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Carreira ou maternidade? Estas mães contam como conciliar as duas coisas

O home office é uma alternativa para conciliar maternidade e carreira. Mas tocar os negócios da sala de jantar requer cuidados específicos

Por Daniela Arrais, da VOCÊ S/A
Atualizado em 19 dez 2019, 14h52 - Publicado em 20 ago 2019, 06h00
Nathana Lacerda, criadora da Six Sigma: trabalhar de casa aumenta a produtividade e o tempo ao lado do filho | Germano Lüders /  (Germano Lüders/VOCÊ S/A)
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Trabalhar em casa era algo que não passava pela cabeça de Nathana Lacerda, de 34 anos. Fundadora, há 15 anos, da Sigma Six, empresa especializada em construção de imagem e reputação, de segunda a sexta ela se arrumava para ir até a sede do escritório, a 15 minutos de sua casa, no bairro Padre Bento, em Itu, a 100 quilômetros de São Paulo.

Lá, passava de 7 a 9 horas diárias. “Nunca havia pensado em home office, achava que isso era para quem estava começando”, diz Nathana. Mas tudo mudou há dois anos, quando ela deu à luz a seu primeiro filho, Bento.

Após a maternidade, a em­preendedora se deu conta de que sua antiga rotina não funcionava. “Vivia correndo para cima e para baixo, era um caos”, diz. Da desorganização surgiu a necessidade de otimizar o tempo, e Nathana chegou à conclusão de que trabalhar remotamente diminuiria a correria.

“Percebi que poderia fazer meu trabalho de qualquer lugar.” Mas o começo não foi fácil. No primeiro dia, ela chorou muito. “Era como se estivesse abrindo mão de minha segurança. Ir para um local trabalhar gera uma sensação de estabilidade.”

Nos dias seguintes, porém, notou que antes vivia em um ritmo impossível de aguentar por muito tempo. “Perdia horas e energia nos deslocamentos.

Hoje, almoço com calma, ao lado do meu filho. Com o pai e a mãe mais tempo em casa, Bento está mais tranquilo. E a mudança de comportamento dele me ajudou a entender que tomei a decisão certa.”

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Assim como Nathana, muitas mães encontram no home office uma solução possível para conciliar a carreira e o cuidado com os filhos.

Tanto que uma pesquisa feita pelas autoras ­Patricia Travassos e Ana Claudia ­Konichi para o livro Minha Mãe É um Negócio (Saraiva, 29,90 reais) mostra que 58% das mães tocam suas empresas de dentro de casa.

“O home office é o trabalho em domicílio moderno, que sempre existiu. Trabalhar de casa tem sido uma estratégia para mulheres com filhos pequenos e vontade de exercer de uma forma específica sua maternidade”, aponta Bárbara Castro, socióloga e professora da Unicamp.

“Além disso, é preciso levar em conta o preço alto dos berçários e escolas e a ausência de universalidade de creches públicas para deixar a criança. Estar em casa é uma maneira de conseguir prover cuidado, já que o Estado não o faz e os serviços privados não cabem no orçamento.”

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Pés no chão

Mas é preciso tomar cuidado com a glamourização desse estilo de trabalho. É comum que a mulher que faz home office se sinta sobrecarregada, somando funções domésticas às atribuições profissionais. Isso porque, na cultura brasileira, ainda se acredita que cuidar da casa seja uma função feminina.

“A inclusão das mulheres no mercado de trabalho ficou mais forte a partir da segunda metade do século passado. Entretanto, as tarefas de cuidado nunca foram redistribuídas. E, mesmo trabalhando, as mulheres continuavam com a responsabilidade do cuidado de filhos, idosos e casa, enquanto homens permaneciam na posição de provedores oficiais, sem responsabilidades domésticas”, explica Regina Madalozzo, professora e pesquisadora do Insper.

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Tanto é que as mulheres trabalham 20,9 horas por semana em afazeres domésticos e no cuidado de pessoas, quase o dobro das 10,8 horas dedicadas pelos homens. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2017 (Pnad Contínua), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2018.

E no home office isso fica evidente. A socióloga Bárbara Castro fez uma pesquisa qualitativa com cerca de 70 pessoas que trabalham em casa, entre homens e mulheres, e constatou que o comportamento é bem diferente entre os dois sexos.

“Elas ficam no centro da casa, geralmente na mesa de jantar, acordando mais cedo para se concentrar, observando o cuidado da babá quando podem ter uma, tendo o trabalho muito interrompido e acabam se sentindo improdutivas. Já os homens trabalham em escritório com porta fechada, para que ninguém os interrompa, e se sentem mais produtivos do que na empresa”, explica a pesquisadora.

