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Claudio Lottenberg

Médico oftalmologista, é presidente do conselho do Hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde. Também atua como conselheiro da Unicef.
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Nós subestimamos o poder da gentileza no escritório – e na vida

A ciência mostra que atos de bondade tem um efeito mais poderoso do que imaginamos – tanto em quem faz como em quem recebe.

Por Claudio Lottenberg
Atualizado em 5 out 2022, 18h19 - Publicado em 30 set 2022, 21h00

Há alguns anos circula pelas redes sociais um vídeo, gravado no metrô de Nova York, que mostra uma mulher vendendo rosas em um vagão. Um homem, então, paga por todas – com a condição de que sejam doadas a quem ela quiser.

Num primeiro momento, a mulher mal consegue falar de emoção. Em seguida, começa a rir e oferecer as rosas aos passageiros – todos tomados de surpresa pelo ato de bondade do desconhecido, que desaparece assim que as portas do vagão se abrem, na estação seguinte.

A (boa) sorte, a gentileza e a bondade num dia comum nos pegam quase sempre despreparados. Acontecimentos assim são possibilidades, claro, mas o peso que a crueza do dia a dia tem sobre nós é grande – excessivo, muitas vezes.

Nem é de espantar que seja assim: problemas, estresse, mentiras, ofensas e cobranças (financeiras, profissionais, afetivas) são constantes no cotidiano. O autor de uma gentileza espontânea – e nem precisa ser do tamanho da compra de dez dúzias de rosas – nem sempre tem a noção exata do que o ato representa para quem está do outro lado. É algo poderoso. E agora, isso foi tema de uma pesquisa científica.

Um estudo publicado na edição de agosto do periódico especializado Journal of Experimental Psychology relata oito experimentos envolvendo a realização de gentilezas – desde oferecer carona a um colega até presentear alguém sem motivo específico.

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Os resultados mostraram que quem pratica o ato gentil tende a subestimar o efeito que tal ato terá em quem o recebe. Uma das experiências envolveu a entrega de cupcakes a estranhos. Quem ganhou o bolinho ficou muito mais feliz do que quem entregou – pela iguaria em si, mas mais ainda pelo carinho.

Segundo os pesquisadores, a expectativa de que um ato gentil terá pouco efeito tende a inibir a realização de gentilezas, “o que pode resultar em pessoas perdendo oportunidades de melhorar tanto o seu próprio bem-estar quanto o dos outros”.

Outros estudos sobre comportamento social envolvendo amizade e gentileza mostram que fazer algo de bom ajuda o próprio autor da bondade a reduzir seus níveis de estresse.

O ambiente de trabalho concentra muitas ocasiões para estresse. Já era assim antes da pandemia, e com a volta à ocupação dos escritórios, a tendência é continuar. Afinal, são muitas horas num mesmo ambiente, convivendo com pessoas das mais diferentes disposições de humor, em situações que podem exigir mais aspereza nos contatos.

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Mas, se os dias são repletos de ocasiões para a manifestação de mau humor, impaciência e brigas, também são repletos de chances para uma gentileza, que pode melhorar não só o dia de quem as recebe como de quem as pratica.

Não há limites para se pensar em ações que tornariam o ambiente de trabalho mais suaves e gentis. De abrir uma porta para um colega à fazer companhia numa refeição; partilhar materiais de escritório; levar um café à mesa de alguém; se voluntariar para uma tarefa conjunta… Há inúmeros modos de criar um ambiente gentil – e tudo dentro dos limites éticos, sem que se faça disso uma imposição ou algo invasivo.

O estudo dá um fundo científico à frase atribuída ao fabulista grego Esopo (620–564 a.E.C.): “Nenhum ato de bondade, por menor que seja, passa despercebido”. Ou, como ficou extremamente popular, numa fórmula muito sintética e elegante, elaborada pelo poeta urbano José Datrino, o Profeta Gentileza: “Gentileza gera gentileza”.

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