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O colapso da MSK, a assessoria de cripto que prometia até 5% ao mês – mas parou de pagar clientes

Empresa promete devolver o dinheiro investido, mas quer pagar de maneira parcelada. MSK nega fraudes.

Por Tássia Kastner
27 dez 2021, 12h07
imagens de criptomoedas douradas
 (Unsplash/VOCÊ S/A)
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Num dia, o investidor acredita ter uma preciosidade que rende até 5% todo santo mês  – impressionantes 80% ao ano. No outro, essa renda fixa deixa de pingar, e o dinheiro aplicado no começo fica “congelado” sob a promessa de devolução em prestações a perder de vista.  

Esse é o pesadelo vivido pelos cerca de 4.000 clientes da MSK Invest, uma empresa que vendia “assessoria em criptoativos”, e que agora é suspeita de ter formado um esquema de pirâmide.  

Ela teria levantado R$ 700 milhões junto a esses investidores. No site, a empresa se apresenta como “uma alternativa para quem quer possibilidades de rentabilidade, baixo risco e simplicidade”. No Instagram, agora com comentários fechados, são só 16 postagens. Numa delas, há a imagem de um barco de luxo com o seguinte texto: “Para mudar sua vida, você precisa mudar suas atitudes”. 

Não há qualquer informação sobre qual é a estratégia de investimento seguida pela companhia, cujo CNPJ existe desde 2015. 

Procurada, a MSK afirma que oferece trade [negociações] de criptoativos, mas não dá mais detalhes porque considera a estratégia propriedade intelectual da empresa. 

No dia 16 de dezembro, clientes da empresa receberam um comunicado anunciando o fim do serviço. Eles deixariam de receber a renda mensal contratada e a restituição do valor investido originalmente ocorreria 50 dias após a assinatura de um distrato, mas de forma parcelada. O documento informava que não havia garantia de restituição completa do valor aportado. 

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No comunicado, a empresa citou dois motivos: crescimento além do “limite operacional” do serviço e a aprovação de um projeto de lei que regulamenta o mercado de criptoativos. Só tem um detalhe: o PL  2303/15 ainda não foi aprovado. O texto, que pretende coibir crimes de estelionato e lavagem de dinheiro com criptomoedas, passou pela Câmara dos Deputados, mas ainda precisa do aval de senadores e da sanção do presidente Jair Bolsonaro para entrar em vigor. 

A MSK afirmou que a suspensão do investimento por causa da lei é uma medida preventiva a eventuais riscos futuros. O ProconSP afirmou que pretende notificar a empresa. A Justiça tem dado liminares destoantes, mas já determinou bloqueio de contas da MSK, a fim de garantir o ressarcimento de clientes.

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A promessa

A Você S/A teve acesso a um modelo de contrato enviado a um potencial cliente. Nele, a MSK se compromete a depositar mensalmente de 2% a 5% do valor investido. Detalhe: o valor não é chamado de lucro e nem de rentabilidade. É um percentual do valor investido e ponto. Com R$ 10 mil, voltam para a conta R$ 200 todo mês; R$ 2.400 ao ano. Com R$ 50 mil investidos, R$ 1.500 mensais. 

Se o investidor considerar que se trata de rentabilidade, a empresa precisaria lucrar R$ 252 milhões por ano (sobre os R$ 700 milhões em custódia) para honrar uma rentabilidade média de 3% ao mês.

Mas não se tratava de um fundo de investimento tradicional. Para entrar, o cliente transferia o dinheiro para uma conta-corrente em nome da MSK (no Itaú, na Caixa ou no Bradesco, conforme o contrato). Em investimentos regulados pela Comissão de Valores Mobiliários, o valor aplicado sempre fica de alguma maneira associado ao CPF do cliente, nunca ao CNPJ da empresa.

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O contrato da MSK previa o seguinte: investidores transferem dinheiro para a conta da empresa, que se encarrega de usar os recursos para comprar e vender criptoativos em busca de lucro. Não há qualquer menção de que o dono do dinheiro receberia o eventual ganho de capital da valorização dos seus ativos no período, como em investimentos tradicionais, e não há histórico de rentabilidade para acompanhar. 

O prazo da dita aplicação era de seis meses, e o contrato poderia ser renovado. Se o investidor pedisse o resgate, a devolução do dinheiro ocorreria em 50 dias. O documento previa ainda que o contrato poderia ser rescindido caso a empresa não conseguisse manter “a taxa de lucro prometida”. Foi esse o argumento usado pela MSK para o distrato.

A MSK afirma que chegou a oferecer contratos com prazos de três meses, e que eles foram suspensos antes, em setembro. 

Esse é o único serviço oferecido pela MSK.

O que é uma pirâmide

Numa pirâmide financeira clássica, o dinheiro não é de fato investido para se multiplicar. O que garante os pagamentos de quem está no esquema é a entrada de novos clientes, que fazem aportes e mantêm a engrenagem girando. 

