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Parecia o começo da terceira guerra: Nasdaq sobe 3,34%, e S&P 500 ganha 1,50%

Putin invadiu a Ucrânia, o petróleo foi a US$ 100, o dólar voltou a R$ 5,10 e o Ibovespa caiu. Mas, por hoje, Wall Street encontrou paz no discurso de Biden.

Por Juliana Américo, Tássia Kastner
24 fev 2022, 18h34

Não parece fazer nenhum sentido, mas as bolsas americanas subiram – e não foi pouco – no primeiro dia da guerra de Putin contra a Ucrânia. Antes que você pense que o mercado financeiro enlouqueceu de vez, é bom dizer que o dólar (+2,02%), petróleo (+2,31%) e outros ativos mostram que há uma guerra em curso na Europa, e com consequências ainda imprevisíveis. 

Mas vamos do começo. Ali pela meia-noite desta quinta (aqui no Brasil), a Rússia confirmou a invasão à Ucrânia, afirmando que era uma resposta ao pedido de ajuda dos separatistas pró-Rússia, concentrados nas regiões de Donetski e Luhanski. Balela putiniana, claro. Segundo eles, era necessário o exército russo para “repelir a agressão das forças armadas e formações da Ucrânia”. 

Desde a madrugada, diversas cidades estão sendo atacadas, incluindo a capital Kiev. Para essa madrugada, o mundo ocidental prevê a tomada completa de Kiev pelas forças russas. 

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelenski, fez um pronunciamento convocando os civis que estejam aptos a se alistarem para defender o país e informando que armas estão sendo distribuídas para a população. Só que as informações que chegam ao lado de cá do globo dizem que armas pesadas foram abatidas nos primeiros ataques. Se a Ucrânia já não tinha armamento o bastante para enfrentar os russos, agora a coisa complicou.

E a Rússia de fato avançou pelo território vizinho. As tropas de Putin invadiram uma área próxima à antiga usina nuclear de Chernobyl, onde há depósito de resíduos nucleares. O exército ucraniano tentou evitar que os russos chegassem até a usina, com receio de um ataque terrorista. 

Caso o material radioativo seja atingido por um míssil, por exemplo, pode causar um vazamento ou explosão nuclear. Isso geraria uma nuvem radioativa dentro dos territórios da Ucrânia e Bielorússia, e que também poderia se espalhar por outros países europeus. Só para refrescar a memória, em 1986, Chernobyl foi palco do maior acidente nuclear da história depois que um dos reatores explodiu durante um teste de segurança.

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Diversos líderes mundiais se posicionaram contra os ataques russos e os países já confirmaram que vão endurecer as sanções contra a Rússia, principalmente limitando o acesso do país aos mercados de capitais – as críticas também se estenderam à Bielorrússia, que apoiou a invasão, e deve sofrer também com sanções econômicas.

Os EUA anunciaram sanções contra bancos russos que juntos detêm cerca de US$ 1 trilhão em ativos e limitaram a capacidade da Rússia de fazer negócios em dólares, euros, libras e ienes. Só que esperava-se mais. Uma das cartas na manga era tirar a Rússia do Swift, uma espécie de TED das transferências internacionais de dinheiro. Ficou para depois, uma espécie de carta na manga caso Putin não recue de sua investida contra a Ucrânia.

Putin, por sua vez, garante que o seu governo se preparou para as sanções econômicas. O governo russo está sentado em uma das maiores reservas cambiais do mundo. São US$ 630 bilhões em moeda estrangeira e ouro que ajudam a manter o país por um tempo. Só para se ter ideia, o montante brasileirto é de US$ 357,9 bilhões. 

Ainda assim, a queda do rublo foi de 7%. O índice russo Moex tombou 45%. 

Reação militar

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O presidente americano Joe Biden disse que seu país não entrará em uma guerra que é europeia (alou 1ª e 2ª guerras?), mas a Otan está se movimentando como pode. Individualmente, cada país é livre para decidir se vai ajudar a Ucrânia ou não com o envio de armas ou tropas. Mas tem um porém: pelas regras da Otan, como a Ucrânia não faz parte da organização, ela está sozinha nessa guerra. Os países-membros só compram a briga de outros países-membros. É o chamado artigo 5º, que diz que qualquer ataque a um dos membros será considerado um ataque a todos. 

