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Vittia (VITT3): o agro é (bio)tech

CEO da Vittia (VITT3) desde 1992, Wilson Romanini apostou na aquisição de empresas de biotecnologia para transformar a companhia em referência na produção de insumos sustentáveis. Veja seus planos para o futuro.

Por Jasmine Olga | Fotos: Divulgação | Design: Kauan Machado
Atualizado em 10 nov 2023, 17h36 - Publicado em 10 nov 2023, 06h03

A distância entre o agronegócio e a Faria Lima está cada vez menor, embora São Paulo não esteja abrindo espaço para plantações de soja nas calçadas (rs). Em 2021, ano dos últimos IPOs na B3, cinco estreantes do setor no mundo do capital aberto tocaram o sino. Uma delas foi a Vittia (VITT3), que atua no setor de biotecnologia e nutrição agrícola (fertilizantes). 

Mesmo assim o agro segue pequeno na bolsa. Na economia, a participação é de grossos 25%. No Ibovespa, o peso fica em 2,9% – sendo que 2% são apenas JBS e BRF.

Para o CEO da Vittia, a importância do setor no mercado de capitais só tende a crescer. “Tudo mudou dentro do agro. Hoje o setor tem uma capacidade gigante de buscar financiamento. Isso mostra que o mercado financeiro abriu os olhos e se desfez de uma visão míope do passado”, aponta Wilson Romanini, em entrevista à Você S/A

No caso da Vittia, a transformação de empresa familiar em uma companhia de capital mais diluído começou em 2014, com a entrada do Brasil Sustentabilidade, um Fundo de Investimento em Participações (FIP) no quadro societário. Hoje, o objetivo é mostrar ao investidor que agronegócio, tecnologia e sustentabilidade (econômica e ambiental) podem andar lado a lado.

A empresa tem o seu foco na produção de insumos biológicos. O intuito é trazer maior performance para as lavouras com o menor impacto para o meio ambiente e para os trabalhadores — substituindo os clássicos produtos químicos. Na Vittia, a produção é feita a partir de extratos de plantas, microrganismos, macrorganismos e outros agentes destinados ao controle de pragas ou nutrição. 

Romanini, que está no comando da companhia desde 1992, conta aqui como a quinquagenária empresa se transformou em referência na produção de fertilizantes e defensivos agrícolas.

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Como foram os primeiros passos da companhia?

Desde a fundação pelo meu pai em 1971 [ainda como Biosoja] até 1998, a Vittia ficou concentrada em um único produto — inoculantes que aumentam a fixação de nitrogênio nas culturas de soja, leguminosas e outras oleaginosas .

Além do apelo ambiental, também há uma importância econômica gigantesca. A soja tem uma necessidade monstruosa de nitrogênio e se nós tivéssemos que fazer essa adubação por meio de fertilizantes nitrogenados, como a ureia e sulfato de amônio, deixaríamos a soja inviável economicamente no Brasil. Com a utilização do Rizóbio [microrganismo que é a base dos inoculantes] conseguimos eliminar esses produtos.

“Investimos R$ 160 mi na expansão da nossa planta, que já era a maior fábrica de biológicos da América Latina.”

Hoje a Vittia tem um portfólio robusto. Como foi esse processo de virada de uma empresa de inoculantes para líder de mercado em diversos segmentos?

Quando comecei minha trajetória na Vittia, ela era uma empresa muito pequena, mas já existia ali um DNA de se transformar. E foi isso que fizemos nos últimos 30 anos.

A virada começou em 1998, quando montamos uma pequena indústria de fertilizantes foliares. Fomos sábios na tomada de posição, já que escolhemos um processo verticalizado — com a produção da matéria-prima e fornecimento de excedentes para outros setores. 

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Na década de 1990, já tínhamos alguns produtos desenvolvidos na parte de biodefensivos, mas não sabíamos como fazer isso chegar ao mercado. Mais para frente, adquirimos a Biovalens. Compramos algo embrionário, mas com um potencial gigante.

Começamos a ver que existia uma capacidade enorme de fazer com que o braço de biodefensivos e produtos biológicos entrassem numa curva ascendente dentro da companhia. Fizemos um investimento audacioso, e hoje temos a maior planta da América Latina em produção de biodefensivos. 

