3 atitudes que atrapalham o seu sucesso na bolsa
Investidores amadores tendem a perder dinheiro com ações. O livro “Trader ou investidor?” elenca os vieses comportamentais que mais induzem ao erro na hora de investir.
Em 1999, um artigo do professor de finanças Terrance Odean analisou o desempenho de 10 mil investidores amadores da bolsa americana. Sua base de dados continha todas as transações realizadas entre 1987 e 1993 em uma corretora dos EUA focada em pessoas físicas. Ao todo, eram 50 mil operações de compra de ações e outras 47,5 mil de venda.
Ele descobriu o seguinte: as ações que os investidores compraram tiveram uma valorização média de 1,83% nos quatro meses posteriores ao dia da aquisição. Segundo a pesquisa, esse era o tempo que os indivíduos costumavam segurar suas ações. Já os papéis que eles decidiram vender valorizaram em média 3,19% nesse período. Ou seja, essas pessoas abriram mão de ações que pagariam mais. Depois de um ano, a diferença foi ainda maior: as ações compradas haviam rendido 5,69%; as vendidas, 9%.
Se os investidores tivessem escolhido papéis de forma aleatória, o desempenho teria sido melhor – já que, estatisticamente falando, ações compradas e vendidas aleatoriamente nesse cenário tenderiam a apresentar uma rentabilidade média semelhante. Os acadêmicos da área costumam simplificar assim: se colocássemos macaquinhos para comprar e vender ações ao acaso, o desempenho dos primatas seria melhor que o da maioria dos humanos na bolsa.
Bruno Giovannetti e Fernando Chague, professores da FGV e autores de Trader ou investidor?, atribuem o fracasso ao que chamam de “comportamento de trader” – gente que quer se dar bem no curto prazo, mas acaba caindo em armadilhas da renda variável. No geral, eles são atraídos para ações caras. Compram e vendem papéis com muita frequência. E perdem (ou, no caso do exemplo acima, deixam de ganhar) dinheiro com essas transações. São mestres em fazer escolhas ruins.
No trecho a seguir, os autores listam alguns dos vieses comportamentais que atrapalham o desempenho dos “traders” na bolsa.
PARTE 1 – OS VIESES COMPORTAMENTAIS
1 – O Trader se acha melhor do que de fato é.
Em um artigo de 2009, os professores Amit Seru, Tyler Shumway e Noah Stoffman mostraram que, mesmo apresentando desempenho ruim na Bolsa, as pessoas continuam operando ações — e, em geral, mantendo o desempenho ruim, ainda que a tendência seja ficar um pouquinho menos ruim. Examinando com cuidado um banco de dados que reunia todas as operações realizadas por todos os investidores amadores da Finlândia entre 1995 e 2003 – e que trazia mais de 22 milhões de observações –, os professores verificaram que é de 15% a probabilidade de uma pessoa que tenha um desempenho (…) abaixo da média dos investidores amadores desistir de operar (…). Ou seja, em 85% dos casos, mesmo mandando muito mal, elas continuam operando ativamente.
O que poderia explicar esse fenômeno? Os professores Brad Barber e Terrance Odean já haviam assinalado (…) que uma característica forte da grande maioria das pessoas é ter excesso de confiança nas próprias habilidades. (…)
Em geral, nos achamos melhores do que de fato somos. No entanto, em situações em que o desempenho real é bastante evidente (por exemplo, jogar tênis, falar uma língua estrangeira), o excesso de confiança tende a ser menor. Já em situações em que o desempenho real é mais difícil de ser percebido e medido (…), o excesso de confiança tende a ser maior.
Na Bolsa, particularmente, é complicado aferir o desempenho real (…). Em períodos de Bolsa em alta, é fácil achar que você sabe escolher ações. Em períodos de Bolsa em baixa, é fácil culpar a economia pelo seu mau resultado. O fato de seu desempenho real estar sempre poluído pelos movimentos sistemáticos do mercado é um prato cheio para o autoengano.
Em geral, nos achamos melhores do que de fato somos.
Assim, Barber e Odean propõem que o excesso de confiança pode explicar, ao menos em parte, por que tantos insistem em continuar participando do mercado acionário de maneira ativa mesmo se saindo pior do que macacos. (…)
Barber e Odean inovaram ao distinguir investidores homens de investidores mulheres. Conforme explicam, há ampla evidência na literatura de psicologia de que homens tendem a apresentar mais excesso de confiança do que mulheres (…). Para os autores, essa evidência empírica é consistente com a hipótese de que o excesso de confiança leva as pessoas a continuar operando mesmo com desempenho ruim (…).
2 – O Trader gosta de adrenalina.
Em artigo publicado em 2009, os professores Mark Grinblatt e Matti Keloharju defendem que o fato de homens girarem mais suas carteiras [ou seja, vender e comprar mais ações] do que mulheres, apesar do resultado ruim, não decorre, necessariamente, de excesso de confiança. Eles observam que, além de maior excesso de confiança, os homens tendem a exibir mais ostensivamente outra característica que também poderia levá-los a operar mais do que as mulheres: o gosto por adrenalina (sensation seeking).
