Sofia Kercher

A tirania da positividade

SOCIEDADE

No finalzinho dos anos 1970, o psicólogo americano Neil Weinstein decidiu fazer um experimento despretensioso.

O pesquisador pediu a 200 estudantes da Universidade de Rutgers, instituição em que lecionava, para estimar o quanto eles tinham chance de vivenciar 42 eventos apocalípticos quando comparados aos seus colegas de classe.

Risco mais, risco menos, a conclusão geral não deixava dúvidas: os estudantes acreditavam que tais eventos negativos tinham muito menos probabilidade de acontecer com eles do que com os outros. Weinstein descobria ali um conceito que cunhou como otimismo utópico.

O pesquisador entendeu que os seres humanos têm uma espécie de viés para o otimismo. Nós superestimamos as chances de atingir aquilo que desejamos, e subestimamos as chances, bom… da desgraça.

A explicação cognitiva da coisa era que isso nos protege mentalmente das incertezas e angústia constante em relação ao futuro. Ele também via um fator motivacional: o otimismo também seria manifestação de um desejo. Para conseguir o que se quer, é necessário agir de acordo.

Ao longo dos próximos anos, estudiosos se debruçaram no assunto. Mas foi só em 2011 que um pesquisador americano decidiu trazer à luz outro problema, parente do otimismo utópico.

Em seu livro A Arte Queer do Fracasso, Jack Halberstam, professor de estudos de gênero da Universidade de Columbia, defendia o fracasso enquanto uma ferramenta útil para a população LGBTQIA+ (aqui, no sentido de ir contra o que lhe é esperado, pessoal e profissionalmente).

Segundo o pesquisador, era por meio dele que surgiriam formas mais criativas, cooperativas e surpreendentes de estar no mundo. Acima de tudo, formas que combateriam a chamada positividade tóxica. Ali, um dos males do milênio – e do mundo corporativo – ganhava nome.

A positividade tóxica pode estar entrando na adolescência hoje, mas só virou um cataclismo virtual você bem sabe quando.

No auge da pandemia, em 2020, as discussões sobre o tema ganharam uma atenção impressionante: de acordo com o Google Trends, as buscas pelo termo subiram 138% no ano. De lá para cá, o volume de interesse arrefeceu em 20%.