Programa de mentoria em liderança feminina conecta jovens e CEOs

Entenda por que iniciativas como essa são tão importantes, segundo mentoradas e mentoras. Presidentes da IBM e SAP participam

Por Camila Pati
Atualizado em 17 out 2024, 11h53 - Publicado em 8 mar 2020, 06h00
Mulheres: apenas 18% da alta liderança, segundo pesquisa  (laflor/Getty Images)
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São Paulo – Ana Paula Assis, presidente da IBM para América Latina, sabe que sua trajetória é o típico caso de exceção que confirma a regra. “As mulheres ainda representam uma pequena porcentagem dos cargos de alta liderança”, diz. Avançamos, é certo. Mas o desafio para a equidade de gênero no Brasil e no mundo está nos cargos de diretoria e, principalmente, presidência de empresas. Estudo realizado pela IBM com 2,3 mil corporações indica que apenas 18% dos cargos de alta liderança são ocupados por mulheres.

Além da falta de pontos de referência, o caminho rumo ao topo já começa já começa sob clima de pessimismo para a maioria das mulheres. Elas entram no mercado de trabalho projetando barreiras: 75% de 1,6 mil candidatas a estágio e trainee, de 20 a 25 anos, entrevistadas pela consultoria EXEC, disseram que enfrentarão mais dificuldades do que os homens para alcançar uma posição de liderança dentro das organizações.  Apenas 5,3% disseram que não terão dificuldades.

A pesquisa é parte do projeto Executivas do Amanhã, criado pela EXEC com o objetivo de levar o tema da diversidade na liderança para empresas e engajar presidentes de empresas mulheres a combater a disparidade de gênero na alta liderança.

O programa caminha para o quarto ano e seleciona jovens estudantes para receberem mentoria de mulheres que se destacaram nas empresas. “O programa está no quarto ano e, na última edição tivemos mais de 1,5 mil inscritas para dez selecionadas”, diz André Freire sócio da consultoria de recrutamento EXEC. A próxima turma começará a ser selecionada em abril.

Thais Mitie, de 24 anos, é uma das participantes da última edição e recebeu mentoria de Flávia Bittencourt, que foi presidente da Sephora e hoje está na Adidas. “Nós mulheres temos mais medo de arriscar na carreira do que os homens. Existe um ambiente com que a gente já está acostumada sem perceber em que, geralmente, homens se candidatam para as vagas com uma confiança maior do que as mulheres e isso, de certa forma, inconscientemente ou conscientemente faz com que a gente não se sinta capaz o suficiente para concorrer a um cargo maior ou de dar opinião sobre alguma coisa”, diz Thais.

A mentoria que ela recebeu foi essencial na transformação desse viés negativo que assombra o começo de carreira. “Eu sempre pensava em como tinha sido para uma mulher dessas chegar lá porque para mim parecia tão difícil. Os encontros com a Flávia me mostraram que ela é uma pessoa igual a mim, também passou por milhares de problemas. É uma pessoa real, batalhou muito. Sabendo do que outras mulheres podem alcançar, eu saía de todos os encontros querendo falar para todas as mulheres que eu conhecia que a gente é forte sim”, conta.

Uma das histórias que mais impressionou a jovem foi descobrir que sua mentora é mãe de gêmeos. “Eu me questiono muito sobre ter filhos e a Flávia teve gêmeos quando era presidente da Sephora. Achei maravilhoso ouvir essa história de opção de ter tido filhos nesse ponto da carreira”, diz Thais. Para 37,9% das jovens entrevistadas decisões sobre carreira e maternidade são muito difíceis.

Sim, nós podemos

O grande mérito do programa diz Cristina Palmaka, presidente da SAP, e uma das executivas que participaram como mentoras é justamente o de aproximar as jovens de casos reais de sucesso. “Mostrar que é possível ocupar cargos de liderança, mostrar caminhos e alternativas.

