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Bem-vindo à era do cliente: um movimento de empresas e profissionais

Experiência do consumidor se torna estratégica para os negócios e aumenta em 183% a demanda por profissionais que atuam na área

Por Paula Lima
Atualizado em 6 jul 2020, 19h59 - Publicado em 21 abr 2020, 08h00

Oferecer bons produtos já não é mais suficiente para deixar o consumidor feliz. Num mercado altamente competitivo e dinâmico, as empresas precisam melhorar cada vez mais o relacionamento com clientes. É dessa necessidade que surge o conceito de customer experience (CX) ou, no bom português, experiência do consumidor.

“CX é o conjunto de sensações e percepções que alguém tem ao fazer qualquer tipo de interação com uma marca”, afirma Claudia Vale, consultora e palestrante de customer experience. “É isso que determina se um cliente se manterá ou não fiel a ela.”

Amadurecidas em países como Estados Unidos, Japão e Inglaterra, as estratégias de  ganharam grande relevância no Brasil nos últimos cinco anos, com a consolidação de serviços como os da Netflix, o surgimento de instituições financeiras como o Nubank e a chegada de aplicativos como os da Uber, fenômenos que mudaram a mentalidade dos clientes.

Hoje, se não estão satisfeitos, eles cancelam assinaturas ou migram para outro fornecedor, visto que o mercado diversificou. “As empresas perceberam que precisavam ter um vínculo maior com os clientes e passaram a tratar o tema como estratégico para os negócios”, diz Claudia.

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Em outras palavras, puseram o cliente no centro de seus planejamentos, envolvendo na causa marketing, atendimento, vendas e logística. “Customer experience só traz resultado quando a companhia adota, de fato, uma cultura centrada no consumidor. Não é um projeto com prazo para terminar, e sim uma visão comercial trabalhada de forma contínua e permanente”, afirma Claudia.

Nesse quesito, empresas 100% digitais, que já nascem orientadas para seus usuários, saem na frente. Fundado em 2018 por executivos do BTG Pactual, o C6 Bank possui 25 empregados no time chamado de HX (human experience). A equipe, que fica sob o guarda-chuva da área de inovação, é dividida em três frentes.

De acordo com Gustavo Torres, líder da área, a primeira frente é composta pelos service designers, profissionais de psicologia, marketing e ciências sociais que realizam pesquisas para investigar o comportamento, as expectativas e as exigências do consumidor; a segunda é a dos product designers, que constroem as jornadas do usuário; e a terceira equipe é a de UX writers, que redigem os diálogos dos chats e elaboram os textos que apresentam produtos do banco.

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Os últimos cargos são ocupados por pessoas de comunicação, principalmente jornalistas. “Nosso time de HX tem uma importância estratégica, pois é ele que facilita processos para os clientes e garante uma comunicação clara e fluida com eles”, diz Gustavo. Taxa de acesso, índices de satisfação e tempo de permanência do usuário no aplicativo são algumas das métricas utilizadas pelas companhias para avaliar o resultado de ações de CX e embasar melhorias.

No C6 Bank, por exemplo, o aplicativo é atualizado a cada 15 dias. Reconhecido pela facilidade na abertura de conta, o app do banco possui um chat automatizado que conduz etapas burocráticas. O processo, sem interação humana, leva cerca de cinco minutos. Em um ano de operação, a instituição conquistou 1 milhão de clientes.

Mercado aquecido

Como trazem resultados rápidos, as equipes voltadas para a experiência de usuários e consumidores só crescem. Uma pesquisa feita pela Gartner, consultoria americana, revelou que 74% dos gestores da área de CX esperam ter um orçamento maior em 2020. Em 2017, esse índice era de 47%. Ou seja, mais dinheiro, mais contratações.

Prova disso é que a procura por UX designers no Brasil subiu 323% de janeiro de 2017 a janeiro de 2020, segundo dados do Indeed, site de empregos que opera em mais de 70 países. Já a busca de candidatos por vagas de CX como um todo cresceu 183% no período.

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Não à toa, um levantamento do LinkedIn apontou a carreira em experiência do cliente como a sexta mais promissora do ano passado. Entre as funções desses profissionais estão desvendar o perfil do consumidor, interpretar dados sobre o público-alvo e propor itens alinhados às expectativas de quem os consome.

Segundo Clarissa Gaiatto, diretora de transformação digital da consultoria de negócios Deloitte, as equipes de trabalho na área costumam ser multidisciplinares, com diferentes formações e habilidades.

Por ser uma novidade dentro das empresas, os recrutadores dão grande importância às soft skills na hora de contratar. Criatividade, capacidade de analisar cenários, empatia para se colocar no lugar do cliente, pensamento estratégico, boa comunicação e habilidade para influenciar os demais setores da organização são características levadas em conta.

