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Um feedback para cada dia da semana

Bancos americanos criam novo formato de avaliação que analisa o desempenho dos profissionais diariamente — e isso deve chegar em breve ao Brasil

Por Michele Loureiro
Atualizado em 24 dez 2019, 09h18 - Publicado em 13 jul 2017, 17h00
JP Morgan, nos Estados Unidos: o banco vai implementar, até o final do ano, uma ferramenta que permite aos funcionários dar ou solicitar um feedback formal a qualquer momento (Getty Images/Getty Images)
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Receber e dar feedback é um dos maiores desafios de qualquer profissional. Embora seja algo essencial para o desenvolvimento, ninguém está completamente preparado para ouvir — ou dizer — que algo precisa ser aprimorado. A novidade é que, agora, você precisa estar pronto para enfrentar essa situação todos os dias. Sim, num futuro próximo, a tradicional avaliação de desempenho pode começar a ser diária. O primeiro passo para isso foi dado pelos bancos americanos, conhecidos por irradiar novidades de gestão de pessoas e que já estão adotando esse método.

Em abril, o Goldman Sachs, instituição americana especializada em investimentos, introduziu o novo sistema de avaliação, que foi batizado de 365 por avaliar o universo completo (360 graus) de um profissional nos cinco dias úteis da semana. Um mês antes, o JP Morgan havia comunicado que até o final do ano terá um sistema semelhante, com uma ferramenta que permitirá a todos os colaboradores pedir e dar feedback a qualquer pessoa da organização, a qualquer hora. O que significa que, depois de uma reunião ou de uma conversa no cafezinho, você poderá ser avaliado formalmente. O Morgan Stanley, concorrente dos outros dois bancos, também avisou que tem a intenção de modificar seu sistema de avaliação no curto prazo.

Avaliação 365 na Prática

Todo dia 
Depois de uma reunião, da conclusão de um projeto ou mesmo de uma conversa informal, todos os colaboradores podem fazer avaliações ou pedir feedback aos demais envolvidos na atividade relacionada, sejam eles gestores, pares, fornecedores ou clientes.

Como fazer
Os feedbacks devem ser breves e inseridos numa plataforma específica, que pode ser acessada de computadores ou por aplicativos de celular.

O que acontece
Todos os dados ficam arquivados e formam uma linha de performance do profissional, que tem a chance de corrigir problemas de forma mais rápida.

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Além disso
Os dados obtidos são analisados por programas de people analytics, ferramenta de Big Data, e usados pelas empresas para tomar decisões estratégicas.

Fonte: Goldman Sachs

As instituições prometem que o processo será transparente: todos saberão quem está dando o feedback — a exceção ocorre em casos sensíveis, quando envolve questões pessoais que possam comprometer o desempenho. Nesses casos, há a opção de passar a avaliação para o supervisor do colaborador para que o chefe torne o feedback anônimo. Para facilitar esse ambiente de avaliações instantâneas, os bancos disponibilizarão aplicativos de celular. Além de fazer parte da avaliação, as informações trocadas entre os funcionários servirão de banco de dados para as organizações — e alimentarão o famigerado big data para ajudar na tomada de decisões estratégicas. Outra vertente pede que a performance de cada profissional seja automaticamente registrada sem precisar da avaliação de um superior, o que diminuiria a subjetividade do processo.

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Adeus às notas
Além da mudança na periodicidade, o novo formato deverá eliminar de vez as temidas notas numéricas, que serão substituídas por adjetivos como “oportunidade de melhora” e “ponto forte”. A ideia é deixar claro que o processo visa ao progresso do funcionário e ao estímulo de mais conversas cara a cara entre gerentes e subordinados. Segundo os especialistas de RH dos bancos americanos, as mudanças no formato de avaliação atendem a uma demanda dos próprios empregados, que recebem bônus de acordo com o desempenho e querem corrigir os rumos rapidamente em busca de maior remuneração. Mas é importante lembrar que, pelo menos num primeiro momento, a estrutura tradicional de avaliações 360 graus será mantida, ainda que reduzida: em vez da média de 15 opiniões por empregado, a meta será de seis.

