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Verdades ocultas: este livro vai fazer você duvidar de tudo o que te dizem

O autor Hector Macdonald mostra como verdades podem se tornar mentiras com exemplos reais de como acontece na política, nos negócios, na imprensa e na vida.

Por Monique Lima
Atualizado em 5 nov 2020, 16h00 - Publicado em 5 nov 2020, 16h00

Todos nós enganamos — e somos enganados — diariamente. Mas não por mentiras. Segundo o autor americano Hector Macdonald, são as diferentes faces da verdade que deturpam nossa visão da realidade. Em seu novo livro, Verdade: 13 Motivos Para Duvidar de Tudo Que Te Dizem, que será lançado no Brasil no fim deste mês, o autor tipifica as verdades em parciais, subjetivas, artificiais e desconhecidas, e mostra como escolhemos cada uma na defesa de nossos interesses.

Com vasta experiência como estrategista de comunicação de grandes empresas, ele traz exemplos reais de como o fenômeno acontece na política, nos negócios, na imprensa e na vida cotidiana. Essa é a estreia de Hector em obras de não ficção. Antes, havia escrito quatro romances, entre eles O Jogo da Mente, best-seller baseado em estudos sobre o controle da psique, traduzido para 18 idiomas. No trecho publicado com exclusividade por VOCÊ S/A, ele revela como as verdades parciais atuam para ocultar um lado da história.

TRECHO DO LIVRO 

A criação da Fanta

Para celebrar um importante aniversário da empresa em 2011, a Coca-Cola produziu uma “breve história” de 27 páginas intitulada “125 anos espalhando felicidade”. Ilustrada com belos anúncios coloridos de décadas anteriores, a publicação menciona um acontecimento marcante ocorrido a cada ano desde 1886. A Fanta, segundo produto mais importante da empresa, aparece apenas uma vez, no ano de 1955: “A Fanta Laranja é introduzida em Nápoles, Itália, como o primeiro produto inédito a ser distribuído pela Coca-Cola. A linha Fanta de bebidas aromatizadas chegou aos Estados Unidos em 1960”.

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É no mínimo insólito o fato de que a história oficial da Coca-Cola não mencione nem a invenção, nem o lançamento da Fanta, algo que ocorreu quinze anos antes de 1955 (…). Por que omitir um marco tão importante?

Possivelmente porque a Fanta foi inventada na Alemanha nazista.

Até a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha era o mercado internacional mais importante da Coca-Cola, mas, com o embargo comercial causado pela guerra, não foi mais possível para a divisão alemã da empresa importar os ingredientes necessários à fabricação da bebida. Então eles desenvolveram uma bebida açucarada alternativa, composta de resíduos alimentares como soro de leite e fibra de maçã. O nome provém de Fantasie, que significa “imaginação” em alemão (…).

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O novo produto foi um sucesso: quase 3 milhões de garrafas foram vendidas em 1943. Com o racionamento do açúcar, alguns alemães chegavam a usar Fanta para adoçar sopas e guisados. Essa é uma história bem interessante de inovação em tempos difíceis, porém não será encontrada na “breve história” da Coca-Cola.

Estratégia de história #1 Anulação do passado

Há certas coisas de que os reis são capazes que nem mesmo a Coca-Cola se atreveria a fazer. O Édito de Nantes (1598), um decreto do rei Henrique IV, da França, se inicia da seguinte maneira:

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Por este édito perpétuo e irrevogável, citado, declarado e ordenado, estabelecemos, declaramos e ordenamos que:

  1. Primeiramente, a memória de tudo o que aconteceu, de uma parte e de outra, desde o início do mês de março de 1585 até a nossa chegada à Coroa e durante outras agitações precedentes e em consequência destas, permanecerá suprimida e esquecida, como se tais fatos não tivessem jamais ocorrido.

