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Por que a diversidade no ambiente de trabalho importa?

Empresas que se comprometem a diversificar seus quadros obtêm resultados bem acima da média nacional do seu setor.

Por Luiza Nunes Lemos e Luiz Afrânio Araujo Sócio, advogados da área trabalhista do Veirano Advogados
Atualizado em 30 out 2020, 12h00 - Publicado em 30 out 2020, 12h00

Já faz tempo que o tema “diversidade” passou a integrar a pauta empresarial. Muito em razão de ter se observado que ela importa não só do ponto de vista social, mas por razões estratégicas: torna as empresas mais propensas a terem resultados financeiros acima da média.

O relatório Diversity Matters (“Diversidade Importa”), da consultoria McKinsey , revela que empresas que se comprometem a diversificar seus quadros obtêm resultados bem acima da média nacional do seu setor, seja em diversidade de gênero (desempenho 15% superior) ou raça (35% superior), para ficar apenas em dois exemplos. De acordo com a consultoria, tal relação se deve a maior capacidade dessas empresas para atrair melhores talentos, possuírem maior foco no cliente, maior satisfação dos funcionários e melhor tomada de decisões.

Mas se uma empresa mais diversa significa um potencial de resultados acima da média e causa evidente impacto social, por que iniciativas desse tipo ainda não se disseminaram amplamente no mercado? Por que diversidade ainda não é uma realidade na maior parte das empresas?

Primeiro, porque ter uma empresa diversificada dificilmente é algo que ocorre organicamente. Pelo contrário. O mesmo relatório da McKinsey mostra que, na maior parte dos países pesquisados, mais de 90% das empresas possuem uma liderança que não reflete a composição demográfica do mercado de trabalho ou da população do país. E, considerando que é essa liderança quem define as estratégias e seleciona os demais, a tendência é tal discrepância se manter nos demais cargos. Essa é a razão pela qual se fazem necessárias as chamadas “ações afirmativas”: medidas que buscam de forma ativa fomentar a integração social de grupos minoritários.

Exemplos recentes de ações desse tipo foram as divulgadas recentemente pelas empresas Magazine Luiza e Bayer, que farão programas de trainees (que selecionam justamente a liderança, onde se vê o maior déficit de diversidade dentro das empresas) voltados apenas para pessoas negras. Outras, como as tomadas por Ambev e Vivo, buscam diversidade na contratação reduzindo requisitos de admissão que são considerados obstáculos para as minorias, como inglês e faculdades consideradas “de ponta”. Há, ainda, ações como a da Votorantim, que implementou processo de seleção “às cegas”, buscando eliminar o chamado “viés inconsciente” que acaba fazendo com que os que selecionam escolham candidatos com quem se identificam de alguma forma.

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E a promoção da diversidade nas empresas não se limita ao momento da contratação: pode (e deve) ocorrer também na atuação direta com os empregados, por meio de treinamentos, políticas empresariais sensíveis a questões de minorias, revisão dos processos e critérios de promoção, entre diversas outras possibilidades. Aliás, se ela começa na contratação, somente com uma atuação forte e atenta no decorrer da relação com essas pessoas é que ela irá se consolidar como um verdadeiro ativo da empresa. Criar uma estratégia de diversidade e inclusão, portanto, demanda esforço, tempo, continuidade e uma liderança alinhada com esse valor – o que pode ser considerado um segundo motivo para não vermos mais empresas diversificadas por aí, muito embora esse esforço seja comprovadamente recompensado por melhoras nos resultados e em um ambiente de trabalho mais acolhedor.

Há, ainda, o empecilho do temor de que ações afirmativas possam ser consideradas ilegais por violarem o princípio da isonomia e da igualdade, o que não prospera. O STF já analisou a questão em diversas oportunidades e a posição sedimentada é de que o princípio da igualdade deve ser compreendido em seu aspecto material, pela máxima de “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades”. Assim, com base na interpretação dada pelo STF ao artigo 5º, caput, da CF ao analisar as ações afirmativas, pode se concluir que elas não apenas observam o princípio da igualdade, como constituem maneira eficaz de atingi-lo de forma plena – nos exatos termos preconizados pela nossa Constituição Federal.

Por fim, há também uma questão adicional: se por um lado a nossa Constituição autoriza (e incentiva) ações afirmativas que visam à inclusão no marcado de trabalho, também é verdade que a lei por vezes ainda pode ser um obstáculo a ser ultrapassado para atingir uma empresa mais diversa. Como fomentar a diversidade de gênero, por exemplo, se as consequências legais de uma gestação, como o período de licença, são tão diferentes para homens e mulheres? E a diversidade de orientação sexual não fica prejudicada diante da omissão legal quanto à licença maternidade para casais do mesmo sexo? São questões que, muito embora não mudem a conclusão sobre a importância da diversidade ou a legalidade das ações afirmativas, acabam configurando um obstáculo para que empresas já comprometidas com esse tema possam atingir resultados ainda melhores.

Para as não comprometidas, o recado é simples: invista em diversidade. Demandará ação, esforço e tempo, mas será recompensador. Em todos os aspectos.

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