Monday Night Burgers, na hamburgada na Vila Madalena (Alexandre Battibugli/VOCÊ S/A)

Entediado com o trabalho de diretor de arte numa produtora de vídeos, Daniel Perez Pires, de 32 anos, pensava em uma forma de dar uma guinada na carreira. Seu passatempo preferido era fazer hambúrgueres e dividir experiências com os amigos. Com problemas para conciliar as agendas, os encontros para a comilança começaram a acontecer às segundas-feiras, teoricamente o dia menos cobiçado da semana.

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Mas o que era hobby acabou virando negócio. “Percebi que havia demanda para um formato diferente, em que eu recebia pequenos grupos de pessoas em casa, num ambiente descontraído, e cozinhava em meio a conversas e música”, diz Daniel. Assim nasceu o Monday Night Burgers no bairro de Sumarezinho, em São Paulo. Em 2014, Daniel deixou o emprego, uniu-se a um sócio e resolveu profissionalizar o negócio. Mesmo cobrando 50 reais por pessoa, o formato intimista fazia com que o público e o lucro fossem pequenos. “No começo as contas não fechavam”, diz.

Em busca de maior faturamento, mas sem deixar a proposta original se perder, surgiu um novo modelo. Em abril deste ano, o Monday Night Burgers ganhou uma sede, alugada no bairro da Vila Madalena, que funciona cinco dias por semana como uma espécie de clube do hambúrguer. “Fizemos um plano de fidelidade de pelo menos três meses, com planos de 65 a 100 reais. A expectativa é aumentar o faturamento em 70% com esse formato”, afirma.

O Monday Night Burgers recebe até 20 pessoas por noite, e quem não faz parte do clube paga 60 reais por refeição, exceto às segundas-feiras, quando só entram associados para a noite mais exclusiva da semana.

Jantar Secreto

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Larissa Januário, jornalista, e Gustavo Rigueiral, chef de cozinha, criadores do Jantar Secreto (Alexandre Battibugli/VOCÊ S/A)

A paixão pela culinária uniu o casal Larissa Januá­rio, de 38 anos, e Gustavo Rigueiral, de 31, ambos de São Paulo. A jornalista especializada em gastronomia e o chef de cozinha apostam num modelo em que o suspense é o diferencial. O endereço de cada edição é segredo e o cliente só descobre o que vai comer na hora, à mesa. Os participantes fazem as reservas pelas redes sociais, confiando no bom gosto dos anfitriões.

Os eventos acontecem em estúdios de fotografia, barbearias, ateliês de arte e até na casa do casal, em São Paulo. “Acreditamos que esse ambiente lúdico é uma boa oportunidade para vivenciar novas experiências”, diz Larissa. Mas o suspense não tem espaço nos resultados, já que o planejamento e a previsibilidade são dois dos principais fundamentos do negócio: os clientes fazem o pagamento antecipado­ do jantar, ao custo médio de 150 reais. “Dessa forma, trabalhamos com o capital real”, diz Larissa.

Os pratos do menu são criados para cada edição, sempre respeitando a sazonalidade dos alimentos. “Assim, conseguimos ingredientes mais frescos e com custo menor”, diz. O maior esforço consiste em convencer os clientes a pagar por um serviço que nem sabem qual será. “Nossa maior propaganda é o boca a boca. As redes sociais têm nos ajudado bastante nessa empreitada.”

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Soul Kitchen

Alexandre Pernet do Soul Kitchen: comida de vó, porções generosas e sem frescura (Alexandre Battibugli/VOCÊ S/A)

Filho de uma baiana, Alexandre Pernet, de 45 anos, sempre viveu numa casa cheia de parentes e de boa comida. Publicitário, foi estudar nos Estados Unidos quando era mais jovem e, inspirado pelas receitas da mãe, começou a preparar as refeições a fim de economizar enquanto morava fora. De volta ao Brasil, Alexandre replicou formatos que conheceu nos Estados Unidos e começou a cozinhar para conhecidos em seu apartamento, em São Paulo. Aos poucos, passou a receber pessoas completamente fora de seu círculo e decidiu se unir a um sócio para fazer da experiência uma fonte de renda. Foi assim que nasceu a Soul Kitchen, cuja proposta é servir comida bruta, como define Alexandre. “Fazemos comida de avó, em porções generosas e sem frescura. Tudo isso num ambiente com música e arte”, diz. Com o crescimento da empreitada, os sócios passaram a alugar bares para sediar seus eventos, frequentados por 200 pessoas por noite, pagando quanto achassem que valesse a festa. O projeto só ganhou contornos profissionais com a chegada de parceiros de renome, como Ambev, Colorado, Mekal e Electrolux, em 2014. “Nossa gestão mudou e os eventos viraram um negócio de verdade”, diz Alexandre, que hoje cobra um tíquete médio de 120 reais e mantém uma estrutura enxuta, de quatro funcionários fixos, para manter os custos sob controle. a Soul Kitchen agora tem sede nos Jardins, em São Paulo. No ano passado foram 77 eventos, com público de 14 000 pessoas. Para este ano, já há 89 eventos agendados. Até agências de viagens entraram na lista de parceiros, com a Soul Kitchen realizando uma excursão de uma semana para a Amazônia para explorar a culinária local. Eles levam junto cerca de 500 pessoas, pagando em média 6 000 reais. “As parcerias injetam capital e nos fazem crescer”, diz Alexandre.

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