Os autores definem o gosto por adrenalina como sendo o prazer por atividades como apostar, correr ao volante, manter uma vida sexual arriscada, trocar de emprego com frequência, abusar de álcool e outras drogas, praticar esportes radicais com regularidade, entre outros.
Grinblatt e Keloharju destacam que esse gosto por adrenalina não se relaciona com o conceito usual de “aversão ao risco”, tão importante em economia e finanças. Uma pessoa que tem baixa aversão ao risco vai querer montar uma carteira de investimentos mais arriscada, já a pessoa que tem gosto por adrenalina não se satisfará apenas com uma carteira de investimentos mais arriscada. Ela vai querer olhar o mercado todos os dias, operar com frequência, entrar e sair de posições, sentir o prazer da novidade e da ação.
(…)
O gosto por adrenalina pode até mesmo fazer com que investidores profissionais operem mais do que deveriam e fiquem gastando corretagem e correndo risco à toa com o dinheiro dos outros. É isso o que aponta um artigo de 2018 escrito por Stephen Brown, Yan Lu, Sugata Ray e Melvyn Teo.
Eles constroem um banco de dados muito interessante com os veículos comprados por 5.479 gestores de fundos, 4.505 deles localizados nos Estados Unidos. Documentam então que os gestores que compram carros esportivos, daqueles com potência para circular em alta velocidade, também giram mais suas carteiras, a despeito de seus fundos irem pior se medidos por outros índices de performance.
(…). Ou seja, de acordo com as evidências empíricas acumuladas até o momento, pessoas que continuam operando ações mesmo com fraco desempenho devem, provavelmente, apresentar ao menos uma destas duas características: ou se acham melhores do que são ou têm gosto pela forte adrenalina propiciada pelo ambiente competitivo da Bolsa.
3 – O Trader não gosta de admitir que errou.
(…)
O efeito disposição é a forte tendência de realizar ganhos muito mais facilmente do que perdas. Imagine que você comprou uma ação, e ela sobe. Você decerto terá uma intensa vontade de vendê-la para colocar logo o dinheiro no bolso. Por outro lado, se compra a ação e ela cai, terá enorme dificuldade de aceitar que errou e de vender a ação no prejuízo. (…)
O primeiro artigo a abordar esse comportamento (e batizá-lo) foi publicado em 1985 pelos professores Hersh Shefrin e Meir Statman. Mas foi somente em 1998 que o professor Terrance Odean apresentou a primeira evidência empírica desse comportamento, a partir de um estudo que levou em conta a atuação de um bom número de investidores. Tratava-se de um banco de dados de uma grande corretora americana com as operações de 10 mil investidores amadores realizadas entre 1987 e 1993 (…).
[Odean descobriu] que a chance de uma pessoa vender uma ação que está com ganho é, nesse banco de dados, mais de 50% maior do que a de ela vender uma ação com perda. E essa grande diferença foi corroborada por muitos outros artigos de vários outros autores publicados a partir de estudos feitos com bancos de dados diversos.
O efeito disposição é a forte tendência de realizar ganhos muito mais facilmente do que perdas.
Por que nos comportamos assim? Um motivo largamente apontado é o de que, quando estamos ganhando, ficamos avessos ao risco (por isso queremos sair da posição arriscada, vendendo a ação). Contudo, quando estamos perdendo, ficamos amantes do risco (e queremos continuar na posição arriscada). Tal explicação se fundamenta em diversos estudos (…) realizados pelos professores Daniel Kahneman, Nobel de Economia em 2002, e Amos Tversky, já falecido no ano da premiação, que não é entregue postumamente.
No entanto, pode haver também outra justificativa por trás do efeito disposição: simplesmente não gostamos de reconhecer que erramos. Ao vendermos uma ação que está no prejuízo, estaremos reconhecendo que, de fato, erramos ao comprá-la. Em um artigo publicado em 2016, o professor Rawley Heimer apresenta evidências de que essa história do “é chato reconhecer que errou” pode mesmo ser um dos motivos do efeito disposição.
Se é chato reconhecer um erro para nós mesmos, mais chato ainda é reconhecê-lo na frente de outras pessoas. E o que Heimer destaca é: quem faz day-trade passa a fazer parte de uma rede social na qual todos os seus trades, quando encerrados, ficam públicos para os amigos, então o efeito disposição dobra! Vender uma posição com prejuízo quando outras pessoas estão olhando é mais constrangedor do que quando ninguém vai saber.
(…)
No (…) artigo de 1998, o professor Odean mostrou números que evidenciam o drama de quem sofre do efeito disposição. As ações que estavam com ganho e foram vendidas pelos investidores amadores (…) tiveram retorno, na média, 2,35% acima do mercado no ano seguinte. Por outro lado, as ações que estavam com perda e não foram vendidas pelos investidores tiveram retorno, na média, 1,06% abaixo do mercado no ano seguinte. Isso equivale a dizer que o efeito disposição dá um belo empurrãozinho para que as pessoas apresentem desempenho pior que o de macaquinhos. Porque eles [os símios] não diferenciariam as ações com ganho das ações com perda na hora de vender!
Clique aqui para comprar o livro na Amazon.