Acontece que a Polônia, Estônia, Letônia e Lituânia, os vizinhos dessa guerra, já acionaram o Artigo 4º da organização. Ele diz que os países vão se reunir e discutir o que fazer caso qualquer um deles ache que a sua integridade territorial, a independência política ou a segurança estejam sob ameaça. Esses quatro países fazem fronteira com a Rússia ou a Ucrânia. Nesse caso, a Otan decidiu enviar tropas para reforçar a segurança dos países – só os EUA está enviando 7 mil soldados para a Alemanha. 

No discurso de anúncio da invasão à Ucrânia, Putin se antecipou à Otan e fez ameaças. Disse que qualquer interferência estrangeira nas ações militares teria consequências “nunca vistas”. Além disso, ele garantiu ao presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko, que qualquer ataque contra o país será visto como um ataque contra a própria Rússia.

Pela manhã, aconteceu o óbvio. As bolsas europeias desabaram 3%, o petróleo disparou e em Wall Street o pregão começou afundando. Era o lógico, vamos dizer assim.

Embargos à Rússia e a paralisação da Ucrânia pela guerra podem ter consequências pesadas para a economia global. Os dois países são grandes fornecedores de petróleo e gás natural, duas matérias-primas com impacto em toda a economia. A novela do petróleo a gente tem acompanhado, com o preço proibitivo da gasolina e do diesel. Por isso, vale explicar as consequências dos outros produtos. O gás natural, por exemplo, produz fertilizantes usados nas lavouras aqui do Brasil. E se o produto não chega aqui, o custo de produção dispara, deixando tudo mais caro. 

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Não só. Rússia e Ucrânia são grandes produtores de trigo e outras commodities. Por causa da guerra, os preços do produto dispararam ao maior patamar em nove anos na bolsa de Chicago.

Essa guerra poderia agravar o cenário de estagflação, quando a economia esfria – porque uma guerra tende a reduzir a atividade econômica –, mas os preços sobem porque faltam produtos. Isso tem um potencial explosivo num momento em que o mundo já vinha tentando descobrir como reduzir a inflação sem matar o crescimento econômico.

Isso continua no mesmo lugar. Só que o discurso de Biden, ainda que confuso, serviu como um Rivotril para Wall Street. Pouco antes do início do pronunciamento, o índice Nasdaq começou a ensaiar uma recuperação, e após a fala o S&P 500 foi para o negativo. Em um único dia eles chegaram a cair 3% e subir outros 3%. Isso é o que se chama de volatilidade. 

O Ibovespa não teve fôlego para virar. Fechou o dia em queda de  0,37%, a 111.591 pontos. A nossa bolsa vinha se mostrando um refúgio para os investidores estrangeiros. Do início do ano até a última terça (22), data dos últimos dados disponíveis, foi registrado um saldo positivo de R$ 58,06 bilhões de aportes gringos – é mais da metade do valor aportado por aqui em 2021 (R$ 102 bilhões). Só que o Carnaval começa para valer amanhã e, na dúvida, o mercado decidiu começar a colocar uma grana no bolso.

Não custa lembrar que em 2020 todo mundo foi curtir a folia comprando e voltou emendando circuit breakers à medida em que o coronavírus ia se alastrando. É o clássico gato escaldado tem medo de água fria.

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E se você não comprou dólar ontem, achando que a moeda americana poderia cair mais um pouco e voltar para o patamar dos R$ 4, perdeu a oportunidade. O dólar disparou 2,02% com a crise militar e fechou o dia sendo cotado a R$ 5,1052. Nessa busca por lugares mais seguros, o Brasil perdeu hoje o posto de colo de mãe. Os papéis da exportadoras que possuem receita dolarizada foram impulsionados: Suzano (0,56%) e Klabin (0,69%). 

Gás e petróleo

Voltando ao petróleo, os preços dispararam durante a madrugada, com o início dos ataques russos e chegaram a superar a marca dos US$ 100 pela primeira vez em oito anos, após avançar mais de 8%. Na máxima, foram a US$ 105. Mas, assim como Wall Street, o mercado da commodity segurou os ânimos após o discurso do Biden, em parte porque o americano prometeu colocar mais barris de suas reservas no mercado, para conter a alta de preços. O tipo Brent subiu 2,31%. Já o WTI, 0,77%. 

