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Conquistando os céus: como é ser piloto de avião

É a carreira dos sonhos para muita gente, mas chegar ao topo da profissão requer um bom investimento e disposição para mudar de ares.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 21 Maio 2021, 13h12 - Publicado em 10 Maio 2021, 19h00
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 (Carlos Pedretti/VOCÊ S/A)
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Suiam Maritê nasceu em Nova Araçá, uma cidadezinha do interior do Rio Grande do Sul com menos de 5 mil habitantes. Seu primeiro contato com a aviação aconteceu ainda na infância, quando a passagem de uma aeronave no céu da cidade se tornava uma atração para a menina, que corria animada para a rua com seu irmão mais novo para observar o voo.

No ensino médio, ela descobriu a profissão ao ler um anúncio sobre as faculdades da região, que incluía o curso de Ciências Aeronáuticas. Suiam comentou com uma amiga, que disse que seu primo estava aprendendo a pilotar. “Eu pensei ‘alguém comum, de família simples do interior, vai ser piloto? Ué, por que eu não posso também?’”, relembra. Foi quando decidiu seguir a carreira.

No começo, enfrentou uma certa resistência – seu pai chegou a dizer que “nunca viu menina ser piloto”. “Tu nunca viu. Mas agora vai ver”, ela respondeu.

E viu. Suiam procurou um aeroclube de uma cidade vizinha para aulas teóricas. “Só que eu olhei e pensei: ‘mas são esses aviõezinhos?’’’, recorda, se referindo aos monomotores do local. “Eu falei: ‘Não, eu quero voar um jato com 150 passageiros.’’’ Mas, como tudo começa do começo, ela seguiu nas aulas – e, aos 18 anos, fez seu primeiro voo solo.

O início para quem quer virar piloto vem um pouco antes, na verdade.

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O caminho das pedras 

O primeiro passo é procurar um aeroclube ou uma escola de aviação reconhecida pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). É lá que você vai ter as aulas necessárias para passar em uma prova teórica da Anac para aspirantes a piloto. Só depois de aprovado nela, dá para sonhar em voar (também dá para estudar por conta própria, se você for o rei do autodidatismo).

Você ainda precisa tirar o CMA – Certificado Médico Aeronáutico. Caso você seja daltônico, tenha problemas cardíacos, pulmonares ou alguma deficiência auditiva, pode não ter o seu.

E agora vem a parte mais complexa: acumular no mínimo 35 horas de voo numa escola de aviação, como fez Suiam. A partir daí, você pode obter a licença de Piloto Privado (PP).

Essa habilitação, porém, não permite o trabalho remunerado. Para isso, é preciso voltar à sala de aula por cerca de três meses e repetir o processo de aprendizado teórico, desta vez de forma mais profunda, e novamente passar pela prova da Anac. Após acumular 150 horas de voo, o piloto pode ser avaliado novamente pela agência para tirar finalmente a licença de Piloto Comercial (PC).

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O processo custa caro, já que o preço da hora de voo (ainda que varie bastante regionalmente) sai por umas boas centenas de reais cada uma. Em média, para ter todas as horas necessárias e cobrir outros custos, você vai desembolsar entre R$ 120 mil e R$ 130 mil, segundo Josué de Andrade, diretor da EJ – Escola de Aeronáutica Civil.

A partir daí, você teoricamente já vai estar habilitado para trabalhar. Mas na prática a teoria é outra: as grandes companhias aéreas exigem mais requisitos para contratar profissionais do manche: inglês avançado, preferência por ensino superior em Ciências Aeronáuticas e uma quantidade maior de horas de voo. Ela varia de empresa para empresa – 200 na Azul, 250 na Gol e 500 na Latam, por exemplo.

Para acumular essas horas todas, é comum iniciar a carreira na área de táxi aéreo ou se tornar instrutor – caminhos que geralmente não exigem horas de voo para além da licença de piloto comercial e permitem o acúmulo de experiência. Vale tudo, na verdade: pilotar avião que puxa faixa na praia, pulverizar plantação… O que interessa é juntar horas. Quanto mais você tiver, melhor para o currículo.