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Para que o trabalho de casa real­mente funcione e seja prazeroso, compartilhar as tarefas com o companheiro ou companheira é fundamental. E atenção: não se trata de ajuda, mas de divisão real de tempo e responsabilidades.

“O caminho é se posicionar. Deixar claro o que espera, mostrar quando está trabalhando em algo e não pode ser interrompida”, diz Nathana, que criou uma rotina para o home office funcionar.

Ela acorda antes das 6 horas para resolver questões estratégicas e poder ficar com o filho quando ele se levanta — cuida dele das 7h30 às 13 horas. À tarde, Bento fica com os avós, e Nathana pode fazer reuniões e atender os clientes. Às 19 horas, ela busca o pequeno.

“O grande desafio é manter o foco, mas me sinto muito produtiva, mesmo que trabalhe menos horas”, diz.

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Outro desafio do home office é lidar com o isolamento de ficar em casa por muito tempo. Quem sentiu isso na pele foi Débora Emm, de 35 anos, criadora da empresa Inesplorato, que promove curadoria de conhecimento.

Há quatro anos, quando sua companhia já estava sólida, Débora resolveu que era hora de se tornar mãe. Nasceu Adélia. Durante seis meses após dar à luz, a empreendedora ficou afastada da rotina profissional, já que a empresa de seis sócios e 22 funcionários conseguia operar sem sua presença.

Aos poucos, Débora retomou a rotina. Mas não mais em São Paulo, onde morava antes da maternidade, e sim em Aruã, perto de Mogi das Cruzes, cidade do interior paulista que fica a cerca de 100 quilômetros da capital.

“Sentia falta da troca que o escritório promove e, por isso, uma vez por semana vou até São Paulo”, diz. Com a viagem, Débora se sente mais produtiva e feliz.

Em casa, ela criou um espaço dedicado ao trabalho. Embora não tenha portas ou paredes, o local é respeitado por sua filha.

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“Ela sabe que ali existe uma barreira para não atrapalhar minha concentração. Quando me proponho a trabalhar, fico imersa, e nenhum barulho me distrai. Acho muito interessante que minha filha observe meu dia a dia e eu o dela. Ela sabe o que significa trabalho e como conviver com isso”, afirma Débora.

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Débora Emm, fundadora da Inesplorato: rotina dividida entre o home office e a sede da empresa | Germano Lüders

E as empresas?

Existe uma triste estatística no Brasil: após dois anos de retorno da licença-maternidade, 48% das mulheres são demitidas, de acordo com uma pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas, que aponta ainda que a maior parte dos desligamentos ocorre sem justa causa.

“Não é à toa que uma mulher no ambiente formal de trabalho se sente com medo no minuto em que se descobre grávida. Ela sabe que naquele momento o risco de ser desligada por qualquer motivo aumenta. Também sabe que, ao tentar retornar ao mercado de trabalho, encontrará dificuldade e que jamais vai competir em condições iguais fora do período considerado de risco”, diz Vivian Abukater, sócia da Maternativa, rede cujo objetivo é transformar a relação entre mães e mercado de trabalho.

Ela própria foi vítima de uma demissão quando retornou de sua licença-maternidade em uma multinacional.

Por isso, muitas optam por em­preender — não por vontade própria, mas como alternativa. “Boa parte das companhias não está preparada para acolher mães.

E, assim, grandes talentos são perdidos, pois várias têm filho quando estão no auge de suas carreiras”, diz Luciana Cattony, da consultoria Maternidade nas Empresas.

Algumas companhias, no entanto, começam a entender essa questão e passam a criar ambientes mais amigáveis às mães e que estimulem o desenvolvimento de suas funcionárias. “Já identificamos no mercado empresas que têm equidade de gênero como um valor, um contexto que facilita abordarmos a maternidade”, diz Luciana.

Ao pensar em políticas para mulheres que recentemente se tornaram mães, é necessário prover flexibilidade e acolhimento.

“No grupo de países que mais incentivam a participação feminina no mercado após a maternidade, há adoção de iniciativas como licença parental mais longa (licença para o pai e a mãe, com obrigatoriedade de divisão do período entre ambos) e remunerada, jornada flexível e possibilidade de trabalho remoto”, afirma Regina Madalozzo. Creches, pré-escolas e escolas em horário integral também fazem parte do pacote.

No fundo, o que falta para que as mães optem por trabalhar como preferirem é um olhar mais receptivo, como resume Luciana: “Em um mundo regido pelo valor humano, onde se pedem ambientes acolhedores e líderes mais empáticos, não faz sentido ter de escolher entre carreira e filhos”.

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