O TikTok tenta te dar mais controle sobre seu tempo de tela – e isso pode fazer você passar mais horas no app
Esse seria o “paradoxo da desintoxicação digital”. Uma dupla de pesquisadores observou que, em alguns usuários, os recursos de bem-estar fazem eles gastarem mais tempo no TikTok

As tentativas das redes sociais de incentivar os usuários a passar menos tempo nos apps podem, na verdade, levá-los a ficar mais tempo online. É o que afirma uma dupla de pesquisadores em seu novo estudo, publicado no periódico Journal of Public Policy and Marketing.
Já faz um tempo que o TikTok começou a emplacar uma série de ferramentas para ajudar os usuários a terem mais controle do próprio tempo de tela. Entre lembretes para fazer pausas e limites diários de uso, os recursos de bem-estar digital tem o objetivo de mitigar o uso excessivo da rede e promover consciência nos hábitos digitais.
Aparentemente, todo esse maquinário de controle acaba fidelizando ainda mais os usuários. Por oferecer uma opção de intervenção, o TikTok parecia um aplicativo mais autêntico e genuíno para eles. Isso, por sua vez, aumentava as suas intenções de passar tempo na rede social.
Em sua pesquisa, os cientistas batizam essa observação de “paradoxo da desintoxicação digital” – quando oferecer medidas para um detox de telas acaba fazendo os usuários gostarem mais ainda da plataforma.
“Os resultados mostraram que os esforços de intervenção de desintoxicação digital do TikTok, ironicamente, levaram seus usuários menos céticos em relação à publicidade a abrirem mais o TikTok e usá-lo por mais tempo”, afirma Christopher Newman, professor da Universidade de Mississippi e coautor do estudo. “Esses usuários menos céticos consideraram o TikTok mais autêntico quando ele ofereceu intervenções de desintoxicação voluntariamente e, por sua vez, responderam positivamente ao TikTok, paradoxalmente usando mais o aplicativo.”
Paradoxo do detox digital
O TikTok atrai mais de 1,5 milhão de usuários ativos em todo o mundo a cada mês, de acordo com dados recentes. Os EUA têm o maior público da plataforma, com mais de 135 milhões de usuários mensais. O Brasil não fica muito atrás: ocupamos o terceiro lugar do pódio, com quase 92 milhões de usuários mensais.
Com o número elevado de internautas passando tanto tempo nas redes, também cresce a preocupação com o impacto desse tempo de tela na saúde mental dos usuários, principalmente dos mais jovens, que costumam ser mais suscetíveis ao vício em mídias sociais.
Para realizar seu estudo, a dupla de pesquisadores avaliou a atividade diária de um grupo usuários do TikTok para determinar se os lembretes integrados e limites de tempo diários realmente afetavam o uso do aplicativo. A maioria dos participantes passava consistentemente de seis a sete horas por dia grudados em aplicativos de mídia social – às vezes chegando a 10 horas diárias.
Os resultados sugerem que os recursos disponíveis para reduzir o tempo de tela podem ter o efeito contrário, fortalecendo o engajamento de certos usuários do TikTok. Segundo os pesquisadores, os internautas afetados pelo “paradoxo da desintoxicação digital” foram aqueles que eram menos céticos com propagandas no app.
“Crianças e adolescentes normalmente não percebem segundas intenções tão facilmente quanto os adultos e, portanto, são caracteristicamente menos céticos em relação a publicidade, promoções e ofertas semelhantes”, afirma Emma Galvan, professora assistente na Universidade Georgia Southern e coautora do estudo.
“Quanto mais tempo de tela esse grupo consome ao longo da infância, mais vulneráveis se tornam. Portanto, os pais precisam ter isso em mente ao monitorar o tempo de tela de seus filhos e suas interações com conteúdo pago nas redes sociais.”
Na teoria, esse grupo de usuários pode ter interpretado a disponibilidade desses recursos com uma preocupação bem-intencionada e genuína da plataforma. Dessa ingenuidade, talvez tenha nascido uma simpatia e preferência pelo TikTok – o que aumentou o engajamento desses consumidores com a rede social.
Tanto é que pessoas com maior ceticismo em relação à publicidade não demonstraram mudanças significativas de comportamento, ignorando amplamente os lembretes de pausa do aplicativo.
“Esta pesquisa é particularmente oportuna, considerando os esforços legislativos em andamento que visam coibir o uso problemático das redes sociais”, diz Newman. “Identificamos um segmento vulnerável de consumidores que formuladores de políticas e organizações não governamentais devem reconhecer ao elaborar iniciativas voltadas à regulamentação do uso de mídias sociais.
“Por outro lado, os formuladores de políticas também precisam estar cientes de que níveis mais altos de ceticismo podem ser um obstáculo à eficácia dos esforços de desintoxicação digital.”
Segundo os pesquisadores, quem busca uma desintoxicação das redes, ou quer dar um tempo no tempo de tela interminável, pode encontrar mais sucesso por meio de limites autoimpostos, ao invés de depender de pausas propostas por aplicativos.