Continua após publicidade

Economista larga vida corporativa para criar projeto ambiental

Depois de mais de 30 anos na PwC, Nélio Weiss passou a se dedicar ao plantio de árvores nativas e reinserção de pássaros na natureza

Por Por Elisa Tozzi
Atualizado em 17 dez 2019, 15h20 - Publicado em 20 jun 2016, 10h01

O carioca Nélio Weiss, de 58 anos, teve uma trajetória longa no mundo corporativo. Formado em economia pela Uerj, ele sempre trabalhou em consultorias. Ainda no início da carreira, entrou na Arthur Andersen, depois, foi para a PwC – onde se tornou sócio da área internacional. Mas, após mais de 30 anos de história nos negócios, começou a questionar o seu legado. O que deixaria para os filhos e para a sociedade? 

Do desconforto surgiu a ideia de reflorestar o terreno que tinha comprado em Aiuroca, em Minas Gerais, a 400 quilômetros de Belo Horizonte, totalmente desmatado. As plantas começaram a atrair pássaros e Nélio entrou em outro projeto, o de reinserção de aves nativas na natureza. 

Com a preocupação ambiental aguçada, o executivo decidiu sair da PwC para se dedicar aos 18 hectares de reflorestamento e a uma nova atividade: o cultivo de oliveiras e a fabricação e venda de azeites, que ajudarão financeiramente o projeto. Em entrevista a VOCÊ S/A, Nélio conta como fez sua transição de carreira (e de vida) e por que é mais feliz hoje. 

Por que, depois de tantos anos de carreira em consultoria, decidiu se dedicar a um trabalho ambiental? 

Continua após a publicidade

Chegou um momento na minha vida em que comecei a me questionar sobre o que eu estava fazendo. Tinha uma carreira bem consolidada no mercado corporativo, fui sócio da PwC na área internacional, mas queria deixar alguma coisa maior. Fiquei pensando: quando eu for embora, o que vai ficar? Essa reflexão veio também com a leitura do livro Em Busca de Sentido, de Viktor Frankl (Editora Vozes, 50 reais), que me fez perguntar: “Qual o sentido da minha vida, que legado eu quero deixar para os meus filhos e para a sociedade?” Eu queria ser um profissional competente, mas isso eu já tinha conquistado. Queria outras coisas. Aí tudo começou a se encaixar. 

Estava cansado do mundo corporativo? 

Sim, eu vivia em um ambiente que não tinha mais a ver comigo. Trabalhei com consultoria por 36 anos, fiz isso muito bem e tive muitas oportunidades – fiz pós na Insead, na Suíça, estudei planejamento estratégico em Harvard. A vida toda, desde que comecei a carreira, em 1979, me dediquei a clientes internacionais e cheguei relativamente cedo ao que dizem ser o topo. Quando tinha uns 40 anos, comecei a pensar: estou satisfeito com minha careira, mas é isso que quero para o meu futuro? 

Continua após a publicidade

Não era mais o que você almejava? 

Não. Eu queria ter tempo e, no mundo corporativo, as coisas caminham para uma atenção constante ao trabalho, para a conexão total e contínua. Ficava incomodado de entrar nessa onda. A grande descoberta, quando antecipei minha aposentadoria e passei a me dedicar à natureza, foi que, quanto mais tempo mental disponível você tem, mais feliz você é. Se a pessoa passa o dia todo presa ao celular, não tem tempo para nada. Ainda tenho um pé nos negócios, pois abri uma consultoria. Mas é bem mais leve, é mais um jeito de passar minha experiência para outros profissionais.

 

Continua após a publicidade

Como o projeto com a natureza se estruturou? 

Foi progressivo. Primeiro, em 1999, comprei um terreno-padrão, de 3 hectares, em Aiuruoca (Minas Gerais) e minha ideia era aproveitar os 3 hectares só para fazer uma casa de campo. Mas aí quis reflorestar o local com árvores nativas – não havia nenhuma vegetação, porque tudo tinha sido queimado para fazer pasto. Então selecionei um pedaço de terra para cultivar árvores e fui aprendendo aos trambolhões. Pesquisei e conversei com muita gente para entender quais eram as melhores árvores, o jeito correto do plantio. Conforme aquilo tomava corpo, eu via o valor intrínseco do que eu estava fazendo. E tudo começou a acontecer: com as árvores, surgiram pássaros e, em 2007, o projeto de reinserção das aves na natureza – uma parceria minha com o Ibama para reabilitar aves apreendidas e, depois, soltá-las. Passei a comprar terrenos vizinhos, reflorestei 18 hectares e ajudei mais de 3 000 pássaros. 

E de onde vem o dinheiro? 

Continua após a publicidade

Muito é investimento pessoal, eu tenho uma segurança financeira. Só que agora estou com um novo projeto para ajudar a viabilizar o programa: venda de azeite e adoção de oliveiras. Em 2011, fiquei sabendo que uma pessoa plantava essas árvores na cidade, me interessei e fui pesquisar. Descobri que as oliveiras se dão muito bem no tipo de solo que temos ali e é uma cultura que não atrai pássaros. Então não prejudica o sistema. Já iniciei a plantação e, no ano que vem, vamos vender a primeira produção de azeites, batizados de Olibi – que significa óleo da terra. Além disso, as pessoas podem adotar uma oliveira: contribuindo com 180 reais ao ano, elas ganham garrafas da produção. 

Como foi a transição do ponto de vista familiar? 

Desde que comecei a me questionar, compartilhava com a minha esposa as dúvidas sobre estar ou não na direção correta. Ela é diretora de RH e sempre falamos sobre esses assuntos. Quando decidi sair da PwC ela e meus filhos me apoiaram muito. Havia muitas questões que me incomodavam no ambiente corporativo, como a ganância, a ambição, a ânsia pelo poder acima de qualquer coisa. Foi uma decisão corajosa, claro, afinal eu abri mão de algo seguro e garantido, que sabia fazer muito bem. Mas eu estava cansado, não dava mais.  No fim, sair era uma opção entre a saúde e a doença. Vi muita gente morrendo aos 50 anos por causa de pressão, de trabalho. Eu não queria mais viver em um ambiente que poderia me matar. 

Continua após a publicidade

Qual é a sua rotina hoje? 

Moro em São Paulo e costumo ir para Minas Gerais duas vezes por mês, mais ou menos, para ver como estão as coisas por lá. Uma equipe me ajuda a cuidar das oliveiras, dos pássaros e das outras árvores, mas gosto de estar perto. Em um dia comum, tenho a manhã livre para levar minha filha caçula à escola e ir ao clube, por exemplo. Isso me deixa feliz, porque estou vendo de perto o crescimento dela – o que não fiz com meus dois filhos mais velhos, hoje já casados. Ao mesmo tempo, concilio o trabalho de consultor. Encontrei meu equilíbrio. 

Esta matéria foi publicada originalmente na edição 214 da revista Você S/A com o título “Voo livre”

Você S/A | Edição 214 | Maio de 2016 

Assine

Publicidade