Mesmo assim, é essencial conhecer (e estudar) as principais metodologias usadas na área, como CSAT (sigla para customer satisfaction score) e o NPS (sigla para net promoter score). A primeira mensura o nível de satisfação dos consumidores; e a segunda, o grau de lealdade deles. Altas pontuações significam que a marca tem clientes fiéis, que indicam seus produtos e serviços a terceiros e até fazem elogios em redes sociais, algo que vale ouro hoje em dia.

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Na visão de Patrícia Carvalho, diretora de marketing da Revelo, startup de recrutamento, as empresas digitais são as que mais concentram oportunidades. “Boa parte delas busca pessoas que saibam mensurar e interpretar dados em parceria com o time de Analytics”, diz. Os salários começam em 3.000 reais para quem está iniciando na carreira e passam de 10.000 para cargos de liderança.

Ana Cristina Oliveira, de 51 anos, diretora de caring models & processes da Tim, lidera um time de 90 pessoas e é responsável pelas análises de processos e por toda a interface com o cliente em canais digitais, como chat e atendimento eletrônico.

Formada em administração de empresas e em processamento de dados, ela está há 22 anos na empresa de telefonia e acredita que reforçar a área de atendimento ao cliente foi fundamental. “É preciso enxergar com os olhos do cliente. Metodologias são fáceis de aprender, por isso valorizo as habilidades emocionais. Quem quer trabalhar com CX tem de gostar de gente.”

Desde 2015, a experiência do cliente se tornou um dos pilares estratégicos da Tim. Segundo Renato Ciuchini, líder da área de estratégia e transformação e responsável pela gestão de CX, toda a empresa está envolvida na missão de entregar a melhor experiência aos consumidores. “As metas dos nossos funcionários têm indicadores relacionados a esse pilar”, diz o executivo. Para isso, nos últimos três anos, a companhia disponibilizou mais de 11.000 horas de capacitação para disseminar o conhecimento em experiência do cliente.

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Entre outras ações, inseriu o tema na grade de formação de consultores de venda; criou dois treinamentos online sobre CX voltados para 100% dos empregados; realizou palestras, uma delas intitulada “O Jeito Disney de Encantar o Cliente”; e criou uma semana dedicada ao conceito. Em 2019, o aplicativo Meu Tim teve aumento de 18% de usuários únicos, o que impulsionou a queda nas interações de call center em 17%.

As vendas online cresceram 36% no pós-pago e 28% no plano Controle. E o conceito de PDV (ponto de venda) foi transformado em PDX (ponto de experiência). “Nossa ideia é oferecer vivências relacionadas às inovações que a empresa vem fazendo. No ano passado, disponibilizamos em lojas de São Paulo a tecnologia 5G para as pessoas testarem”, diz Renato.

Neander Dornelles, especialista em café da Nespresso, em Curitiba: além de vender cápsulas, ele oferece até masterclasses aos clientes | Foto: Marcelo Almeida (VOCÊ S/A)

Embora os canais digitais assu­mam uma importância cada vez maior, é importante investir na qualidade da interação com o cliente em todos os pontos de contato, incluindo as lojas físicas. Assim, vendedores, gerentes e todos que atuam cara a cara com o público são cada vez mais impactados pela ideia de melhorar a experiência dos compradores. Afinal, se a pessoa for maltratada, dificilmente dará uma segunda chance à marca — o que é um tiro no pé, uma vez que conquistar um novo cliente custa, em média, cinco vezes mais do que manter um atual.

“Antes, os clientes tinham uma atitude passiva. Agora eles ditam as regras de como devemos trabalhar”, afirma Marcos Bogo, gerente de relacionamento com o consumidor da Nespresso, multinacional de cápsulas de café que pertence à suíça Nestlé. Nessa nova lógica, a área liderada por Marcos assumiu o papel fundamental de captar impressões e feedbacks do público e alimentar outros departamentos da companhia, como o de marketing, para que as sugestões de melhoria sejam postas em prática.

Um dos projetos reformulados com base nos anseios dos clientes foi o Nespresso & You. Renovado, o programa de fidelidade da marca passou a dividir os consumidores em três categorias: connoisseur (apreciador), expert (especialista) e ambassador (embaixador). Os benefícios para esse pessoal exigente vão de frete gratuito a aulas especiais sobre tipos de grãos ou drinks com café.

Para isso, a empresa mudou o nome de vendedores para especialistas em café e passou a treiná-los para que conheçam a fundo os produtos. É o caso de Neander ­Dornelles, de 29 anos, coordenador da boutique Nespresso de Curitiba (PR). Há sete anos na companhia, ele foi promovido três vezes, recebeu quatro aumentos de salário e venceu um campeonato interno de degustação às cegas, na Suíça. “Minha missão é atender cada cliente individualmente e dar informações personalizadas. É a qualidade desse relacionamento que irá fidelizá-lo”, diz ele, que também oferece até masterclasses (a mais recente foi sobre cafés gelados) a seus consumidores.


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