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E se criássemos um processo seletivo só para brancos?

Luiz Augusto Campos, professor de sociologia da UERJ, explica por que programas com enfoque em minorias não são ilegais – mas o contrário sim

Por Luiz Augusto Campos *
Atualizado em 10 dez 2020, 20h28 - Publicado em 22 set 2020, 13h38

Causou polêmica a divulgação de um programa seletivo para trainees negros e negras, criado e divulgado pela rede varejista Magazine Luiza. Apesar de ser uma estratégia já utilizada por outras empresas com atuação no Brasil, e de ser uma praxe em grandes empresas nos Estados Unidos, o processo seletivo foi acusado de racista, discriminatório e, portanto, ilegal.
Tais reações mostram a incompreensão, ainda comum, em relação ao funcionamento do racismo e, sobretudo, das políticas antirracistas contemporâneas. Grosso modo, existem duas formas institucionais de mitigar o racismo: através de leis punitivas e das chamadas políticas afirmativas. Se no primeiro caso o foco recai sobre a punição de atitudes localizadas e explicitamente discriminatórias, no segundo busca-se compensar as consequências dessas atitudes racistas na estrutura social como um todo.


Embora leis punitivas sejam fundamentais, elas raramente são aplicadas porque demandam a verbalização de intenções racistas por parte de quem discrimina, algo raríssimo. Por isso, o Brasil seguiu uma tendência mundial ao implantar ações afirmativas raciais em diversas esferas como o ensino superior, os concursos públicos e, mais recentemente, a distribuição de financiamento eleitoral para candidaturas pretas e pardas. Essas medidas buscam abrir espaços para os grupos discriminados historicamente como forma de compensar o preconceito sistemático que eles sofrem no mercado de trabalho e nos espaços de poder.
Ainda que mais da metade dos funcionários da Magazine Luiza se autodeclarem pretos ou pardos, seus postos de comando continuam majoritariamente brancos. Nada mais legítimo, portanto, que a empresa busque diversificar esses espaços criando cotas raciais para esses jovens. Note-se que a seleção em tela não difere em quase nada das políticas afirmativas existentes em quase todas as universidades públicas brasileiras. Nelas, estudantes pretos e pardos competem apenas entre si e não com os demais.
Isso quer dizer que o Magazine Luiza está abrindo margem para que outra empresa lance uma seleção apenas para brancos? Absolutamente, não! A lei brasileira considera passível de punição “quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional [ou] negar ou obstar emprego em empresa privada”. A seleção de trainees em debate não nega ou obsta o emprego de nenhum grupo discriminado por sua raça ou cor, apenas de um grupo já privilegiado na sociedade e na própria empresa: os brancos.
Um processo seletivo voltado apenas para brancos seria sim racista e ilegal por obstar o acesso de grupos discriminados e vítimas de preconceito a uma empresa privada. Pessoas percebidas como brancas no Brasil não são alvo de discriminação racial sistêmica, ao contrário: elas se beneficiam da estrutura racista brasileira. A eventual concessão de mais privilégios a esse grupo não apenas seria injusta, mas também uma prática racista e, portanto, ilegal.
* Luiz Augusto Campos é professor de Sociologia do IESP-UERJ e coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA)

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