Eu acredito muito no modelo de mentoria”, diz a executiva, que é casada e mãe de uma jovem de 14 anos. “Corro maratona, trabalho, adoro minha família, meus amigos, estou participando de conselhos de empresas, aprendendo coisas novas. Tudo isso, claro, demanda disciplina, resiliência e coragem”, diz ela que indica às suas mentoradas que tomem decisões baseadas em seus propósitos, sem tentar seguir uma receita, já que cada um tem suas próprias motivações.

Nas suas sessões de mentoria, a presidente da IBM também ia na mesma linha de provocar o autoconhecimento, sobretudo, ao notar o excesso de autocobrança. A busca pela perfeição em todos os papéis (profissional, mãe, esposa) chamou a atenção da executiva. “É maior do que na minha época e gera ansiedade e preocupação em como equilibrar todos os pratinhos”, diz.

Com a ajuda da sua mentora, Thais também reviu planos de carreira. Juntas, elas refletiram se as metas da jovem em relação a cursos e ferramentas de desenvolvimento faziam sentido, de fato, ou se eram fruto de uma insegurança e excesso de comparação com os outros.

A síndrome do impostor que leva mulheres a se candidatarem a uma vaga de emprego ou a uma promoção apenas quando se sentem 100% prontas e foi tema de reportagem da edição 253, da VOCÊ S/A, têm sintomas detectados lá no começo da carreira.

Para chegar a um lugar de destaque, 43,7% das estudantes disseram que precisarão se preparar muito mais do que os homens. “Participar do programa mudou a minha forma de ver muitas coisas. Eu me colocava muita pressão, de preciso fazer um curso, preciso fazer isso e aquilo para me destacar. Quando eu conversava com ela, ela me dizia: será que precisa mesmo de toda essa pressão? Ela me trazia para realidade”, diz.

Ter exemplos e referenciais é muito importante para ajudar as mulheres a lidar com o sentimento de incapacidade e insegurança. “Eu cavei o meu espaço e aceitei ocupar posições para as quais eu não estava preparada. Em uma das promoções eu cheguei a verbalizar que não estava pronta e ouvi que eu iria encontrar o caminho. Naquela hora eu pensei em como outra pessoa podia confiar mais em mim do que eu mesma. Todo mundo passou por isso. Quando eu assumi a presidência da SAP também não sabia se estava pronta”, conta Cristina.

Nem 20% das jovens ouviram falar de diversidade de gênero 

Todos os entrevistados pela reportagem falam que equidade de gênero é fruto de ações afirmativas. Mas elas são raridade no mundo. “Das 2,3 mil empresas que participaram do estudo da IBM, só 21% têm iniciativas que promovam mulheres a posições de liderança como prioridade de negócios”, diz Ana Paula.

Entre as jovens participantes da pesquisa da EXEC, 45,3% destas jovens afirmam nunca terem participado de programas de desenvolvimento de liderança. Apenas 17,4% ouviram falar sobre diversidade de gênero no ensino médio ou na faculdade.

 Sem investimento não é possível a criação de ambientes favoráveis ao desenvolvimento de carreira da mulher. “Para que a mulher possa se desenvolver ela requer flexibilidade no ambiente de trabalho, ferramentas de apoio  que permitam que ela cresça principalmente  em momentos críticos, o da maternidade é um deles. Você tem que criar, por exemplo, uma sala de lactação”, diz.

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Apenas as decisões de negócio podem derrubar as barreiras.  “As empresas precisam ter os olhos mais atentos para questão da diversidade”, diz da presidente da SAP. A empresa tem a certificação global de equidade de gênero EDGE.

O investimento de diversidade dá retorno. A diversidade dá lucro para as empresas e esse foi o tema do terceiro episódio do podcast da Rádio Peão, o podcast semanal da VOCÊ S/A. Um dos convidados foi Niarchos Pombo, líder de Diversidade e Inclusão da SAP Brasil.  Ouça aqui o episódio completo:

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