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Agronegócio continua em alta e segue contratando profissionais qualificados

Setor é um dos poucos a manter o crescimento no atual período de vacas magras

Por Por Bruno Vieira Feijó
Atualizado em 17 dez 2019, 15h20 - Publicado em 27 jun 2016, 14h01

Pelo menos duas vezes por mês, o engenheiro Johannes Castellano, de 48 anos, diretor de RH da Adama, uma das maiores fabricantes mundiais de fungicidas e herbicidas, abandona o escritório administrativo, em Londrina, no Paraná, e vai perambular por fazendas pelo interior do país. Para a missão, troca ternos e sapatos por calça jeans e botina. Em meados de abril, seu destino foi Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso. Na ocasião, ele carregava a tiracolo o diretor financeiro da empresa. Johannes é um dos novos contratados da companhia, que pretende, até 2018, ampliar seu quadro de funcionários em 30%. Hoje, são 550 colaboradores no país, distribuídos entre as unidades industriais de Londrina, Taquari (RS) e 17 regionais de vendas. 

Depois de 25 anos dando expediente em empresas aéreas e indústrias automobilísticas, a mudança recente de Johannes para o agronegócio, que ocorreu em maio de 2015, é significativa por duas grandes razões. A primeira é que, em tempos de crise acentuada, o setor é um dos poucos a gerar boas notícias. As últimas estimativas apontam que o Brasil deverá colher uma safra recorde no período 2015/2016: 210,5 milhões de toneladas de grãos. 

No ano passado, o PIB da agricultura cresceu 2%, enquanto a indústria caiu 6% e os serviços, 3%. Não à toa, o clima era de certo otimismo (moderado, claro) na Agrishow, maior feira de tecnologia agrícola, realizada no mês passado em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, apesar do recuo no preço das commodities. A segunda razão é consequência da primeira. O saldo de empregos com carteira assinada também foi positivo. Com o bom momento, as empresas precisam recrutar pessoas de todas as áreas e setores. Uma pesquisa recente da consultoria Asap, de São Paulo, mostra a força com que outros setores passaram a ceder profissionais ao agronegócio. Calcula-se que somente bens de consumo, automação e indústria automotiva responderam por 53% das migrações.

Novos ares 

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Muitas vezes, a oportunidade aparece mesmo para quem nunca pensou em atuar no meio rural. É o caso do engenheiro Pedro Alves, de 35 anos, de Porto Alegre, que veio do setor da construção civil. Até meados de 2015, ele trabalhava numa grande construtora, responsável por levantar obras como arenas de futebol e parques fabris para montadoras de veículos. 

“A partir de 2013, fui ficando preocupado com o meu desenvolvimento profissional, pois começava a ficar claro que o setor vivia uma bolha”, diz Pedro. “O país não comportava tantas obras faraônicas, estádios e uma dezena de novas montadoras de carros vindo para cá ao mesmo tempo.” No ano passado, ao tomar conhecimento de um processo seletivo da multinacional norueguesa Yara, decidiu pesquisar o setor a fundo e se inscreveu. Deu certo.  

Pedro entrou na empresa há oito meses, como gerente de produção. Já foi promovido uma vez e agora é gerente sênior de planejamento. Sua função é ajudar a Yara, fabricante de fertilizantes e nutrientes, a estruturar processos e fazer análises de desempenho financeiro e viabilidade comercial. “Tive segurança para mudar de setor porque as matrizes das multinacionais de agro encaram o Brasil como protagonista. Fica mais fácil trazer investimentos para cá”, diz Pedro. 

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O profissional dá o exemplo da própria Yara, na qual o presidente brasileiro é o único não europeu que acumula assento no board da matriz e se reporta ao CEO global. O grupo emprega no país 4 000 funcionários e prevê contratar mais 1 000 pessoas para a unidade de Rio Grande (RS) até 2020, onde investirá 1 bilhão de reais para duplicar a fabricação e a capacidade de mistura de fertilizantes. “Quem vem de outro setor precisa entender que na agroindústria viver a experiência do cliente não é tão fácil, uma vez que na maioria das vezes nós não somos consumidores finais dos produtos que oferecemos”, diz Carlos Lienstadt, diretor de RH da Yara. “Isso nos demanda um esforço maior para entender o mercado e as necessidades dos clientes.”

Enquanto as multinacionais ampliam seus investimentos, companhias brasileiras como a Amaggi (uma das maiores produtoras de soja, pertencente à família do senador mato-grossense Blairo Maggi) e a Bom Futuro (comandada pelo empresário Eraí Scheffer, também do Mato Grosso) estão profissionalizando sua operação. “Queremos profissionais com ambição para nos ensinar a estabelecer processos modernos de controle e gestão”, diz Nereu Bavaresco, diretor de recursos humanos da Amaggi. 

