Em posição executiva e mulher? Seja bem-vinda ao Clube das Impostoras
Novo audiolivro da jornalista e influenciadora Rafa Brites traz um conjunto de entrevistas sobre a experiência feminina no mundo – e no trabalho. Confira o bate-papo com a VCSA.
primeira vez que alguém falou sobre o fenômeno do impostor foi em 1978 – quando as psicólogas Pauline Clance e Suzanne Imes cunharam o termo, em uma pesquisa feita pela Universidade da Geórgia.
O estudo examinou cerca de 150 mulheres que tinham grandes títulos acadêmicos, eram profissionais que já atuavam em sua área de trabalho – lembrando, nos anos 1970, era virtualmente impossível encontrá-las na liderança – e estudantes de ensino superior com histórico escolar estrelar.
Isso mesmo: o artigo das pesquisadoras era direcionado, exclusivamente, a mulheres. Mais: mulheres bem-sucedidas. Está no nome: The imposter phenomenon in high achieving women. As psicólogas entenderam que havia uma relação inversamente proporcional de sucesso vs. confiança: quanto mais bem-sucedidas essas mulheres eram, mais impostoras se sentiam.
“Contrariando realizações acadêmicas e profissionais, mulheres que apresentam o fenômeno do impostor insistem em acreditar que elas não são boas o suficiente e que apenas enganam quem pensa o contrário”, escrevem Pauline e Suzanne.
Mais de 46 anos depois, seguro dizer que caminhamos um bocado à frente. Mas para a repórter, apresentadora e influenciadora Rafa Brites, que vem circulando com mais afinco pelo mundo corporativo nos últimos anos, essa estrada está longe de chegar ao fim.
Rafa acredita que o segredo para reverter esse cenário de impostorismo generalizado é por meio de políticas públicas. Mas, enquanto elas não acontecem, há sempre como fazer o que ela faz de melhor: contar histórias. Nesse caso, em formato um pouco diferente.
Em seu novo audiolivro “Clube das Impostoras”, lançado pela Audible no Brasil – como parte de uma série de obras idealizadas, produzidas e editadas 100% por profissionais brasileiros – a jornalista embarca em uma jornada de onze episódios, acompanhada de personalidades femininas célebres. Entre as convidadas, estão Fafá de Belém, Rachel Maia, Tábata Amaral e Suzana Pires.
Em papo com Você S/A, ela nos conta mais sobre o projeto, o público-alvo, e o que espera para que, da próxima vez que você duvidar de si hora de mandar um email ou pedir uma promoção, seja menos severa consigo mesma. E mais: que convença as mulheres à sua volta de fazer o mesmo. Confira.
Qual o objetivo dessa obra? É tentar desmistificar essa síndrome, é falar do tema de maneira despretensiosa…
Toda vez que eu faço um trabalho, mesmo que eu objetivamente saiba que tem pessoas me assistindo, me ouvindo, me acompanhando… minha mente não computa exatamente dessa forma. Do tipo: “Nossa, isso vai mudar o coletivo.”
Tanto na minha época de TV, quanto hoje, no Instagram, eu penso em uma pessoa. Esse é sempre meu objetivo. Por isso, espero que, se eu tiver influenciado positivamente uma mulher na próxima decisão, próximo momento de vulnerabilidade, próximo passo profissional ou pessoal em que ela se depare com a síndrome da impostora, ela possa agir de modo diferente após ter ouvido o audiolivro.
A palavra tem gênero: impostora. Você está falando de mulheres, para mulheres. Por que você decidiu manter esse recorte exclusivamente feminino na obra?
Apesar de entendermos que a síndrome está presente nos dois gêneros, ela é o reflexo interno de um cenário externo. Em termos de proporcionalidade, nós, mulheres, ocupamos menos espaços na economia formal.
E claro, há um empilhamento de questões minoritárias. No audiolivro, eu convido mulheres trans, mulheres pretas, mulheres gordas, uma mulher anã… para conversarmos sobre todas essas vivências.