Ainda é difícil afirmar quando o movimento chegará por aqui, mas deve ser no curto prazo. Desde a década de 70, tendências observadas nos bancos americanos acabam desembarcando no Brasil. O Goldman Sachs, por exemplo, foi uma das grandes influências de Jorge Paulo Lemann para construir a cultura do Banco Garantia, que inspirou a da Ambev e se espalhou por boa parte das companhias brasileiras. Segundo Isis Borge, gerente de divisão da consultoria Robert Half, de São Paulo, por aqui já existem empresas de tecnologia pensando nesse tipo de avaliação, e parte delas pretende colocá-la em prática até o final do ano. “Como é algo novo, a metodologia ainda encontra algumas barreiras, como a necessidade de investir em uma estrutura interna e criar processos que sejam efetivos”, afirma.

É bem verdade que nem a avaliação 360 graus é realidade em todas as organizações ainda e que muitas enfrentam dificuldades para executar o modelo — e, consequentemente, não estão maduras para o processo da 365. Por isso, a probabilidade é que alguns setores saiam na frente com o novo formato, que faz mais sentido nos setores financeiro, farmacêutico, de tecnologia e telecomunicações. “É um formato que funciona bem com os millenials, já que eles costumam precisar de mais reafirmações e feedbacks que indiquem se estão no caminho certo”, diz Alexandre Benedetti, diretor das divisões de finanças e tributário, jurídico e RH da Talenses, consultoria de recrutamento, de São Paulo.

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Obstáculos
Esse tipo de avaliação não funciona para todas as áreas. No setor de pesquisa e desenvolvimento de uma empresa do setor farmacêutico, por exemplo, em que o trabalho de um profissional pode levar cerca de dez anos para ter algum resultado, seria difícil avaliá-lo com precisão todos os dias. A mesma dificuldade ocorre numa empresa com grande estrutura, em que um diretor coordena 100 pessoas, pois seria difícil atender a uma grande demanda de feedbacks constantes. Ou então em companhias familiares ou menores, que ainda não contam com um sistema formal de avaliação de desempenho estruturado.
Fica claro que essa forma de avaliação será interessante e positiva apenas se ambas as partes, gestor e colaborador, tiverem maturidade, interesse e abertura para dialogar sobre seus desempenhos diariamente. “É preciso uma mudança cultural para que o feedback vá além de conversas cotidianas. Do contrário, pode se transformar num meio para resolver pequenos conflitos”, afirma André Ribeiro, consultor de carreira na Produtive, de São Paulo.

Outra questão que pode ser levantada com base no novo modelo é o tempo gasto para avaliar. “Esse processo tem de estar completamente alinhado à cultura da organização para não virar um ladrão de tempo nas empresas”, diz Marcelo Leite, especialista em recursos humanos, de São Paulo. No Goldman Sachs, a consultoria Deloitte contabilizou que o processo de avaliação de desempenho toma, em média, 28 horas de trabalho por empregado a cada ano e a estimativa total é de 2 milhões de horas anuais para a empresa como um todo. Com as avaliações diárias, a expectativa é que o tempo seja usado de outra forma — ainda que não se reduza. A ideia é que a avaliação seja feita durante as conversas naturais da hora do café, por exemplo, em vez de ser um evento formal no calendário dos empregados.

Mais estressante?
Embora não fique sempre claro, todas as companhias que oferecem um processo de avaliação de desempenho, seja ele qual for, analisam os profissionais constantemente — mesmo que a avaliação seja anual ou semestral, o empregado passará o ano todo sendo avaliado, mas só receberá o feedback uma ou duas vezes ao ano. “A diferença da avaliação 365 é que permite mais agilidade nas respostas a cada situação”, diz Alexandre, da Talenses.

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A possibilidade de ser formalmente avaliado em tempo integral pode gerar desconforto, mas ao longo do processo isso pode ser amenizado com a chance de evoluir com mais rapidez. Para Isis, da Robert Half, os impactos na rotina são poucos, pois o intuito da avaliação 365 é ser prática e não exigir muito tempo durante o processo. “Se a pessoa não estiver aberta a receber feed­backs, esse momento pode ser estressante. Mas o funcionário que busca melhoria contínua com certeza vai agregar informações importantes à sua vida”, afirma.

Ainda não é possível determinar se a avaliação 365 será usada no mercado de trabalho em larga escala, mas é fato que a possibilidade de corrigir a rota — e ter isso documentado — pode ser um trunfo para gestores e funcionários em tempos de alta competitividade. Agora, é se preparar psicologicamente para ser observado (e ranqueado) o tempo todo.

 

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