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Conheça a escola para mecânicos que começou como um projeto social

Hoje a Escola do Mecânico é uma franquia com 35 unidades que já formou 40 mil profissionais e conta com o apoio do Nobel da Paz Muhammad Yunus. Conheça a trajetória de Sandra Nalli, a fundadora.

Por Juliana Américo | Design: Caroline Aranha | Fotos: Germano Lürders e divulgação
Atualizado em 6 jun 2022, 08h57 - Publicado em 13 Maio 2022, 06h30
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 (Germano Lürders/VOCÊ S/A)
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Foi aprendendo a dirigir o Fusca vermelho do pai pelas ruas de Mogi Mirim, no interior de São Paulo, que Sandra Nalli se apaixonou pelo mundo dos carros. Na época, ela tinha 14 anos e já trabalhava como menor aprendiz em um centro automotivo da DPaschoal. A sua função era buscar as peças de automóveis no estoque e levar para a mecânica.

Conforme os anos passavam, ela foi atuar na área administrativa e, depois, na de vendas. Mas no final do expediente sempre dava uma passadinha na mecânica, lugar onde se sentia mais à vontade. Quando Sandra estava com 22 anos, a empresa abriu uma vaga para chefe de oficina. “Perguntei para o meu gerente na época se poderia ocupar aquela vaga e eu recebi um sonoro ‘não’. Como uma mulher, loirinha e baixinha estaria à frente de uma oficina mecânica?”

Depois de muito insistir, a liderança liberou que ela assumisse o cargo – desde que passasse por um período de teste e ainda cumprisse algumas tarefas: fazer um curso interno de capacitação em mecânica e, depois, ganhar a confiança dos mecânicos e clientes. Não foi fácil. Logo no seu primeiro dia de treinamento, já ouviu do instrutor um “você entrou na sala errada; a capacitação para assistente administrativo é em outro lugar”. Enfrentar a desconfiança dos clientes também foi um desafio. Alguns não a deixavam chegar perto dos carros.

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(Escola do Mecânico/Divulgação)

Para evitar esse tipo de situação, Sandra criou o hábito de levar um colega homem para ficar ao seu lado, mesmo que ela fosse responsável por todo o atendimento e diagnóstico. Ela também caiu de cabeça nos estudos. “Ficava até mais tarde na oficina tentando aprender, porque qualquer erro que cometesse validaria o discurso de que mulher não tinha competência para fazer isso.” Deu certo. E depois de dois anos no cargo, foi promovida a gerente de um centro automotivo da empresa em Campinas (SP).

Em 2010, ela percebeu que estava cada vez mais difícil contratar mecânicos, faltava mão de obra qualificada. Na época, ela atuava como voluntária na Fundação CASA (a antiga Febem) e teve a ideia de dar aulas básicas de mecânica para os internos. Alguns meses depois, Sandra alugou um espaço comercial para realizar as aulas práticas com os menores que já estavam em liberdade assistida e pediu para um amigo fazer um grafite na parede, escrito “Escola do Mecânico”.

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Ideia de negócio

Sandra ainda não sabia, mas ela tinha acabado de criar a sua própria empresa, sem ter deixado a DPaschoal. Começaram a aparecer pessoas que não eram do programa da Fundação e queriam saber mais sobre o curso de mecânica. “Para mim, aquilo era um projeto social. Eu era apaixonada por ensinar os meninos. Só que, para a minha surpresa, as pessoas queriam comprar o curso. Foi quando eu percebi que dava para empreender.”

Ela vendeu o seu carro, um Ford Ka, por R$ 20 mil e pegou mais R$ 10 mil emprestados com o pai – com o dinheiro, criou um curso de mecânica automotiva e comprou os equipamentos necessários. A empresa Escola do Mecânico nasceu oficialmente em março de 2011. Na época, eram 30 alunos divididos em duas turmas de sábado – Sandra trabalhava em jornada dupla: durante a semana, na DPaschoal, nos dias de folga vestia a camisa de instrutora do curso.

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(Escola do Mecânico/Divulgação)

Em 2014, vinte anos depois de ter começado como jovem aprendiz, ela se despediu da companhia para se dedicar integralmente ao seu próprio negócio. Para expandir, adotou o modelo de franquias. Agora são 35 unidades em nove estados (São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia, Goiás, Minas Gerais e Paraná).

Hoje, são 27 cursos específicos: mecânica de carros de passeio, de caminhões, de motos; alinhamento e balanceamento de suspensão, injeção eletrônica, transmissão automática, gestão de negócios. Ou seja: a Escola também atende profissionais já estabelecidos a fim de adquirir novas habilidades.

Para isso, a empreendedora se mantém atenta às tendências do mercado. “Hoje, os carros possuem muita tecnologia embarcada. Mas quando você olha para o mercado de reparação, está falando do mecânico de bairro, que não sabe fazer a manutenção desses veículos e não consegue acompanhar essa evolução”, afirma. No futuro próximo, ela pretende lançar cursos sobre manutenção de carros híbridos e elétricos.

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No final do ano passado, a Escola do Mecânico recebeu um aporte de R$ 1 milhão da Yunus Negócios Sociais, uma organização fundada por Muhammad Yunus, economista de Bangladesh e vencedor do Nobel da Paz de 2006 – ele foi agraciado com o prêmio justamente por fomentar iniciativas de capacitação.

Parte do valor já foi usado para retomar a Escola do Funileiro – projeto criado em 2019, mas que acabou voltando para a gaveta por causa da pandemia. Por enquanto, só há uma unidade de teste na zona Norte da capital paulista, com 200 alunos e sete cursos de reparos, pintura e inspeção de sinistro. Mas o plano é que todas as unidades da Escola do Mecânico também abriguem uma da Escola do Funileiro.

E os planos de crescimento são ambiciosos: a empreendedora projeta 219 escolas espalhadas pelo Brasil, sendo que 170 devem estar em funcionamento até o final de 2023. Ela também não descarta atravessar a fronteira para abrir unidades em países vizinhos. “O mercado de manutenção nos demais países da América Latina é parecido com o nosso.”

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Impacto social

O restante do investimento do Yunus vai para o que Sandra, hoje com 42 anos, diz ser a sua menina dos olhos: o aplicativo Emprega Mecânico. Só o curso não bastava. Era preciso ajudar os alunos a conseguir emprego. Ainda no começo da empresa, ela pegava aquelas listas telefônicas de páginas amarelas e saía ligando para oficinas mecânicas para perguntar se não estavam precisando de mão de obra. “Já coloquei muito aluno no meu carro e levei eu mesma até as oficinas”, relembra.

O trabalho deixou de ser manual em 2018, quando saiu o app. Ele funciona como uma espécie de LinkedIn que conecta gratuitamente os alunos às oficinas e empresas que estão precisando de mecânicos especializados. A plataforma, de acordo com Sandra, já ajudou a empregar 4 mil pessoas. “A gente investiu muito em tecnologia. Deixamos o aplicativo mais intuitivo e palatável.”

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(Escola do Mecânico/Divulgação)

Sandra também quer atrair mais mulheres para a área e, quem sabe, reduzir o machismo que existe quando o assunto é carros. Na última década, a Escola de Mecânicos já formou mais de 40 mil profissionais, mas só 20% são mulheres. A primeira só foi se matricular em 2014, três anos após a fundação da Escola.

Além de usar a sua própria história como inspiração para aquelas que querem se aventurar no setor automotivo, Sandra também faz questão de promover a equidade no quadro de funcionários. São 720 colaboradores – 50% mulheres. Assim, nenhuma menina ali corre o risco de escutar que está na sala errada.

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