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Conheça as startups que estão mudando a cara do RH

Em 2021, as empresas de tecnologia voltadas para a área de recursos humanos receberam US$ 1,35 bilhão em investimentos. Conheça algumas, e veja como elas estão transformando a relação entre companhias e funcionários.

Por Juliana Américo | Ilustração: Vitor Tritto Domingos de Oliveira | Design: Tiago Araujo | Edição: Alexandre Versignassi
11 fev 2022, 05h40

Por muito tempo, o RH foi visto como uma área burocrática que só servia para cuidar da contratação e demissão de funcionários. Isso acabou. Ao longo do século 21, o setor passou a ser considerado um braço estratégico para a atração de talentos, a melhora na produtividade e o reforço da cultura organizacional.

Mais recentemente, o setor ganhou uma força extra: as Human Resources Techs, startups que usam tecnologia para automatizar processos que ocupam muito tempo da equipe de recursos humanos, como triagem de currículos, distribuição de holerites e o envio de informações fiscais, previdenciárias e trabalhistas para o governo.

“Essas empresas derrubam de vez a burocracia da área e garantem mais agilidade e confiabilidade no trato das informações. O grande benefício é que o profissional de RH agora está voltado para atividades mais nobres, como o desenvolvimento de pessoas”, afirma Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH Brasil).

A aceleradora de startups Distrito estima que existam, pelo menos, 356 HR Techs no Brasil – só nos primeiros nove meses de 2021, elas receberam US$ 1,35 bilhão em aportes. E as soluções já se estendem por todas as atividades do setor, como veremos agora.

Atração e seleção

De acordo com os dados da Distrito, uma em cada quatro HR Techs estão envolvidas com processos seletivos e bancos de talentos. Natural: os departamentos de recursos humanos recebem tanto currículo que não têm como analisar todos, o que acaba jogando talentos na lata do lixo.

A startup Taqe utiliza análise de dados e gamificação para selecionar os candidatos que mais combinam com a empresa que estiver contratando. Na plataforma, criada em 2017, o RH cadastra a vaga e seleciona quais são as habilidades e os critérios importantes para o cargo, a cultura da empresa e suas políticas de diversidade.

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“A partir daí, o sistema cria uma trilha de testes gamificados que vão determinar o perfil comportamental e as competências de cada candidato. Então, o nosso algoritmo faz uma triagem, eliminando as pessoas que não atendem aos requisitos mínimos e ordenando as demais com as que têm um match maior com a empresa”, afirma Renato Dias, CEO da Taqe.

Segundo Renato, a plataforma reduz o tempo do processo de recrutamento e seleção em 60% a 70%. Foi o que aconteceu com o Hospital Albert Einstein, que reduziu a procura por profissionais para recepção de 21 dias para oito. Entre outras companhias que já utilizaram a Taqe, estão Natura, Grupo Fleury, Santander e Coca-Cola.

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(Vitor Tritto Domingos de Oliveira/VOCÊ S/A)

Coordenando as equipes

Lidar com pessoas é lidar com desejos e frustrações. Um exemplo de algo que costuma gerar ambos os sentimentos é o pacote de benefícios. Há os funcionários que abririam mão do vale-transporte em troca de um plano de saúde mais robusto. Outros prefeririam levar comida de casa e usar os recursos que a empresa gasta com vale-refeição em um curso de inglês. Equilibrar todas essas vontades é o objetivo da Flash Benefícios.

Criada em 2018, a startup permite o gerenciamento de benefícios flexíveis. Ou seja, o próprio funcionário escolhe o que quer receber e controla os valores. “Não precisa mais ficar perguntando se a pessoa vai trabalhar de carro ou de ônibus. O sistema tira a burocracia da área e deixa espaço para que os profissionais de RH assumam uma posição mais estratégica”, afirma o CEO, Ricardo Salem.

No sistema da Flash, a empresa configura o nível de flexibilidade, qual é o pacote de benefícios e os valores máximos e mínimos para cada item, levando em conta a legislação e acordos trabalhistas. Por exemplo, o vale-transporte faz parte da CLT e o seu valor depende da distância percorrida pelo funcionário. Mas a empresa pode disponibilizar, no lugar do VT, R$ 200 em estacionamento e vale-combustível para quem vai de carro. Quem tem essa opção pode determinar se quer usar tudo em um único desconto ou se pretende dividir o valor entre os dois.

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Os últimos dois anos foram um salto para a startup. Afinal, os RHs precisaram rever todo o programa de benefícios para encaixar os auxílios para home office, como ajuda de custos com internet. No ano passado, a Flash conseguiu arrecadar US$ 22 milhões em uma rodada de investimentos, e o número de funcionários passou de 36 para 280.

Outra tarefa que deixa as equipes de RH de cabelos brancos é a organização de escalas. Normalmente, quem cuida disso é o líder de cada área. Mas a galera de gestão de pessoas precisa acompanhar o processo para garantir que os tempos de trabalho e de folga estão de acordo com a legislação. O problema é que as escalas costumam ser discutidas no boca a boca mesmo, sem um sistema centralizado.

Foi pensando nisso que surgiu a Escala. A empresa nasceu em 2019, dentro do Laboratório de Inovação do Hospital Israelita Albert Einstein. “Eu estava participando de uma atividade no hospital para identificar problemas que poderiam ser solucionados. Foi quando eu vi uma folha de papel toda rabiscada com a escala dos funcionários e me surpreendi com um lugar todo tecnológico usando isso para organizar quem vai trabalhar no dia”, relembra Vinicius Lima, CEO da startup.

