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A lei no Rio que proíbe exigência de experiência de estagiários é constitucional?

Exigir experiência anterior inviabiliza o aprendizado e pode mascarar um vínculo empregatício.

Por Cristian Baldani e Mayara Sant’Anna, sócio da área trabalhista e associada da área trabalhista de Veirano Advogados
Atualizado em 13 jul 2021, 17h16 - Publicado em 13 jul 2021, 16h38

Recentemente foi sancionada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro a Lei Estadual nº 9.285/21, que proíbe a exigência de experiência prévia na admissão ou como critério de classificação na seleção de estagiários. A lei vale para entidades públicas e privadas e prevê multa de R$ 3.000 a R$ 30.000 em caso de descumprimento. A nova lei diz, contudo, que é possível estabelecer o período ou ano letivo mínimo de escolaridade como critério de admissão.

O intuito da legislação estadual foi, ao nosso ver, de impulsionar o acesso e o ingresso de estudantes no estágio, de modo a desenvolverem capacidades para a sua inserção e progressão no mercado de trabalho, mesmo sem experiência prévia, e coibir práticas empresariais de simples utilização de uma mão de obra experiente e qualificada, porém com menos burocracia e custos quando comparada com o contrato de trabalho formal (CLT).

A Constituição Federal, em seu art. 22, I, dispõe que compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho e estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV), enquanto compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar, de forma concorrente, sobre educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação (art. 24, IX).

Já o art. 205 Constituição Federal determina que “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Assim, apesar do bom fundamento da Lei Estadual, cabe a indagação: é constitucional a lei estadual que disciplina matéria de caráter trabalhista, mas também educacional?

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Ao nosso ver, a Lei Estadual não foi de encontro às diretrizes gerais estabelecidas na Lei Federal nº 11.788/08 (“Lei de Estágio”) e o escopo da educação – principalmente quando também estatui que é possível se estabelecer como critério de admissão o período ou ano letivo mínimo de escolaridade no curso em que o estagiário estiver matriculado – tampouco se presta a inviabilizar o estágio ou prejudicar os estudantes. Muito pelo contrário!

Parece-nos que a Lei Estadual nº 9.285/21 está inserida na competência legislativa concorrente sobre educação insculpida no art. 24, IX da Constituição Federal, sendo, portanto, constitucional.

De fato, exigir do estagiário experiência anterior quando, na verdade, o escopo do estágio é exatamente garantir a complementação prática do ensino teórico e viabilizar a inserção do estudante no primeiro emprego pode soar um tanto quanto contraditório. E como “ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos” (art. 1ª da Lei de Estágio), a exigência de experiência prévia poderia inviabilizar o aprendizado de muitos, esvaziar o escopo da Lei do Estágio ou mascarar um possível vínculo empregatício.

Tanto é assim que essa discussão, inclusive, já foi travada há cerca de 5 anos no âmbito nacional, através do Projeto de Lei nº 5660/16 de autoria do Senado Federal, que também proibia a exigência de experiência prévia para seleção de estagiário, mas modificava a Lei de Estágio, criando artigo específico.

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A Lei de Estágio estatui uma série de requisitos a serem observados no contrato de estágio, inclusive para a não caracterização do vínculo de emprego, destacando-se o objetivo primordial de preparação para o trabalho produtivo dos estagiários, a matrícula e frequência regular do educando em curso de educação superior, profissional, de ensino médico, da educação especial bem como a compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas previstas no termo de compromisso e carga horária de no máximo 6h diárias.

Logo, embora constitucional, o que nos resta saber é a viabilidade prática da proibição imposta pela Lei Estadual nº 9.285/21, pois sem fiscalização efetiva e controle adequado, as empresas podem muito bem continuar selecionando apenas candidatos que possuem prévia experiência, tornando ineficaz a nova Lei Estadual.

 

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