Guia de escrita: aprenda a se comunicar melhor
O livro Brevidade Inteligente oferece um passo a passo de como se expressar com mais clareza e concisão – seja em e-mails, mensagens de texto ou artigos.
Em 1946, George Orwell publicou um ensaio argumentando que a linguagem escrita estava em decadência. Em “A política e a língua inglesa”, o escritor britânico disse que a comunicação política na Inglaterra era intencionalmente prolixa e confusa, feita para despistar os leitores dos erros e abusos cometidos pelos políticos da época.
Por imitação, toda a linguagem escrita teria se tornado esteticamente desagradável e vazia. A cura seria identificar e eliminar os maus hábitos na confecção dos textos – como repetir clichês e metáforas sem compreender seus verdadeiros significados, ou rechear as frases com palavras que não adicionam novas ideias ao texto.
Tempos depois, outros nomes influentes da literatura fizeram coro à voz de Orwell, como o psicólogo e linguista Steven Pinker e o ficcionista Stephen King. Para todos eles, é preciso combater a ideia de que falar bem é falar difícil.
Pelo contrário. Um bom texto é aquele que consegue transmitir as ideias do autor com facilidade. Quanto mais simples, melhor: uma escrita limpa deixa claro que o autor domina o assunto, enquanto uma grafia poluída dá a impressão de que o texto tenta compensar a falta de conteúdo com palavras difíceis.
Em Brevidade Inteligente, os cofundadores da Axios, uma agência de notícias dos EUA, dão um passo a passo de como se expressar com mais clareza e concisão – seja em e-mails corporativos, mensagens de texto ou artigos de opinião.
No capítulo que reproduzimos aqui, os autores falam sobre a etapa zero de uma comunicação bem sucedida: definir e compreender o seu público-alvo.
Capítulo 4 – O público em primeiro lugar
As palavras iniciais do nosso manifesto são as mais importantes e também podem ajudar você: o público vem em primeiro lugar.
Por que isso é importante: Se você pensar em servir ao seu público em primeiro lugar – colegas, alunos, clientes, amigos –, não ao seu ego, naturalmente vai reduzir o desperdício de palavras.
Pode parecer simples, mas é onde a maioria das pessoas sai dos trilhos. Tendemos a pensar muito sobre o que queremos dizer e pouco sobre o que os outros precisam ouvir.
O santo padre concorda: Em setembro de 2021, o papa Francisco pediu aos padres católicos na Eslováquia que reduzissem as homilias de 40 para 10 minutos para evitar que as pessoas perdessem o interesse. “Foram as freiras as que mais aplaudiram a ideia, porque são as vítimas dos nossos sermões”, brincou.
O papa fez o que você deveria fazer: começar qualquer comunicação pensando primeiro no seu público específico e naquilo que ele quer ou de que precisa.
Imagine a pessoa com quem você está tentando se comunicar. É fácil se for uma única pessoa, mas, se for um grupo, concentre-se em um indivíduo específico, um nome, um rosto, um cargo.
Faça sempre isso antes de começar a falar ou escrever. Se você tentar atingir todo mundo, provavelmente não vai atingir ninguém. Definir a pessoa que você quer alcançar dá mais nitidez à comunicação.
Uma coisa certa de cada vez
(…)
Jim estava sentado no banco da igreja enquanto o pastor David Glade falava sobre como é difícil ser bom. Ele contou que, diante do caos e dos desafios da vida, seus filhos sempre lhe perguntavam como é possível escolher a atitude certa em cada situação.
O pastor Glade queria reduzir essa grande questão existencial a algo mais digerível. Ele ofereceu a seus filhos 12 palavras de sabedoria que acabaram moldando a forma como [nós, da Axios] vivemos hoje: “Tudo que você pode fazer é uma coisa certa de cada vez”.
Pense em como essa frase é simples, direta e memorável. O pastor Glade poderia ter tagarelado, citado a Bíblia, feito poesia em hebraico ou despejado toda a sabedoria de C. S. Lewis, ou até tê-la aprimorado.
O pastor Glade acertou em cheio a lição mais importante da comunicação moderna: o curto, o inteligente, o simples e o direto abrem caminho e permanecem.
Em uma carta para sua congregação em outubro de 2021, Glade citou The Elements of Style, de William Strunk: “A escrita vigorosa é concisa. Uma frase não deve conter palavras desnecessárias, um parágrafo não deve conter frases desnecessárias, pela mesma razão que um desenho não deve ter linhas desnecessárias e uma máquina não deve ter peças desnecessárias”.
É o oposto do que vemos na TV, onde os canais muitas vezes tentam atingir o público mais amplo possível mirando no telespectador menos informado. Com isso, simplificam o conteúdo e entopem o telespectador de generalidades.
Não faça isso. Pelo contrário, imagine uma pessoa inteligente, ocupada e curiosa no centro do grande círculo em que você está mirando. Uma pessoa de verdade com um trabalho de verdade e necessidades reais. Essa pessoa deve ser alguém interessado no seu assunto e com probabilidade de se engajar.
O que você oferecer vai ajudar a distinguir entre o que essa pessoa já sabe e o que pode ser novo, revelador e empolgante. Também vai definir sua voz e seus dados, bem como sua forma de explicar a ela por que o seu conteúdo é importante.
