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A jornada da poupadora: conheça os caminhos de Nathalia Arcuri

Antes de ser a maior influenciadora de finanças pessoais do país, a criadora do Me poupe! penou para aprender a investir – e até perdeu dinheiro.

Por Monique Lima | Ilustração: Yasmin Yauni | Design: Laís Zanocco
Atualizado em 23 fev 2021, 11h36 - Publicado em 8 fev 2021, 06h00

Nathalia Arcuri, 35 anos, só compra roupas duas vezes por ano. Gastos supérfluos dão urticária na criadora do Me poupe!. Seu prazer é ver o dinheiro gerar mais dinheiro. E não é de hoje. Desde criança, a diva dos poupadores é assim. Seus conselhos refletem sua própria vida. Por isso, e pela habilidade de traduzir conceitos financeiros com bom humor e um carisma único, ela angariou tantos fãs. O Me Poupe!, que nasceu como um blog há cinco anos e era produzido somente pela Nathalia, hoje é uma empresa com mais de 40 funcionários e faturamento anual de mais de R$ 20 milhões.

Além da produção de conteúdo para os 5,7 milhões de inscritos em seu canal do YouTube, a marca vende cursos on-line e produziu um reality show que foi transmitido em TV aberta no final de 2020. Nessa mesma época, Nath lançou seu segundo livro, o Guia Prático Me Poupe!, pela editora Sextante. Se for pelo mesmo caminho do primeiro, será um best-seller. O Me Poupe! 10 Passos para Nunca Mais Faltar Dinheiro no Seu Bolso ultrapassou a marca de 400 mil cópias vendidas.

Nesta entrevista à Você S/A, a influenciadora conta um pouco da sua trajetória, fala da concorrência em sua área e, claro, sobre como começar a poupar.


Como surgiu seu interesse por finanças pessoais?
Desde cedo percebi algumas coisas na minha própria casa. Nunca tivemos uma educação financeira propriamente dita. Funcionava mais como educação de restrição: não pode, não tem, não vai. A questão do dinheiro sempre foi muito aberta lá em casa, mas no sentido de não termos dinheiro. Minha mãe cuidava da casa e meu pai sustentava financeiramente. Era uma ansiedade constante contar somente com o emprego do meu pai. “O que a gente vai fazer se ele ficar desempregado?”

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Com uns oito anos, descobri que uma amiga da escola tinha poupança para comprar um carro quando fizesse 18. Fiquei encantada e perguntei para os meus pais se eu tinha também. Mas não tinha, claro. E assim começou minha história com finanças pessoais. A base para o método que uso hoje e ensino nos vídeos surgiu daí, que é relacionar seus sonhos e desejos com um plano de execução financeira. Na época, eu pensava que queria um carro com 18 anos, mas hoje eu sei que se tratava muito mais da liberdade de ter o dinheiro para o que eu quisesse.

E você criou um plano financeiro aos oito anos?
Criei. Mas só quando eu tinha 14 anos que ele entrou em ação. Comecei a trabalhar com figuração em comerciais e o dinheirinho que ganhava, eu só guardava. Já naquela época eu tinha uma mentalidade diferente das meninas da minha idade. Por exemplo, nunca entendi como as pessoas compram roupas e sapatos só por lazer. Sempre achei um estorvo. Até hoje eu só faço essas compras duas vezes por ano e é porque eu preciso para o trabalho e outras situações profissionais. Para mim, comprar roupa não é e nunca foi lazer. E, por pensar assim, consegui guardar dinheiro suficiente para minha primeira aplicação.

Como foi esse primeiro investimento?
É uma pena que eu não tenha descoberto o mundo dos investimentos antes. Todo o tempo em que juntei dinheiro quando era criança foi colocando em um cofrinho e fechando com chave. Eu era tão poupadora em casa que também servia de caixa-forte para a família. Minha mãe pegava emprestado comigo sempre que precisava, e eu anotava tudo para saber quanto tinha que receber de volta.

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Quando abri minha primeira conta no banco, foi que me apresentaram ao mundo dos investimentos. Logo de primeira quis aplicar meu dinheiro em um fundo de investimentos, porque me falaram que rendia mais. Coloquei quase tudo o que eu tinha ali. Em seis meses perdi metade do meu dinheiro. Depois dessa, coloquei o restante em uma previdência privada e por muito tempo o dinheiro ficou lá. Em 2010, comecei a investigar mais a fundo esse universo de renda fixa, e depois fui abrindo o leque para outras formas de renda e pensamento em longo prazo.

Quando as pessoas passaram a te procurar para pedir conselhos financeiros?
Sempre tive hábitos muito distintos. A maioria das pessoas me julgava muquirana, mão de vaca, pão-dura. Mas com 25 anos eu já tinha um apartamento próprio e um carro. Isso também era fora do comum e gerava curiosidade. Então algumas pessoas começaram a pedir conselhos e queriam entender como uma repórter com 25 anos já tinha uma estrutura de vida [Nathalia trabalhava
na Record].

Foi assim que comecei a ajudar os mais próximos, mas achando tudo muito estranho desde o começo. Na minha cabeça eu pensava “como assim você não negocia o seu salário?”. Não acreditava em nada do que as pessoas contavam porque achava que o que eu fazia era muito óbvio. Mas não. Então me dei conta de que talvez eles precisassem mesmo de ajuda com dinheiro. Comecei a perguntar mais coisas e entender que eu era muito diferente. Meu estilo de vida já me proporcionava liberdade, tranquilidade, viagens sem dívidas, e era o que eu vendia para as pessoas quando elas me pediam ajuda. “Se fizer dessa forma, pode ter tudo isso também”.