Quais lições de carreira você acha que uma mulher ouvindo pode tirar do audiolivro?
Não diria lição, e sim reflexão. A primeira reflexão que eu queria gerar era que, muitas vezes, com mulheres que admiramos, temos a sensação de que o caminho que elas trilharam foi muito diferente do nosso. Mulheres como a Fafá de Belém, a Rachel Maia, a Negra Li … você pensa “cara, não é possível que ela não tenha autoconfiança.” O que não é verdade.
No audiolivro, você ouve essas mulheres que passaram por situações difíceis, que já desistiram, mudaram de trajetória… Isso vai fazer com que a próxima vez que você escreva um email, você escreva diferente. Da próxima vez que você chegar em uma reunião e ouvir um comentário desagradável, você vai agir diferente. Mais: quando você ver outras pessoas passando pelo mesmo, do tipo “nossa, minha colega não vai se candidatar para essa vaga porque não se acha boa o suficiente”, você pode ajudá-la a deixar de se sentir dessa forma. Ouvir-lo também pode te dar ferramentas para se posicionar melhor no mundo corporativo.
Ela não é exatamente uma síndrome diagnosticávl de forma tradicional, como depressão, ansiedade, doenças físicas etc. A quem você indicaria a leitura desse livro, então?
Eu diria que é para toda e qualquer mulher. É uma questão de gênero, em algum ponto você vai se identificar.
Se fosse recortar dentro disso, diria principalmente para mulheres que de alguma forma ainda duvidam da sua capacidade. Mulheres que ainda acham que estão algum passo atrás. Não é que a gente não precise se aperfeiçoar – mas, mesmo que isso esteja acontecendo, às vezes sentimos que falta alguma coisa.
A gente criou essa narrativa que é meio uma entrevista, mas também há ficção. Como se você estivesse chegando em um clube mesmo, que tem senha, que é secreto… que é seguro. As nossas convidadas contaram histórias que nunca tinham contado sobre momentos que passaram pela síndrome da impostora.
Por exemplo: a Rachel Maia falando sobre maternidade – quando ela pediu demissão após descobrir a gravidez, porque já não se sentia suficiente para exercer as duas funções. A Negra Li explicando porque ela decidiu sair do RZO, que ela nunca tinha falado em nenhum outro lugar, e por aí vai.
Inclusive, acredito que as mulheres desse mundo são as que mais podem se beneficiar deste audiolivro. Hoje tenho circulado mais nesses espaços e percebo que as coisas estão longe de como deveriam estar.
Você acha que síndrome da impostora tem cura?
A cura é por meio de políticas públicas. Proporcionalidade nas novelas, na TV, na mídia, nas artes, na política – especialmente no Congresso.
Agora, pensando no que poderia remediar, é a gente falando sobre o assunto, estando atenta ao nosso redor para pessoas que podem estar se boicotando e tem esse tipo de sensação.
Acredito que as mulheres do mundo corporativo são as que mais podem se beneficiar deste audiolivro. Hoje tenho circulado mais nesses espaços e percebo que as coisas estão longe de como deveriam estar.
Tem uma dica muito prática que é anotar no papel os sentimentos que estão pairando na nossa mente. Porque a gente é muito ingênuo de achar que os pensamentos são inofensivos . Eles são a forma como a gente se comunica com a gente mesmo. Todo esse imaginário, toda essa criação, ela está circunscrita no que vimos na mídia, nas revistas, na TV, num palanque, numa cadeira de presidência… toda essa construção fica no nosso subconsciente e os nossos pensamentos ficam à mercê disso.
Por isso faço essa recomendação. Para a gente entender as coisas que estamos falando para nós mesmas e nos perguntarmos: eu falaria isso para uma amiga? “Não manda esse email”? “Não se inscreve nesse processo seletivo”? Nunca. E com nós mesmas somos tão severas!
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