Sua mensagem vai ecoar quando os leitores perceberem e apreciarem o respeito demonstrado pelo tempo e pela inteligência deles.
A segunda etapa da Brevidade Inteligente, igualmente importante, é adaptar sua mensagem ao leitor-alvo. Você só vai dominar essa técnica quando souber o que deseja que a pessoa lembre, especificamente – e encontrar uma forma breve, vívida e memorável de expressar isso.
Faça um teste: peça a um amigo que leia algo que você acabou de escrever ou leia alguns parágrafos para ele. Em seguida, peça que ele resuma a grande ideia que você estava tentando transmitir. Requer humildade, mas é muito útil.
Assim você vai descobrir que a maneira mais fácil de transmitir o que está tentando dizer é… apenas dizer. Então pare. Seu amigo será capaz de articular seu ponto-chave quase que literalmente.
Poderíamos terminar todos os capítulos deste livro com “Então pare!”. Escondemos nossas ideias sob um monte de palavras desnecessárias. (…) Levamos as pessoas a deduzir o que estamos tentando dizer em vez de apenas dizer. Não seja extravagante – seja eficaz.
Por que isso é importante: Você será um comunicador muito melhor quando aprender a lapidar seus pensamentos, a expressá-los com impacto e parar de desperdiçar palavras e tempo.
Tendemos a nos comunicar de modo egoísta. Quando nos sentamos para escrever, levantamos para falar em público ou apertamos o botão para fazer uma gravação, pensamos no que queremos dizer, não no que os outros desejariam e deveriam ouvir. Inverta esse raciocínio.
Veja este pedido de desculpas: “Sinto muito por ter dito aquilo, mas veja o que eu estava pensando… e o que você fez antes me magoou e me obrigou a dizer essas coisas desagradáveis…”
Melhor: “Sinto muito pelo que eu falei”.
Viu como um pedido de desculpas claro se perde em meio a palavras desnecessárias?
Covardes se escondem atrás de palavras.
Leve isso para o trabalho ou para a sala de aula. A ocasião em que mais disfarçamos, distorcemos e desviamos nossos verdadeiros sentimentos é quando damos e recebemos feedback. Poucas pessoas têm confiança suficiente para ser diretas. Nossa tendência é fazer rodeios diante de conversas difíceis mas necessárias.
“Você faz tantas coisas tão bem e eu sei que tenho meus defeitos, e a vida é difícil e imprevisível, mas eu preciso de verdade que você se empenhe um pouco mais nos projetos. Se continuar tendo problemas de dedicação, vou ter que considerar um plano de desempenho.”
Melhor: “Há um ponto que você precisa melhorar com urgência: se dedicar mais às suas tarefas principais.”
(…)
Dicas e truques
1- Concentre-se em UMA pessoa com quem quer se comunicar.
2- Determine UMA coisa que você quer que ela memorize.
Quando Mike era novato no jornalismo, um repórter experiente, Michael Hardy, costumava criticar o trabalho da concorrência dizendo: “Primeiro pense, depois escreva!”
Michael estava sendo sarcástico, mas é um bom conselho. (A propósito, também funciona na hora de falar.) Se você não tem certeza do que quer comunicar, a chance de o destinatário entender é zero.
3- Escreva como um ser humano, para seres humanos.
Seja simples, claro, direto. Seja fluente. Autenticidade e familiaridade são ingredientes essenciais. Ajudam as pessoas a se abrir para ouvir e memorizar o que você disse.
Para Mike, sua newsletter, a Axios AM, é como uma conversa matinal com um amigo inteligente e curioso.
Quando estamos frente a frente, recebemos pistas não verbais que nos impedem de ser chatos. Inconscientemente, pensamos: “Quero que você goste de mim”. Por isso não somos repetitivos. Não usamos palavras complicadas. Não contamos às pessoas o que elas já sabem. Não explicamos o óbvio.
No entanto, quando estamos diante do teclado, fazemos todas essas coisas.
Eis o truque: Converse com alguém (ou com você mesmo – ninguém vai ficar sabendo) sobre o assunto que você quer apresentar.
Esse assunto vai ficar mais claro, mais interessante e mais atraente do que qualquer coisa em que pensaria caso se sentasse para “escrever”.
4- Em seguida, escreva.
Escreva aquela única coisa que você deseja que o leitor, espectador ou ouvinte memorize. Escreva isso antes de qualquer outro ponto.
Em seguida, tente encurtar a mensagem para menos de uma dúzia de palavras – menos é mais. Deve ser uma frase afirmativa ou uma informação, não uma pergunta. Certifique-se de que essas palavras transmitam uma novidade ou uma informação essencial. Dispense as palavras fracas e exclua verbos ou adjetivos supérfluos.
5- Então pare.
Se não sabemos de fato o que queremos dizer – ou, o mais provável, se não entendemos de verdade sobre o que estamos escrevendo –, disfarçamos falando demais.
Fazemos a mesma coisa quando terminamos um relacionamento, pedimos aumento, confessamos um erro. Não paramos de falar. É da natureza humana. E isso acaba com os relacionamentos – e com a comunicação. Então pare.
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