Mas é preciso se embrenhar na mata e sujar a botina. Para descobrir se um candidato a uma vaga leva jeito para a coisa, Nereu aplica uma espécie de test-drive: um dia no campo. “Dá para detectar vários comportamentos durante o passeio com o profissional, como quando ele pisa na terra, frequenta a cantina onde estão os peões e descansa no alojamento”, diz. Mesmo para quem pretende trabalhar nas sedes, em Cuiabá e Rondonópolis, a empresa oferece passagens e uma semana de hospedagem para o executivo e toda a família para que avaliem se vão se adaptar à nova vida.

Campo moderno 

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Não faz muito tempo, existia nos meios urbanos a figura estereotipada do produtor rural jeca-tatu, sem instrução, conservador e avesso a novidades. Nada mais distante da realidade. O fenomenal desempenho do campo é resultado direto de um constante esforço de modernização levado a cabo nas últimas quatro décadas. 

As melhorias genéticas em sementes e a introdução de boas práticas de manejo aumentaram as colheitas. Os investimentos em fertilizantes corrigiram a acidez do solo, abrindo novas fronteiras agrícolas. E a produtividade subiu enormemente com a aquisição de colheitadeiras e tratores de última geração. Quer dizer, o campo não é mais lugar para o trabalho manual. “Há uma carência de mão de obra especializada, não só para a administração”, diz Nereu. “Precisamos de motoristas para dirigir caminhões modernos, operadores de máquinas agrícolas, tratoristas, mecânicos e até eletricistas.”

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As possibilidades de carreira no agronegócio são tantas que até profissionais que haviam feito contato com o setor no passado têm feito o caminho da mudança. É o caso do economista Pedro Valente, de 51 anos, anos, atual diretor-geral da Amaggi Agro, unidade composta de 14 fazendas do grupo, que somam 223,4 mil hectares destinados ao cultivo de soja, milho e algodão. 

Pedro foi criado numa fazenda da família em Jaú, no interior paulista. Depois de formado, trabalhou na área comercial de multinacionais de autopeças e no setor têxtil. Em seguida, foi para bancos, e passou por BBA (atual Itaú BBA), ABC e Bradesco, onde cuidava da conta de grandes clientes como usinas de cana-de-açúcar, cooperativas de commodities agrícolas, além da própria Amaggi. Em 2004, recebeu um convite para administrar as fazendas do Grupo. “Meu desafio foi descobrir que não existiam softwares que consolidavam todos os dados gerenciais das lavouras”, diz Pedro. 

O executivo liderou, então, um projeto de implantação de sistemas. Hoje, os dados de evolução da planta, de acordo com o período de plantio, a exposição ao sol ou à chuva e a resistência às doenças, são enviados do campo por GPS para avaliação dos agrônomos e para abastecer um banco de dados acessado por todos os funcionários que rastreiam a produção de grãos. No início deste ano, com a safra quase concluída, a Amaggi registrou recorde de produtividade na colheita de soja – média de 60 sacas por hectare. Foi uma surpresa para a própria empresa, pois algumas propriedades sofreram perdas com a estiagem.

A expansão do agronegócio brasileiro começa a atrair também a atenção de jovens executivos, que enxergam no setor um campo ideal para crescer. O engenheiro agrônomo Márcio Fernandez, de 28 anos, entrou em 2011 na paulista CGG (Cantagalo General Grains) por meio de um programa de novos talentos. A companhia atua na produção, comercialização e logística de commodities agrícolas e tem entre seus acionistas a Coteminas, maior indústria têxtil do país. 

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Há dois anos, Márcio abandonou de vez a cidade natal, no interior de São Paulo, para assumir a gerência de uma das fazendas da CGG em Brasnorte, cidade do Mato Grosso distante 500 quilômetros da capital, Cuiabá. Lá, está sob a sua responsabilidade uma equipe de 150 pessoas. “Enquanto estive na sede, pude ajudar a criar indicadores e metas de desempenho baseadas na filosofia da gestão de qualidade”, diz Márcio. “Isso me credenciou, em pouco tempo, para gerenciar uma das principais filiais da empresa, onde cultivamos milho, soja e algodão.” 

Se nenhuma grande catástrofe acontecer, nada indica que o dinamismo do setor vai arrefecer nos próximos anos. “Profissionais qualificados dispostos a sair dos grandes centros em busca de trabalho e crescimento de carreira certamente têm oportunidades”, diz Renato Ferreira, diretor de operações e gente da CGG. O modelo de inserção do Brasil na economia global passa, sem dúvida, pelo agronegócio. 

“Os fazendeiros brasileiros vêm tirando, ano a ano, parte da vantagem produtiva americana. Na soja, já somos mais eficientes”, afirma José Luís Tejon, coordenador da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), que criou uma pós-graduação em gestão do agronegócio. “À medida que a administração das fazendas evoluir e os investimentos em tecnologia forem feitos, é natural que outras culturas avancem, como milho, trigo, feijão, arroz e a produção de carne.” 

Esta matéria foi publicada originalmente na edição 214 da revista Você S/A com o título “Porteiras abertas”

Você S/A | Edição 214 | Maio de 2016 

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