A declaração de guerra agravou as preocupações sobre a interrupção do fornecimento de energia no mundo. A Rússia é o segundo maior produtor do mundo, atrás apenas dos EUA, e as sanções podem acabar afetando a oferta do produto.

O mercado também vê uma disparada no preço do gás natural. A cotação do gás TTF negociado na Holanda, que serve de referência de preço para o resto da Europa, subiu 51%, atingindo 135 euros por megawatt-hora.

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A Rússia é o principal fornecedor de gás natural para o continente e parte dos gasodutos passam pelo território ucraniano. Ou seja, não se sabe até quando os países europeus terão acesso ao produto. 

E as sanções envolvendo essa questão energética já começaram. Na terça-feira, o primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, suspendeu a certificação do gasoduto Nord Stream 2 – construído para transportar o gás natural da Rússia direto ao país via Mar Báltico, no norte do continente. O Nord Stream 2 tem a capacidade de fornecer 55 bilhões de metros cúbicos de gás por ano, o que representa mais de 50% do consumo anual da Alemanha.

SulAmérica

Para não dizer que a gente só falou de guerra, houve um destaque no mundo corporativo por aqui. Os papéis da SulAmérica chegaram a disparar 22% no pregão depois que a seguradora anunciou a fusão com a Rede D’or. 

Em parte por causa do tumulto global, as ações perderam um pouco de força e fecharam com alta mais contida: 15,64%. Esse já é o segundo dia consecutivo de altas estratosféricas (no último pregão, a empresa disparou 25,16%, depois que o colunista Lauro Jardim noticiou, com o mercado ainda aberto, o acordo). A Rede D’or, por outro lado, caiu 7,59%; assim como a administradora Qualicorp, que despencou 15,08%. 

A Rede D’Or tem uma participação de 28,98% na Qualicorp. A Qualicorp é uma administradora de planos de saúde, que atua na venda dos planos, mas não na parte operacional da prestação de serviços. A SulAmérica é uma operadora de planos, responsável pelos atendimentos. 

Acontece que a Agência Nacional de Saúde determina que administradoras e operadoras de planos não podem fazer parte da mesma companhia. Na prática, a Rede D’Or precisaria vender as ações que detém na Qualicorp.

Pelo acordo fechado, a SulAmérica deixará de ser uma empresa independente e ficará sob o guarda-chuva da Rede D’Or. Já os acionistas da seguradora ficarão com 13,5% do capital da rede de hospitais, e as ações da SulAmérica saem da bolsa. A operação avalia a seguradora em R$ 15,1 bilhões, a maior aquisição da Rede D’Or desde que a companhia estreou na B3 em maio de 2021.

A compra até ofuscou o prejuízo de R$ 31,2 milhões registrado pela SulAmérica no quarto trimestre – no mesmo período de 2020, a empresa lucrou R$ 42,6 milhões. O resultado da companhia foi impactado pelo aumento dos casos de Covid-19 no Brasil.

Agora é esperar o desenrolar da guerra. 

Maiores altas

SulAmérica (SULA11): 15,64%

Minerva (BEEF3): 6,64%

Locaweb (LWSA3): 6,30%

Ultrapar (UGPA3): 3,62%

Raia Drogasil (RADL3): 3,49%

Maiores baixas

Qualicorp (QUAL3): – 15,08%

Rede D’Or (RDOR3): -7,59%

BRF (BRFS3): -6,23%

Azul (AZUL4): -6%

Positivo (POSI3): -3,85%

Ibovespa: -0,37%, a 111.591 pontos

Em NY:

S&P 500: 1,49%, a 4.288 pontos

Nasdaq: 3,34%, a 13.473 pontos

Dow Jones: 0,28%, a 33.222pontos

Dólar: 2,02%, a R$ 5,1052

Petróleo

Brent: 2,31%, a US$ 99,08

WTI: 0,77%, a US$ 92,81

Minério de ferro: 0,14%, US$ 137,22 no porto de Qingdao (China)

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