Essa política de oubliance, ou esquecimento, foi adotada com o intuito de prevenir a repetição das devastadoras Guerras Religiosas, uma série de confrontos entre católicos e protestantes (os huguenotes) que durou mais de trinta anos. Para pacificar seu reino traumatizado, Henrique IV ordenou a seus súditos que esquecessem o que acontecera. Por ordem real, todos os relatos e documentos oficiais do confronto foram destruídos.

Assassinatos e outros crimes relacionados ao conflito religioso não foram julgados. Prisioneiros foram libertados. Referências à guerra em peças teatrais e poesia foram proibidas. Ações judiciais relativas aos anos de conflito foram anuladas, registros e provas foram destruídos. Um “silêncio perpétuo” foi imposto aos promotores reais sobre todos os acontecimentos relacionados às associações políticas dos huguenotes. (…)

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Omissão de culpa

Mesmo não sendo possível exigir o esquecimento, comunicadores podem nos desviar de verdades históricas que não se alinhem aos seus interesses. Como demonstra a publicação comemorativa da Coca-Cola, o modo mais simples de ajustar a história a uma nova pauta é excluir trechos inconvenientes. Omissões históricas acontecem em larga escala em textos escolares, quando os agentes públicos e os políticos que estabelecem o currículo nacional decidem ignorar aspectos embaraçosos e vergonhosos da história de seu país.

Para muitos americanos, a escravidão e o subsequente tratamento dos negros nos estados do Sul são uma parte importante da história dos Estados Unidos. De acordo com o historiador James M. McPherson, ganhador do prêmio Pulitzer, a Guerra Civil Americana começou em função de diferenças irreconciliáveis entre os estados livres e os que permitiam a escravidão, questionando a autoridade do governo nacional para proibir a escravidão nos territórios que ainda não haviam adquirido a condição de estados. Após a abolição da escravidão, os estados do Sul decretaram as notórias leis de Jim Crow, que segregavam americanos negros e brancos em todas as instalações públicas. Essa segregação, extensiva a escolas, ônibus e bebedouros, permaneceu em vigor até 1965. Durante o mesmo período, o movimento supremacista Ku Klux Klan aterrorizou afro-americanos, judeus e ativistas pelos direitos civis.

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Omissões históricas acontecem em larga escala em textos escolares, quando os agentes públicos e os políticos que estabelecem o currículo nacional decidem ignorar aspectos embaraçosos e vergonhosos da história de seu país.

Em 2015, o estado do Texas emitiu novas diretrizes para o ensino da história americana, omitindo todas as menções às leis de Jim Crow e ao Ku Klux Klan. Os 5 milhões de estudantes das escolas públicas que estudaram o novo conteúdo aprenderam que a Guerra Civil, conflito responsável pela morte de mais de 600 mil americanos, foi uma luta pelos “direitos dos estados”. A escravidão foi apenas uma “questão secundária da Guerra Civil”, de acordo com Patricia Hardy, do Conselho de Educação do Estado do Texas. Claro que os “direitos” que a maioria dos estados do Sul estava preocupada em proteger eram os direitos de comprar e vender pessoas. Um dos livros didáticos chegava a se referir eufemisticamente ao comércio de escravos através do Atlântico como uma transferência de “milhões de trabalhadores” para as plantações do Sul.

A omissão e a minimização da escravidão e da opressão racial, conforme ensinadas em algumas escolas americanas, terão consequências duradouras. (…) De acordo com uma pesquisa realizada pelo Pew Research Center em 2011, apenas 38% dos americanos entrevistados acreditam que a Guerra Civil ocorreu “principalmente por causa da escravidão”. De acordo com Dan Quinn, da organização Texas Freedom Network, “muitos brancos do Sul cresceram acreditando que a luta dos Estados Confederados foi, de algum modo, por uma causa nobre, e não uma guerra em defesa de uma terrível instituição que escravizou milhões de seres humanos”. (…)

(Objetiva/Reprodução)

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