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Como o mercado de nicho pode salvar um negócio

Conheça a história da Versátil Home Video, que criou um e-commerce depois de levar um calote milionário e prospera ao vender DVDs para um público fiel

Por Monique Lima
Atualizado em 30 jun 2020, 08h00 - Publicado em 30 jun 2020, 08h00

São Paulo – Quando alguém indica um filme, sua primeira pergunta é “tem na Netflix?”. Para a maioria das pessoas, a resposta é sim. A ascensão das plataformas de streaming, como Netflix, Amazon Prime e HBO Go facilitou o consumo de produções cinematográficas. Mas engana-se quem acredita que elas são a única forma de consumo de filmes e séries. Para cinéfilos e interessados em cinema, os catálogos do streaming não dão conta do recado.

E é exatamente neste nicho que atua a Versátil Home Vídeo, distribuidora especializada em DVDs de filmes clássicos inéditos no Brasil e em relançamento de títulos antigos. São obras que há muito tempo os estúdios deixaram de lado, que são mais difíceis de serem restauradas para o digital e que não são mais encontradas em qualquer lugar – ainda mais depois do fim das locadoras de filmes.

Na Versátil, o trabalho é baseado em uma curadoria refinada feita por Fernando Brito desde 2002. Com uma carreira voltada à sétima arte, ele é o responsável pela pesquisa que permite a inclusão dos filmes no catálogo da empresa, assim como de todo o conteúdo extra que vem junto com os filmes.

Em entrevista à VOCÊ S/A, o curador, que trabalha há 25 anos no ramo, explica como o calote de R$ 1,5 milhão acelerou o e-commerce da empresa e mostra como um negócio que parecia não ter espaço na era digital pode prosperar.

Qual o diferencial da Versátil e como essa reinvenção permitiu a marca se destacar neste mercado que parecia em extinção?
Todo o conceito da Versátil é o seu diferencial. Desde a curadoria de filmes que estão fora do circuito tradicional de plataformas de streaming, passando pelo tratamento de imagem e som para melhorar sua qualidade, até chegar na finalização com conteúdo extra, como entrevistas, comentários, pôsteres e making-off. É um produto que somente a mídia física consegue oferecer de forma completa e com qualidade, e esse é o nosso destaque, nossa sobrevivência.

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Cerca de 90% dos filmes do nosso catálogo não estão disponíveis em nenhuma plataforma online. O streaming é bastante limitado, ainda que tenha muito conteúdo, eles são restritos a algumas categorias e sem adicionais. Já a nossa proposta é uma experiência com cinema que vai além do filmes.

Você sente um aumento no público deste mercado?
De forma geral, o público da Versátil é formado por colecionadores, cinéfilos, pessoas que se interessam por cinema e querem uma experiência mais aprofundada com as obras. Hoje, com as redes sociais, existem influenciadores digitais no assunto que disseminam essa prática e buscamos trabalhar com essas personalidades. Isso atrai novos clientes, com certeza, mas também temos uma parcela que é muito fiel e sempre atuou na nossa divulgação, são eles que fazem tudo acontecer.

Existe uma questão de elemento identitário no mercado de nicho. Quando eu estou fazendo a curadoria dos filmes e trabalhando na escolha dos extras, eu penso no público e sei que quando eles buscam pelo produto e compram, sabem que a seleção foi feita com proximidade e carinho.

Como tem sido durante a crise em que as pessoas estão em casa e buscam por entretenimento?
Embora o momento seja trágico e tenha um peso muito grande no cotidiano das pessoas, é muito natural que com o isolamento e a restrição de atividades sociais, elas busquem por suprir essa demanda com entretenimento em casa. Se pensarmos em um indivíduo que gosta muito de cinema, dessa parte do audiovisual que é menos blockbuster, o mercado de home vídeo é uma alternativa. Então em muitos aspectos, identificamos uma reavaliação das vantagens da mídia física em casa que levou ao aumento de demanda, mas nada muito grandioso.

O e-commerce próprio tem parte nessa sobrevivência e redescoberta do home vídeo?
Nosso e-commerce é nossa independência. Durante muitos anos a Versátil era comercializada por meio das grandes livrarias, como a Cultura e a Saraiva, mas com a crise do mercado editorial dos últimos anos, recebemos um calote gigantesco de R$ 1,5 milhão. Foi aí que decidimos montar um comércio online direto com os consumidores e deu muito certo. Nosso público é fiel, quando não encontraram mais nosso produto nessas lojas pediram a criação do e-commerce. Em poucos meses a quantidade de compras e visitantes do site permitiu a manutenção da marca. Investimos nas redes sociais, na parceria com influenciadores e agora temos um contato direto com os clientes e não dependemos de intermediários.

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Qual sua visão sobre o streaming e o futuro da Versátil?
Eu acredito que vão conviver paralelamente. A mídia física não vai acabar. As pessoas gostam de ver filmes casualmente, entrar ali na plataforma e maratonar uma série. Para a maioria, isso é suficiente, mas há quem goste da experiência profunda. Com qualidade de imagem e som diferenciados, enriquecido com extras que falem sobre o universo daquela produção. Da mesma forma que a música digital convive com o vinil, que o Kindle convive com os livros físicos, o home vídeo tem espaço junto ao streaming. Claro que em longo prazo tudo pode mudar, mas em médio, é nisso que acredito. Mas veja bem, essa sobrevivência só faz sentido quando a entrega é diferenciada, tem que ter o material extra, tem que agregar conteúdo, a chave está em oferecer a experiência aprofundada.

5 DVDs importantes para Versátil, de acordo com Fernando Brito

1 – O Leopardo
Obra do diretor italiano Luchino Visconti, o longa é baseado no livro de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, Il Gattopardo. O longa recebeu Palma de Ouro em Cannes em 1963 e é considerado por Fernando “um dos filmes mais belos da história do cinema”.

2 – Berlin Alexanderplatz
Baseado no romance homônimo de Alfred Döblin, o filme foi originalmente exibido como uma série de televisão e tem 16 horas de duração. A edição da Versátil foi possível por conta de uma parceria com a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha, com o Consulado Geral da Alemanha em São Paulo e com a Arvato Digital Services.

3 – Coleção Glauber Rocha
O box de um dos mais importantes cineastas brasileiros reúne quatro de suas principais obras (Terra em Transe, de 1967; O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, de 1968; A Idade da Terra, de 1980 e Barravento, de 1962). Ainda há documentários narrados em primeira pessoa pelas “vozes de Glauber” que recriam o contexto em que cada filme foi concebido e exibido.

4 – Decálogo
Quatro DVDs dão conta da série de dez episódios em que o diretor polonês Krzysztof Kieslowski analisa os Dez Mandamentos. Com uma visão filosófica e metafísica, o diretor da Trilogia das Cores discute questões morais por meio de personagens que vivem em um complexo residencial de Varsóvia.

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5 – Chaplin – A Obra Completa
Com versões restauradas de todos os filmes, o catálogo da marca apresenta 13 longas-metragens e 65 curtas do criador de Carlitos, em edição limitada especial. Além dos filmes, há documentários sobre a obra de Chaplin feitos por grandes cineastas, como Bernardo Bertolucci, Claude Chabrol, Abbas Kiarostami.


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