Para as grandes companhias aéreas, o conhecimento técnico na área é, obviamente, indispensável. Mas não é tudo. Essas empresas procuram profissionais com perfil organizado, centrado, e, principalmente, de boa liderança – afinal, o piloto é, por lei, a maior autoridade dentro da aeronave e responsável pela segurança e bem-estar de todos. “Um piloto precisa ter uma liderança para tomar a decisão junto com a equipe. Tem de entender o que se passa sem ser autoritário”, diz Josué.

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(Carlos Pedretti/VOCÊ S/A)

A saga de Suiam 

Depois de tirar sua licença de piloto comercial, Suiam entrou no curso de Ciências Aeronáuticas pela PUC-RS, onde estudou por três anos até se formar em 2006. Nesse ano, a jovem se encontrou naquela situação comum a muitos pilotos: “Eu tinha tudo, menos [uma boa quantidade de] horas de voo”, relembra. Suiam decidiu procurar emprego em táxi aéreo, mas a busca não foi exatamente fácil. “Eu pensei: onde é que mais forma piloto? No Sul e no Sudeste. Então, vou ter que ir para os lugares onde mais tem avião e menos tem piloto. Eu vou para o Norte ou Nordeste.”

Foi enviando currículo para empresas aéreas regionais desses Estados que ela conseguiu uma oferta – em Marabá, um município no interior do Pará. “Quando eu olhei no mapa e percebi que estava indo para um lugar muito longe, caiu a ficha e começou a bater um desespero”, conta.

Mas ela topou o desafio: foram 24 horas só de transporte até chegar a Marabá, onde ficaria por dez meses adquirindo experiência e somando boas horas de voo. Depois, voltou para o Rio Grande do Sul e conseguiu mais um emprego em táxi aéreo. Ficou por seis meses. E voilà: conseguiu experiência suficiente para ser chamada pela Tam (atual Latam) em abril de 2008.

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Suiam construiu sua carreira na empresa. E hoje, 13 anos e 8 mil horas de voo depois, pilota os Airbus A320 da companhia, em linhas nacionais e internacionais. Os A320 levam justamente 150 passageiros – como a jovem sonhava em sua primeira visita ao aeroclube 😉

Quando perguntada sobre sua rotina, ela ri, e brinca que “as únicas coisas certas são as folgas que estão na escala de voos do mês” – afinal, quando se é piloto, não faz sentido falar em rotina diária, e mesmo o planejamento mensal  de voos pode variar dependendo do clima ou de outros contratempos.

Para quem sonha em voar, Suiam tem um conselho especialmente importante para a época em que vivemos: nada de desanimar por causa do esfriamento da área durante a pandemia. “Não é para esperar o ‘momento ideal’. Eu acho que essa é a hora de se preparar: quando está tudo parado e você está começando.”

E é melhor você correr, porque o setor já dá sinais de recuperação. Projeções recentes da Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata) preveem que as companhias conseguirão zerar os prejuízos em 2022, com o avanço das vacinações.

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Suiam ainda é uma exceção em sua área. As mulheres são apenas 3% dos pilotos comerciais, segundo dados de 2020 da Anac. Mas há uma boa notícia: a proporção está crescendo: o número aumentou 64% nos últimos três anos.

Mais: Suiam garante que a presença feminina é muito bem aceita pelos colegas de profissão, com pouco ou nenhum preconceito enfrentado em sua carreira. “Não fiquem presas às crenças que trazemos do passado. É preciso seguir o sonho.” Afinal, essa é uma das poucas profissões em que a expressão “sonhar alto” tem um sentido quase literal.

Agradecimento: Ubiratan dos Santos Rocha, presidente da Associação Brasileira de Pilotos da Aviação Civil (Abrapac). 

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(Arte/VOCÊ S/A)
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