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Claro, ninguém anuncia “ó, comecei uma pirâmide, me dá um dinheiro aqui”. Sempre há uma promessa de investimento. Bernie Madoff, que chegou a ser diretor da Nasdaq e era conhecido na alta roda de Nova York como um grande filantropo, fez a mesma coisa. Sua firma de investimentos, a Madoff Securities, garantia lucros até modestos, de 10% a 17% ao ano. Mas o que mantinha a roda girando era o dinheiro de novos investidores. No fim, o rombo foi de US$ 50 bilhões. 

É que há um limite para a captação de recursos. Uma hora o dinheiro para de pingar e a engrenagem emperra. A rentabilidade não chega na conta do investidor, e quem tenta sacar não consegue – enfrenta problemas operacionais, por exemplo. Até que todo mundo começa a querer resgatar e o colapso é irreversível.

Antes do caso MSK, outras empresas brasileiras prometeram rentabilidades em investimentos com cripto e desapareceram no ar. Em 2019 houve o caso da Atlas Quantum. Ela prometia lucros de 60% ao ano e teria R$ 4 bilhões em criptos de seus clientes, que há dois anos não conseguem sacar.  

Neste ano, o caso mais simbólico havia sido o do Faraó dos Bitcoins, que prometia ganhos de 10% ao mês com a Gas Consultoria. O suposto líder do esquema, Glaidson Acácio dos Santos, teria movimentado R$ 38 bilhões, segundo investigações. Ele está preso.

A MSK nega que seja um esquema de pirâmide. “De acordo com a própria definição do ilícito, é necessária a entrada constante de capital para pagar aqueles que entraram anteriormente. Durante o início da pandemia da COVID-19, o volume de entradas de clientes caiu drasticamente e, mesmo assim, a empresa continuou a operar. Em outros ciclos de baixa do mercado, continuamos a operar. O nosso cliente não tem a obrigação nenhuma de indicar novos entrantes para receber seus lucros. A empresa nunca fez e  nunca fará campanhas de indicação de amigos ou que conotem que o cliente precisa indicar alguém para ter algum tipo de ganho”, disse a empresa.

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Ainda à Você S/A, a empresa afirmou que o serviço foi suspenso porque a MSK não é capaz de movimentar grandes quantias de dinheiro para continuar a fazer investimentos. Essa é a mesma justificativa usada para parcelar as devoluções dos recursos aos clientes. Transferências de altas quantias podem ser barradas pelos bancos em casos de suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro.

Captação de investidores

A MSK capta clientes por meio de corretores, emulando o esquema das corretoras de valores e seguradoras. Segundo relatos de investidores, eles também afirmam investir em criptos pelos serviços da MSK. Esses agentes são primordialmente corretores de seguros, a profissão de origem dos sócios da MSK, Carlos Eduardo de Lucas e Glaidson Tadeu Rosa. Ambos declaram, em seus perfis no LinkedIn, que foram vinculados à seguradora Prudential. A MSK não diz quantos agentes credenciados tem. A empresa tem 30 funcionários diretos. 

Quando a Você S/A ligou para a sede da MSK, a recepção se identificou como Garra Invest, e não como MSK Invest. Questionada sobre a nova empresa, a MSK afirmou que ela foi criada com o “intuito de distribuir outros produtos, como seguros de vida, por exemplo”. A Garra Invest é registrada no Rio de Janeiro e não tem Carlos Eduardo de Lucas e Glaidson Tadeu Rosa como sócios. 

Os investidores

A Você S/A passou uma semana em um dos grupos de WhatsApp formados por clientes da MSK. Lá eles dividem a angústia da espera pelo dinheiro e as conversas com a empresa e os agentes. No fim, se tornou um grupo de apoio para atravessar a crise. Ao menor sinal de alerta para o risco de que o dinheiro pode não voltar, há uma revolta. Acusa-se a pessoa de tumultuar.

Eles também são críticos dos investidores que foram à Justiça na tentativa de reaver o dinheiro. Na avaliação de parte dos membros do grupo, isso dificulta a atuação da MSK, que estaria trabalhando para fazer os pagamentos.

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E há, sobretudo, um discurso de fé. “Eu sirvo a um Deus de milagres de justiça e não vou pensar em nada que possa ser negativo pra todos nós! Estou em uma corrente de oração porque sei que tem sonhos, objetivos, dinheiro para sobreviver no meio de tudo isso também!”, escreveu uma investidora.

“Realmente eu acredito que tenha tido muito resgate desde de junho e eles não tiveram braço pra conseguir pagar todos com a rentabilidade que prometeram! Só estou orando a Deus que seja esse mesmo o combinado deles porque precisamos acreditar agora nesse momento! Antes de fazer alguma coisa! E não desesperar, pois a situação de muita gente está bem difícil, mas eu creio em um Deus que não falha e vai acabar tudo bem!”, disse outra.

Glaison, um dos sócios da MSK, também tem fé. Desde que a crise começou, ele trocou a foto do seu LinkedIn. No lugar de seu retrato, agora consta a seguinte frase: Agradecer depois do milagre é gratidão. Agradecer antes é fé. Resta saber se seus clientes terão algo a agradecer. 

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