Pais e filhos: o que aprendemos com eles?
Crianças e adolescentes estão imersos nas transformações sociais e tecnológicas. Os mais velhos nos dão autoconhecimento. Fatores que nos auxiliam em qualquer carreira.

Nesse mês das mães, me pergunto: O que eu aprendo com meus filhos? E de que maneira meus avós e meus pais estão vivos em mim e nos meus filhos? Que aprendizados a vivência com essas gerações se manifesta em minha vida pessoal e profissional?
A primeira vez que minha filha me explicou o que era cancelamento, eu parei, respirei e escutei. Ela tem 9 anos. Estava indignada com um caso que viu na escola e me contou com a clareza de quem enxerga o mundo com novos olhos, sem medo de nomear as coisas. Eu, que me considerava atualizada, precisei me colocar no lugar de aprendiz –não só para entender o conceito, mas para entender como ela vê o mundo.
Naquele dia, ela virou minha professora.
A parentalidade tem esse poder de inverter papéis. De bagunçar certezas. De nos fazer reaprender tudo de novo – com outra linguagem, outro olhar, outro ritmo. E, se estivermos abertos, pode ser também uma grande escola de lifelong learning – o aprendizado ao longo da vida, contínuo. Não a atualização que vem de cursos, mas a que brota da convivência, da escuta, do vínculo. A atualização em tempo real.
É curioso como nós achamos que estamos ensinando, quando na verdade estamos sendo ensinados.
Nossos filhos estão imersos nas transformações sociais e tecnológicas. São nativos de um tempo que nos desafia. Sabem dos memes, das linguagens dos emojis, da cultura gamer, das discussões ambientais, das pautas urgentes e dos comportamentos que rompem o que aprendemos. São nossos tradutores do presente e do futuro.
Mas essa atualização não é só técnica ou social. É também emocional.
Ser mãe me obrigou a rever crenças, ajustar escutas, refazer prioridades. Ensinou-me a pausar, respirar, ceder, negociar. A ser vulnerável sem me diminuir. A pedir desculpas. A mudar de ideia. A admitir que não sei. E a aceitar que ser adulta não é ter todas as respostas, mas manter o coração disponível para continuar aprendendo. Muitas vezes a parentalidade é o que abre a porta para nos enxergarmos sob outra luz: com mais humanidade, mais compaixão e mais perguntas.
E o que aprendemos com nossos pais?
Eu mesma, filha de uma mãe que morreu quando eu tinha 4 anos, me vejo até hoje sendo educada por ela. Mesmo sem sua presença física, ela segue viva em mim. Continuo descobrindo sua força em gestos que faço sem perceber, nas decisões que tomo pensando no que ela faria. Nos silêncios que me moldaram. Nos valores que herdei mesmo sem ter ouvido. Minha mãe me educa até hoje. A ausência virou presença. A memória virou guia.
Tive a sorte de entrevistar minhas duas avós para um projeto pessoal. O motivo: conhecer mais da história delas, e, com isso, mais da minha. A cada lembrança escutada, melhor entendia de onde vim. Desde aquele dia, me senti mais interessada, mais grata, mais inteira e mais conectada ao que me trouxe até aqui. E, um fato curioso: minha avó materna virou a maior comentarista dos meus posts no Instagram. Mesmo morando em outra cidade, ela me acompanha, curte, torce, opina. É minha audiência mais fiel. E esse vínculo, que poderia ter se apagado com a distância e o tempo, se fortaleceu com a tecnologia.
Assim, vivemos como uma geração-sanduíche: entre a atual, que nos chama para o futuro, e a anterior, que nos ancora nas origens.
O reflexo dessas relações no escritório
Tudo isso não acontece só na vida pessoal. No mundo do trabalho, convivem hoje até cinco gerações em uma mesma empresa. De acordo com a consultoria Robert Half, esse é um dos maiores desafios da liderança contemporânea: aprender a comunicar, colaborar e gerar pertencimento entre diferentes visões de mundo, tecnologias e linguagens.
Por isso que, no ambiente corporativo, um dos fatores que determina uma boa gestão e o sucesso de uma equipe é a capacidade de aprendizado e coesão entre as gerações.
E aqui, mães e pais têm muito a ensinar e a praticar pelo fato de vivermos isso dentro de casa. Dialogamos com crianças da geração Alpha (pessoas nascidas a partir de 2010) e, muitas vezes, cuidamos de pais da geração Baby Boomers, e somos nós mesmos, millennials ou nascidos da geração X. É como viver dentro de uma empresa multigeracional.
Pergunto: como praticar esse aprendizado? Aqui, faço três convites simples e transformadores:
Crie um ritual de troca, seja em casa com seus filhos, seja com os colegas de trabalho de outras gerações.
Queira saber o que o outro aprendeu naquela semana ou o que mais lhe chamou a atenção. Depois, conte o que você aprendeu também. Essa troca vira ponte. Aproxima. Gera vínculo e admiração recíproca.
Reconheça sua posição no tempo.
Anote: o que você aprendeu com os filhos? O que herdou dos pais? Dos avós? E o que quer passar adiante? Nomear é um ato de consciência. De legado. De direção. A escuta entre gerações – que treinamos em casa – é a mesma escuta que precisamos levar para o trabalho. Porque ninguém sabe tudo. E todos têm algo a ensinar.
Escute os mais velhos.
“O que você faria nessa situação?” ou “O que você sente falta de como era antes?”, “Me conte sua história?”… São perguntas simples, mas que abrem portais de presença e aprendizado. Quando entrevistei minhas avós no projeto pessoal, entendi traços que carrego, forças que herdei, crenças que não eram minhas e que agora posso soltar. Conhecer nossa história é conhecer nosso valor. Isso vale para o trabalho. Nas empresas, escutar profissionais mais velhos é ter maturidade e visão: amplia repertório, acessa memórias institucionais e ajuda a tomar decisões com mais consciência.
Talvez seja isso – também – que a parentalidade nos ensina: que somos continuidade de alguém e para alguém. Que somos passagem e estamos aqui para aprender e ensinar. Que estamos aqui para deixar rastros.
Isso porque: presença não é só física. É o que deixamos depois que partimos. É o que fica e em quem fica.
É essa relação – entre passado e presente, entre avós, mães, filhas, colegas mais experientes e outros que acabaram de chegar – que nos atualiza, nos fortalece e nos faz permanecer vivos e em tempo real. Um ciclo de aprendizado que nunca termina.