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Quando percebeu que isso poderia ser uma carreira?
O estalo veio depois de duas situações. A primeira foi com a minha diarista, lá por 2012. Ela me contou que comprou um tênis para a filha que custava algo em torno de R$ 600, mas esse era o valor que eu pagava para ela por mês. “Como ela gastou isso em um tênis?”, eu me perguntava. Então comecei a pesquisar o que levava as pessoas a ter esse comportamento. Conforme fui entendendo mais sobre questões emocionais ligadas ao consumo, uma ideia surgiu na minha mente.

Na época, eu estava empregada no Hoje em Dia [um jornal da Record] e resolvi arriscar e oferecer a tal ideia: criar um reality show para transformar gastadores em investidores. Meu editor gostou, mas ofereceu a apresentação do reality para outra pessoa. Na hora, não entendi nada, depois eu soube que esse apresentador tinha uma especialização em economia. Foi então que eu resolvi me especializar.

Como foi trocar uma carreira segura na TV para ser youtuber de finanças, algo que mal existia na época?
Sofri muito preconceito no começo. Os mais catedráticos torciam bastante o nariz e diziam que eu não tinha credibilidade, que meu conteúdo era divertido demais para um assunto sério como economia. Mas a questão é que eu nunca fiz conteúdo para quem sabe. O que eu fiz e faço é para quem não sabe.

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Eu mesma tive dificuldade para aprender no começo pela barreira linguística. A forma de falar sobre finanças era muito difícil e eu tinha que me esforçar muito para entender. Aí pensava “se eu que quero aprender tenho essa dificuldade, imagina quem não quer”. Foi aí que criei esse jeito mais divertido de falar sobre o assunto e abri a porteira em 2015. Ninguém fazia isso. Ninguém falava de finanças desconstruindo esse universo. E assim não é chato, não é difícil, acontece que ninguém havia tido vontade ou coragem até então.

Mas hoje há conteúdos sobre investimentos e finanças pessoais por todos os lados. A concorrência te preocupa?
Não, porque eu acredito na consistência de conteúdo. É o que me proporciona estar onde estou e a minha empresa estar onde está. Apesar de várias pessoas surgirem, elas vão embora e o Me Poupe! continua.

O que me preocupa mais é a noção de responsabilidade de quem entra. Existe o risco dessas pessoas descredibilizarem quem faz um bom trabalho. Nesse mundo é fácil jogar todos dentro de uma caixinha e dizer que é tudo igual, mas não é. Sabemos que a população é influenciada pelo meio. É importante empoderar as pessoas, dar acesso a informações relevantes para que elas tomem suas próprias decisões e façam seus julgamentos, não dar uma solução fácil, seja para investimento, voto ou mesmo cancelamento de alguém. Nosso papel é ajudar na criação de consciência, para além da tomada de decisão financeira. Não é só com dinheiro, engloba tudo.

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Ter pessoas novas e boas é bom, democratiza ainda mais o assunto. Falar com população de baixa renda, por exemplo, é algo que eu não conseguiria alcançar. Transformar finanças em mainstream é o que eu sempre quis. Nunca tive a intenção de ter um monopólio.

Recentemente você lançou seu segundo livro, o Guia Prático Me Poupe!. Ele foi idealizado em 2020 para ajudar no momento de crise?
Na verdade, o guia demorou um ano e meio para ser finalizado e teve o lançamento postergado por causa da Covid-19. Mas a ideia inicial se aplica muito bem para o que estamos vivendo agora. Minha intenção sempre foi a de criar algo prático pensando no cotidiano das pessoas. Essa ideia veio depois do primeiro reality show que fizemos e os fãs se apaixonaram pelo método e me mandavam mensagens dizendo que queriam participar de uma próxima edição.

Eu não posso fazer um reality com milhões de brasileiros, então criei o guia. Peguei a metodologia do programa e transformei em um livro com 33 dias de tarefas práticas e comentários como se eu estivesse ali, cobrando, incentivando, exigindo as anotações e acompanhando de perto. Isso é para ninguém ficar no meio do caminho, e sim chegar até o fim.

Qual a maior dificuldade das pessoas que começam a poupar e investir, mas param no meio do caminho?
As pessoas precisam entender que a jornada do investidor é um meio, não é dinheiro por dinheiro, envolve uma mudança de visão: deixar de ser escravo da sua condição financeira para fazer o seu dinheiro trabalhar por você. E isso tudo é um processo muito positivo. Dá trabalho? Dá, mas vale a pena. Tem que pensar que são vitórias diárias.

Para quem se preocupa antes de começar, ou já desistiu em tentativas anteriores, a dica é buscar pessoas que tenham esse objetivo em comum. Porque vai ser difícil mesmo, vai dar ódio de poupar, vai dar vontade de desistir, mas, se parar no meio do caminho, a vida não vai mudar. Se quiser mudar de verdade, tem que continuar até chegar ao objetivo que se propôs quando começou o processo da jornada de investidor. Tem que colocar na balança a vida como é hoje – a vida do brasileiro é péssima – e a vida tranquila que se ambiciona.

E qual é a melhor dica para 2021?
A primeira coisa é tentar olhar para a vida antes da crise, antes do coronavírus. Se qualquer um olhar para a vida financeira durante a crise, não vai entender seus hábitos porque o momento é extremo. Tem que se perguntar o quanto essa onda te pegou.

É comum culpar agentes externos, mas isso inviabiliza qualquer possibilidade de resolução. A solução para qualquer problema financeiro tem que vir de você. Tem que colocar a mão na consciência e entender que, se antes você não fez sua parte, o momento é agora. Quem tem uma fonte de renda, quem manteve o emprego, está em uma situação de privilégio, porque o que vemos é a maior taxa de desemprego dos últimos anos. As pessoas precisam entender isso também e fazer o melhor possível com os recursos que têm.

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