oi em maio de 2008, naquele passado longínquo em que o Brasil surfava o superciclo de commodities e podia ignorar a tormenta da crise financeira global que se formava. Em setembro daquele ano, veio o tsunami, arrasando as bolsas planeta afora. E dá para dizer que o Ibovespa nunca se recuperou dessa tragédia.
Lá em 2008, o Ibov em dólar bateu o pico de 44.638 pontos e aí foi de peixinho ao fundo do poço. Depois disso, o mais perto que o índice em dólar chegou do recorde foi em 2011, quando foi a 43.600 pontos. Ainda assim, estava 2,2% abaixo da máxima histórica. Hoje, o IbovUSD está ao redor dos 26 mil pontos. Ou seja: uma queda acumulada de 42% desde 2008.
Já o recorde do Ibovespa “tradicional”, na nossa moeda e que a gente acompanha todo dia, foi batido faz pouquinho, no dia 27 de dezembro de 2023, quando fechou em 134.194 pontos. Na comparação com 2008, a alta acumulada é de 84%.
Ó que maravilha, a bolsa em reais vai muito melhor que em dólar, partiu comemorar? Melhor não.
Primeiro que esse recorde do IbovespaBRL é nominal, sem considerar as perdas pesadas da inflação. Corrigindo o índice pelo IPCA, adivinhe? Sim, o recorde também foi atingido lá em 2008 e o Ibov ainda teria que bater 177 mil pontos para igualar a marca.
Mas voltemos ao IbovespaUSD, que é o assunto principal aqui. A diferença em relação ao IbovBRL é esperada, já que nessa jogada, óbvio, entra a oscilação da moeda americana. Lááá naquela época do recorde, o dólar valia R$ 1,60; hoje, ronda os R$ 5. Isso dá uma subida de 200% para a moeda americana, e torna tudo o que tem preço em reais mais barato para os estrangeiros. Inclusive as ações do Ibovespa.
E o que isso significa, no fim das contas? Bem: se o IbovespaUSD está longe do recorde, você pode dizer que ele está “barato”, o que potencialmente atrai gringos atrás de pechinchas.
Só que aí tem um outro detalhe: o gringo não negocia o IbovespaUSD. Para investir em empresas brasileiras em dólar, no conforto de Wall Street, ele tem dois caminhos: comprar os recibos de ações (ADRs) ou os ETFs de ações brasileiras negociados em Nova York.
Quem domina esse mercado é a BlackRock, com o ETF iShares MSCI Brazil – mais conhecido pelo ticker EWZ. Ele tem valor de mercado de US$ 5,9 bilhões, léguas à frente do segundo colocado nessa seara, o FLBR, que vale US$ 174,8 milhões.
O EWZ segue o índice “MSCI Brazil”, criado pela gestora de índices MSCI (uma das concorrentes da S&P, dona do S&P 500).
Para decidir quem entra no MSCI Brazil, a empresa fixou o objetivo de cobrir 85% do mercado de ações do país. Para isso, hoje ela precisa de 49 ações*, enquanto o Ibovespa, que mira mais o volume de negócios do que o valor de mercado, tem 87 papéis.
Até as cinco primeiras ações, os dois índices são similares. Vale, Petrobras, Itaú e Bradesco comandam o mercado; do sexto papel em diante começam algumas diferenças (veja na tabela). São bichos parecidos, mas que ficaram diferentes ao longo dos anos – justamente quando as negociações na B3 aumentaram, e o Índice Bovespa começou a ganhar mais ações.
Ainda assim, investidores brasileiros tendem a olhar o EWZ apenas como “a versão do Ibovespa em Nova York”. Então, quando é feriado no Brasil e o pregão por lá está rolando, o EWZ serve de base para imaginar o que estaria acontecendo por aqui com o Ibovespa.
A diferença final é significativa: o EWZ (em dólar) fechou 2023 em alta de 24%, acima dos 22% do Ibovespa (em reais) e bateu com folga os 17,39% de subida do IbovUSD. E na comparação com 2008? O EWZ cai 65% – bem mais que os 42% do Ibovespa em dólar. Dá para ver melhor nos gráficos abaixo: