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Guia dos Dividendos

Alexandre Versignassi, autor da coluna, é jornalista, diretor de redação da Você S/A e autor do livro "Crash – Uma Breve História da Economia".
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Dividendos em dólar: as 65 ações que pagam melhor – e há mais tempo

Conheça o Dividend Aristocrats, o clube das melhores pagadoras de proventos do mercado americano. E veja como investir nelas daqui mesmo.

Por Alexandre Versignassi
Atualizado em 18 out 2021, 13h18 - Publicado em 14 out 2021, 21h55
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 (Felipe Mayerle/VOCÊ S/A)
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Consolidated Edison, AbbVie, Amcor. Uma empresa de energia elétrica, uma farmacêutica e uma fábrica de embalagens. Três companhias com duas coisas em comum: são praticamente desconhecidas por aqui e fazem parte de um clube especial: o dos Dividends Aristocrats.

Trata-se de um índice compilado pela S&P que mapeia as melhores pagadoras de dividendos dos EUA. Há 65 ali hoje. Para fazer parte dele, a companhia deve ter pagado dividendos nos últimos 25 anos. Mais do que isso: o valor desses dividendos precisa ter aumentado consistentemente, todo ano. Se alguma delas falha nessa tarefa, tchau: vai ter de esperar 25 anos para ver se consegue entrar de novo.

A companhia também precisa ser sólida: deve fazer parte do S&P 500, o listão das 500 maiores empresas de capital aberto dos EUA. O Dividend Aristocrats, então, também é cheio de nomes que qualquer criança conhece: McDonald’s, Coca-Cola, Johnson & Johnson, 3M…

O que não tem ali são justamente as queridonas do noticiário financeiro. Google, Amazon, Facebook, Tesla. Elas jamais pagaram uma pataca de dividendo – e nem pretendem fazê-lo tão cedo.

Faz sentido. Elas preferem reinvestir tudo o que entra. Para uma empresa que pretende crescer até adquirir o tamanho da galáxia de Andrômeda, não há mesmo grandes razões para distribuir lucros. Cada dólar investido de volta hoje pode virar dois dólares no balanço do ano que vem, afinal.

A discussão sobre pagar ou não dividendos praticamente não existe no Brasil. É que, por aqui, as empresas são obrigadas por lei a pagar alguma quantia aos acionistas caso deem lucro. A maioria distribui pelo menos 25%. Por causa do seguinte: quando o governo baixou essa norma, em 1976, disse que quem quisesse pagar menos até podia, mas precisaria comprar de volta os papéis dos acionistas que não gostassem da ideia. Como nenhuma quis lidar com esse empecilho, ficou a tradição de pagar no mínimo 25%. Às vezes bem mais.

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7%: Este é o dividend yield da AT&T, que paga religiosamente US$ 0,52 por ação a cada trimestre, faça chuva ou faça sol – os proventos da operadora de telefonia são corrigidos pela inflação do dólar. (Felipe Mayerle/VOCÊ S/A)

A Vale, por exemplo, lucrou R$ 70 bilhões no primeiro semestre de 2021. E resolveu distribuir 57% (R$ 40 bilhões). A mineradora é dividida em 4,8 bilhões de ações, então isso deu R$ 8,19 por papel. Quando o pagamento aconteceu, em setembro, o preço das ações estava por volta de R$ 85. Nisso, tivemos um dividend yield (rendimento em dividendos) de 9,6% – um montão: a média das 91 ações do Ibovespa nesse quesito é de 3,8% hoje.

Quem administra a Vale entendeu que não faria sentido reinvestir todo o lucro. Que era hora de remunerar os sócios. E isso também faz todo o sentido. Por uma razão, inclusive, filosófica: por que uma ação existe? Para conceder ao portador uma parcela dos lucros da empresa. Nada mais.

Claro: você pode comprar por um preço hoje e vender mais caro no futuro. O que torna uma ação mais cara é justamente o crescimento do lucro da empresa. Mas, se você jamais vai ver uma centelha desse lucro, a ação não serve para nada. Essa é a encruzilhada filosófica.

Warren Buffett ajuda a explicar. Ele entende que sua companhia, a Berkshire Hathaway, é a melhor máquina do mundo na tarefa de transformar dinheiro em mais dinheiro. Logo, não distribui nada. Reinveste tudo. Mesmo assim, ele já disse que isso é “algo que não pode continuar indefinidamente”.

Mas trata-se de uma questão mais filosófica do que prática. A real é que o mercado gosta de ver empresas lucrativas que teimam em distribuir zero. A ideia por trás disso é a seguinte: no dia em que Buffett começar a pagar dividendos, significa que ele não sabe mais o que fazer com o dinheiro. Seria um sinal de que a Berkshire chegou ao fim da linha.

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É o que acontece, de certa forma, com a indústria tabagista. Trata-se de um mercado terrivelmente lucrativo, mas que (ainda bem) está em declínio. Com cada vez menos fumantes no mundo, não há para onde crescer. Então o melhor a fazer é distribuir entre os acionistas o que entra. A Philip Morris, por exemplo, está entre as maiores pagadoras de dividendos dos EUA, com 5% – ainda que não faça parte do clube das Aristocrats.

A indústria do petróleo passa por uma situação parecida. Num grau bem menor, mas passa. O consumo de petróleo segue crescendo. Mas a tendência para o longo prazo é de queda na demanda. Não faz sentido hoje para uma petroleira investir bilhões em projetos para daqui a duas ou três décadas. Com isso, elas têm pagado dividendos fortes. Exxon e Chevron, as duas maiores petroleiras dos EUA, estão com yields de, respectivamente, 5% e 6%.

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As petroleiras, hoje, tendem a investir menos dos seus lucros – e a distribuir mais na forma de dividendos. É o mesmo caminho que a indústria tabagista já tinha tomado. Motivo: a falta de perspectivas para o longo prazo. (Felipe Mayerle/VOCÊ S/A)

Mas, claro, o ato de distribuir dividendos não é um certificado de obsolescência. Não faltam empresas saudáveis, mas que pagam bem porque não têm tanto para onde crescer: Coca-Cola, grandes bancos, geradoras de energia… Elas investem relativamente pouco e, há décadas, distribuem muito. São aquilo que o mercado chama de “vacas leiteiras”. Mesmo a Apple, que cresce mais do que suas pares do mundo big tech e ainda parece ter um horizonte ilimitado, passou a pagar dividendos – e o faz regularmente desde 2012. O yield é baixo (0,60%), mas existe.

Para os padrões brasileiros, na verdade, até os proventos do Dividend Aristocrats parece mirrado: dá 2,4%, em média. Substancialmente menos que os 3,8% do Ibovespa inteiro.
A diferença está, claro, na moeda em que o dividendo é pago. Nestas páginas, você vê a lista das 65 empresas do Dividend Aristocrats, com seus respectivos yields. Para dar uma ideia das eventuais vantagens de receber dividendos em dólar, vamos pegar uma das mais célebres lá da lista, a IBM.

Quem tinha mil ações da IBM em 2018, recebeu US$ 621 em dividendos. Na época, com o dólar a R$ 3,80, isso dava R$ 2.350. Nos últimos 12 meses, as mesmas mil ações renderam US$ 654. 5% a mais.

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Só que o dólar subiu 40% de lá para cá. Em reais, então, o salto do dividendo foi bem maior. Decolou de R$ 2.350 para R$ 3.460.

Claro que há um outro lado nessa moeda, já que o câmbio é traiçoeiro. Entre 2003 e 2011, o dólar caiu 57%. Caso aconteça algo assim de novo nos próximos anos, o tal dividendo de R$ 3.460 cai para R$ 1.480 lá na frente. É o risco de qualquer investimento atrelado ao dólar. Para o longo prazo, porém, ter alguma renda indexada pela moeda americana tende a ser uma escolha prudente. E que está mais ao alcance do pequeno investidor. Desde 2020, é possível comprar ações gringas na B3. Você faz isso via BDRs (Brazilian Depositary Receipts).

Funciona assim: um banco compra ações de uma empresa americana e vende na bolsa brasileira os “recibos” desses papéis. É do jogo. Petrobras, Vale, e outras grandes da B3 são negociadas em Nova York via recibos também , o que muda é o nome deles. Nesse caso, são os American Depositary Receipts (ADRs). Há BDRs de 555 companhias americanas por aqui – incluindo todas as 65 do Dividend Aristocrats. E os dividendos caem do mesmo jeito. O dinheiro entra em dólar no banco que emitiu os recibos. Ele converte para reais e repassa para a sua conta na corretora. E aí vem a parte chata: as taxas.

Um exemplo da vida real. A rainha dos Dividend Aristocrats hoje é a AT&T, com seu yield de 7,6%. A operadora de telefonia paga religiosamente US$ 0,52 em dividendos por ação a cada trimestre, faça chuva ou faça sol. É como um relógio: cai esse tanto independentemente do resultado financeiro – a AT&T paga, inclusive, quando tem prejuízo (foi o que aconteceu em 2020), com eventuais reservas de caixa.

O valor dos dividendos deles, vale comentar, é corrigido pela inflação do dólar. Há dez anos, era US$ 0,43 por trimestre – o equivalente a exato US$ 0,52 de hoje. A cada ano, então, pagam US$ 2,08 por ação. Como o papel está em torno de US$ 27, esse rendimento é de 7,6%.

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O emissor das BDRs da AT&T é o Bradesco, que detém 7,2 milhões de papéis da empresa para lastrear seus recibos. Cada BDR ali é formada por um terço de ação da AT&T. Os bancos emissores costumam vender assim, fracionado, para deixar o preço unitário mais acessível, mas isso não altera o rendimento. Se uma ação inteira rende 7%, um terço de ação vai render 7%. Normal.

Cada BDR da AT&T, então, dá direito a US$ 0,52 dividido por três: US$ 0,1733. A empresa fez seu anúncio mais recente de novos dividendos no dia 23 de setembro (seu quarto e último provento do ano, a ser pago no dia 11 de novembro). O Bradesco, então, soltou um comunicado estimando quanto cada detentor de suas BDRs da AT&T iria receber em reais.

Usaram o câmbio do dia 23 de setembro (R$ 5,28) para fazer a conversão. O valor bruto deu R$ 0,91. O líquido ficou em R$ 0,60: 34% menos. Pois é. O maior vilão aí é o imposto americano. Os EUA taxam os dividendos na fonte em 30% para quem não é cidadão americano. E ainda tem a taxa que o emissor cobra pelo serviço (quase 4%) mais IOF (0,38%).

Um jeito de evitar os BDRs é abrir uma conta numa corretora americana. Mas dá praticamente na mesma. Tem os 30% do IR americano e o IOF. Não rola a taxa do emissor, pois não há receipt no meio, mas tem a do câmbio. Você precisa mandar o seu dinheiro para fora para ser convertido em dólares, e as instituições que fazem isso para pessoas físicas cobram caro. A taxa costuma ficar 2% acima do dólar comercial quando você transforma seus reais em dólares (para depositar) e 2% abaixo quando você converte seus dólares para reais (na hora de sacar). Dá 4%, igual a taxa de um emissor de BDR.

All in all, operar via corretora gringa tem uma vantagem: a parte da “liquidez”. É que há relativamente poucos negócios envolvendo BDRs na B3, e isso cria uma disparidade. Um pregão da bolsa é um leilão eletrônico, coalhado de ofertas de compra e de venda. O “preço de uma ação” é simplesmente o valor pelo qual o último negócio foi fechado. Se há muita gente fazendo negócio, o normal é que, a cada segundo, a diferença entre o valor do último negócio e o da melhor oferta de compra seja mínima, ou nula.

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O mundo real ilustra melhor. No pregão da bolsa de Nova York do dia 25 de setembro, às 13h18, a ação da AT&T estava a US$ 27,61 (valor do último negócio). E a melhor oferta de compra era a US$ 27,60. Diferença minúscula.

Enquanto isso, na B3, a BDR da AT&T tinha fechado seu último negócio a R$ 49,34. Só que a melhor oferta de compra disponível era a R$ 49,16. Uma diferença de 0,36%, Se você tivesse comprado uma BDR da AT&T há alguns meses e fosse vender no dia 25 de setembro, teria de pagar esse ágio. Havia poucas ofertas de compra, afinal – a ponto de a melhor delas ser 0,36% abaixo do último negócio. E isso num dia em que a ação estava em alta.

Taí. Para receber dividendos em dólar sem dores de cabeça adicionais, só tirando cidadania gringa mesmo. Mas, dada a fraqueza da grana que circula por aqui, pode valer a pena.

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(Tiago Araujo/VOCÊ S/A)
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(Tiago Araujo/VOCÊ S/A)

 

 

 

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