Investimos mais de R$ 20 milhões por ano em pesquisa e desenvolvimento e temos um centro muito robusto, com cerca de 70 profissionais que trabalham com bioprospecção, bioprocesso e avaliação agronômica. Estamos focados em ser realmente a liderança nesse mundo de defensivos. 

Nos últimos quatro anos, 72 produtos Vittia foram desenvolvidos e regulamentados, e nos próximos três anos outros 84 devem entrar na fila para regulamentação. Isso sem falar nos 80 que estão em desenvolvimento e devem chegar ao mercado até 2025. 

Hoje temos uma linha completa de fertilizantes especiais. Temos também braços de organominerais [adubo enriquecido com minerais], fertilizantes biológicos e biodefensivos. Além de reduzir as chances do surgimento de resistência às moléculas químicas tradicionais, a adoção do controle biológico aumenta a produtividade, o equilíbrio do sistema de produção e a otimização nutricional das plantas.

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O agronegócio está concentrado em algumas regiões. Como é a atuação da empresa no país?

A Vittia nasceu no interior de São Paulo, mas hoje temos presença em todo o país — e ainda com grandes lacunas a serem preenchidas. É o nosso grande desafio: estar presente para o produtor brasileiro, levando nossas tecnologias.

Temos uma equipe de desenvolvimento e vendas no país inteiro, além de oito unidades industriais. Três delas ficam em São Joaquim da Barra. As demais, em Serrana, Ituverava e Artur Nogueira, no estado de São Paulo, e em Patos de Minas e Paraopeba, Minas Gerais.

Atuamos com duas vertentes de crescimento — avançar de forma orgânica, mas também de forma inorgânica, por meio de aquisições. Temos um bom planejamento de aquisições e somos bem ativos nisso, com um departamento que está sempre em busca de oportunidades.

Como é essa estratégia de aquisições dentro da companhia?

Não costumamos ir em apenas uma direção. Gostamos daquilo que não parece óbvio. Daquela empresa que tem algo um pouco diferente e que pode até parecer que não faz sentido…

Apesar disso, temos um certo conservadorismo em termos de endividamento. Sempre buscamos oportunidades, mas não vamos fazer uma aquisição que não seja sustentável para o negócio. Sabemos que o mercado gosta e até pede por isso, mas primeiro vamos buscar dar saúde para a Vittia antes de ir atrás de qualquer tipo de compra.

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Nos últimos tempos fizemos cinco aquisições. Temos expertise para incorporar e ter sucesso na integração com a empresa que entra no projeto Vittia. Um M&A, seja pequeno ou não, nunca é fácil. Aqui, gostamos de fazer uma compra e deixar os antigos proprietários na operação, eles são realmente os conhecedores e têm a maestria do negócio.

Qual a importância estratégica dessas aquisições recentes dentro da Vittia?

A Biovalens [especializada na produção de defensivos biológicos], em 2017, foi uma aquisição muito assertiva, mas vou citar outras três: a Vitória Fertilizantes, a JB Biotecnologia, em 2020, e a Agro21, em 2023. 

Nós já tínhamos um braço de fertilizantes organominerais e queríamos ampliar a nossa atuação, por isso a Vitória Fertilizantes. Tínhamos um projeto de ter esse setor de forma mais dinâmica dentro da empresa, mas pegamos anos complicados com macronutrientes em 2021 e 2022 e decidimos pisar um pouco no freio. Queremos entender melhor essa tese para ver se amanhã podemos dar sequência a outros investimentos nesse sentido. 

A JB Biotecnologia se destacava pelo posicionamento forte na produção de macrobiológicos [parasitas e predadores]. Nós já tínhamos um acervo bacana e esse é um mercado revolucionário, com potencial de crescimento muito forte. Na Europa o uso desse tipo de produto já é difundido. Essa aquisição foi na linha de aumentar portfólio e nossa fatia de mercado. Hoje estamos construindo uma fábrica supermoderna para a produção de macrobiológicos, com tecnologia nossa. 

Já a Agro21 tinha ligação muito forte com esse braço de negócios. Porque não adianta você só produzir. É preciso também fazer a aplicação, e percebemos que era importante ter esse serviço dentro da Vittia. A startup é especializada em aplicação aérea via drones. 