Vinicius desenvolveu uma ferramenta digital, que pode ser usada via aplicativo, para montar as escalas. O gestor cria os horários e os funcionários são notificados; eles podem pedir alterações pelo próprio sistema e a grade horária é atualizada.

O RH tem acesso a todas essas informações – e pode gerar relatórios para checar quem ainda não conseguiu folgas relativas a feriados e contabilizar horas extras. Também dá para configurar o sistema de acordo com regras trabalhistas e acordos sindicais. Se um funcionário for escalado para um dia em que deveria estar descansando, o RH é avisado.

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Durante a pandemia, o Escala ganhou uma nova ferramenta: a de organização dos espaços de trabalho. Com a adoção de jornadas híbridas, a startup percebeu que as companhias clientes estavam utilizando a ferramenta para determinar como ficaria o rodízio de funcionários nos escritórios. Então, lançaram uma função só para isso. Dá para salvar a planta do escritório, enumerar mesas e reservar espaços de modo que pessoas de uma mesma área fiquem próximas umas das outras.]

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(Tiago Araujo/VOCÊ S/A)

Outra startup que aposta na automação para tirar do caminho as atividades manuais é a Convenia, que fechou o ano de 2021 com um faturamento de R$ 20 milhões e 3 mil clientes.

A empresa, fundada em 2013, desenvolveu uma plataforma para o controle de folha de pagamento, distribuição de holerite e aprovação de férias em um único lugar. Tudo pela nuvem, para que a equipe possa acessar as informações de qualquer lugar e acabe de vez com a papelada. O RH também passa a ter acesso rápido a indicadores importantes, como o número de faltas injustificadas.

O diferencial é que a plataforma é uma API aberta. Ou seja, é possível integrar outros sistemas ali, como programas de ponto, recrutamento e avaliações. “As integrações são uma evolução importante para as HR Techs, porque deixam o departamento de pessoas menos engessado. Ele contrata e conecta as soluções de que precisa para o momento pelo qual a empresa está passando”, diz Marcelo Furtado, CEO da Convenia.

RH automatizado

A tecnologia não existe só para quebrar o gesso burocrático do RH. Ela também pode ajudar nas funções mais sutis: aprimorar a cultura da empresa e o engajamento dos funcionários.

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Em 2010, o estatístico Alessandro Garcia e a historiadora Mônica Hauck criaram a Sólides, que hoje conta com 10 mil clientes. Essa HR Tech aposta em people analytics, que é o uso de dados para examinar o perfil e o comportamento dos profissionais.

Eles desenvolveram um software para pesquisas de clima, avaliações de desempenho, reuniões de feedback, planos de sucessão e treinamentos. Ou seja, tudo que envolve o desenvolvimento do funcionário e as suas impressões sobre a companhia. Com base nessas informações, o sistema cria um perfil comportamental de cada empregado e identifica incompatibilidades entre líderes e liderados.

“Nossa inteligência artificial consegue identificar quais são as práticas que vão melhorar a cultura da empresa. Ela pode indicar se está na hora de aplicar uma pesquisa de clima ou um treinamento, de acordo com a rotina das equipes”, afirma Mônica.

Durante a pandemia, a Sólides lançou um aplicativo para os RHs manterem a comunicação com os funcionários que estão trabalhando em home office. Por ali, é possível dar avisos, disponibilizar documentos, criar planos de desenvolvimento individual e realizar as pesquisas.

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(Vitor Tritto Domingos de Oliveira/VOCÊ S/A)

Hora de dar tchau

Assim como o processo de seleção, o desligamento de funcionários também demanda braço para liberar toda a documentação. Por experiência própria, a advogada Fernanda Medei sabe que o processo pode ser cheio de surpresas: “Em 2011, fui demitida e a empresa levou 120 dias para fazer a homologação por causa de erros no sistema do RH. Quando finalmente deu certo, já era o último dia para pedir o seguro desemprego.”

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Então ela teve a ideia de criar a Medei, uma startup para auxiliar nos processos de demissão. Quando um funcionário é desligado, a Medei recebe o contrato de trabalho, as informações sobre acordos sindicais e verifica se está tudo certo. Depois, a equipe de Fernanda realiza uma reunião com a pessoa que foi demitida para explicar sobre os direitos trabalhistas, verbas rescisórias, exame demissional, descontos, extensão de benefícios e a quantia que será recebida.

Todas essas informações e documentação ficam disponíveis em uma plataforma própria, que também notifica o funcionário desligado sobre os próximos passos que ele deve tomar. Outras áreas da companhia, como o jurídico e o financeiro, têm acesso ao sistema para casos de processos trabalhistas e dar baixa nos valores que precisam ser pagos, por exemplo.

“Usamos também uma inteligência artificial que identifica se a papelada está legível, com todas as assinaturas e se falta algum documento”, diz Fernanda. Hoje, 95% dos processos realizados pela empresa são totalmente remotos. Só em 2021, a Medei realizou 40 mil homologações, e faturou R$ 6 milhões.

O que não falta é espaço para as HR Techs atuarem. Mas Paulo Sardinha, da ABRH Brasil, lembra algo fundamental: a tecnologia não pode substituir tudo quando o assunto é gestão de pessoas. “Se você cria uma startup de RH, tem que pensar que ela vai trazer agilidade. As informações, números e algoritmos ajudam nas tomadas de decisão. Mas você também deve preservar a avaliação humana.” Humanos, afinal, são mais do que recursos.

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