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Como vocês enxergam o potencial de crescimento da empresa?

Algumas das nossas linhas de atuação estão mais consolidadas. Apesar de inoculantes estarem no mercado há mais de 50 anos, o seu uso vem crescendo a uma taxa de 10% a 15% ao ano. E ele avança porque o produtor percebeu de forma muito clara que consegue aumentar a sua eficiência com ele. 

Hoje temos uma fatia de 30% de um mercado crescente. O uso do microrganismo Azospirillum vem aumentando em culturas como cana-de-açúcar, pastagens, café e algodão. Esse é um produto que vai crescer muito, em uma taxa de dois dígitos forte por uns bons anos, assim como o mercado de fertilizantes especiais. 

O desenvolvimento de defensivos biológicos com alta tecnologia de formulação teve um crescimento de 249% nos últimos três anos, saltando de um faturamento de R$ 946 milhões em 2019 para R$ 3,3 bi em 2022. A projeção da IHS Market é que o setor alcance R$ 16,9 bilhões em 2030.

Na linha de micros de solo, temos um avanço de 7% a 8% ao ano. Já nos meios defensivos biológicos, essa taxa é muito mais robusta, na casa dos 30%. O que vemos de forma muito clara hoje é que o produtor entendeu que consegue fazer uma substituição do defensivo químico pelo biológico, então temos um potencial gigante de crescimento.

Apesar das perspectivas positivas de crescimento, o início de 2023 foi complicado, com resultados abaixo do esperado. O que explica isso?

Acho que nos últimos três anos tivemos uma euforia muito grande e todo mundo achou que o setor seria a solução de todos os problemas, mas as coisas não são assim. É uma caixinha de surpresas. Viemos de uma pujança muito grande, mas 2022 foi complicado. Apesar dos bons preços das commodities, o custo do produtor foi absurdo tanto na parte de fertilizantes como também em alguns defensivos químicos. 

A conta ficou difícil de fechar e entramos em 2023 com uma problemática complicada. Tivemos uma superprodução e problemas logísticos, levando os preços da soja e do milho a caírem para patamares que não se imaginava. Fora a eleição que deixou o produtor preocupado com o que seria do novo governo. 

Nós estamos em uma ressaca. Mas uma hora ela acaba e as coisas continuam andando. 2023 é um ano difícil. Todas as empresas do setor tiveram um problema sério no primeiro semestre: a falta de venda. O produtor deixou de usar alguns produtos como forma de contenção de despesas. 

No segundo semestre as coisas vão bem, mas não vai ser o suficiente para recuperar os primeiros seis meses. A maior parte dos players do agro vai terminar 2023 muito aquém das expectativas. Isso é um fato. Estamos indo bem no terceiro trimestre e vamos trabalhar no quarto, mas é difícil ter uma reparação do primeiro semestre.

Qual é o olhar da Vittia para o futuro?

A gente trabalha para crescer toda hora. Esse é o primeiro lema do negócio. A Vittia é uma empresa agro e esse é o core dela. E o agro vai continuar crescendo. O Brasil alimenta mais de 1 bilhão de pessoas no mundo. Somos os primeiros em produção de soja, carne, café, suco de laranja, açúcar… Vamos ser os primeiros em tudo. 

Somos uma indústria a céu aberto, em um cenário climático imprevisível, mas existem tecnologias que podem ajudar o produtor. E voltamos àquilo que já disse: adotamos um certo conservadorismo de modo que, se algum problema vier, possamos ter um respaldo maior. 

Para o futuro, temos projetos que buscam mais tecnologia em biofertilizantes,  fertilizantes foliares e na parte dos biodefensivos. Seguiremos buscando oportunidades de aquisição, mas também vamos usar o nosso grande conhecimento na parte de microbiológicos e buscar novos mercados que possam ser interessantes. 

Estamos investindo  R$ 160 milhões na expansão da nossa planta industrial em São Joaquim da Barra. Ela já é a maior fábrica de biológicos da América Latina e, com a conclusão da segunda fase no início deste ano, triplicamos nossa capacidade de produção da fermentação sólida [parte do processo de fabricação de insumos], além de termos uma maior flexibilidade operacional, nos preparando para voar mais alto.  

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